segunda-feira, 23 de dezembro de 2013

Não sou um hipopótamo - os factos e os sapatos


Pedia primeiro ao estimado leitor ou leitora que visualizassem o vídeo em anexo. Tem apenas a duração de um minuto, é bastante interessante, e para quem é apreciador daquele tipo de humor escatológico são 63 segundos bem passados. Já está? Obrigado, e diga lá se não valeu a pena? Se não gostou e se ficou sem vontade de almoçar, jantar, ou acabou de regurgitar o que comeu, pode pelo menos dizer que aprendeu mais qualquer coisa.

É impossível a um ser humano executar este "truque" que vamos o hipopótamo do filme fazer com grande mestria, pois por muito grave que seja o desarranjo intestinal de que possamos padecer, falta-nos a cauda para fazer de "ventoinha". Mas o que eu pergunto agora é o seguinte: deixaria este hipopótamo entrar na sua casa? Claro que não. E agora, se um hipopótamo usasse sapatos, e deixá-los à porta resolvesse o problema? Deixava-o entrar, contando que tivesse uma porta e um corredor largos? Desconfio que sim, uma vez que para muito boa gente os sapatos que se trazem da rua são piores que a cauda de abanão deste hipopótamo incontinente.

Quando estava no 9º ano, tinha aulas de Agro-Pecuária duas vezes por semana, e nesses dias era proibitivo entrar com os sapatos calçados em casa. Era uma exigência razoável da parte dos meus pais, uma vez que havia dias que aqueles sapatos de ténis tinham andado a pisar esterco de vaca, caca de galinha ou pocilgas de porcos. Noutros dias normais era comum ficar em casa com os sapatos calçados, e só os tirar na hora de ir tomar banho e dormir. Porque raio não os poderia usar dentro de casa se não andei a pisar em esterco de vaca, caca de galinha ou pocilgas de porcos? Em Macau, e na Ásia em geral, é comum tirar os sapatos quando se entra em casa, e pedir aos convidados que façam o mesmo. A maioria nem precisa que lhe peçam, e fazem-no voluntariamente. Mas porquê? Pode ser que por cá exista muito esterco, caca e pocilgas, mas não de vaca, galinha ou porcos. Ou pelo menos não andamos a pisar nelas.

Só gosto de tirar os sapatos na minha própria casa, e recuso-me a tirá-los em casa alheia, a não ser que se trate de um templo hindu, e mesmo assim fico com receio que me roubem os sapatos que deixei à porta. Quando alguém vem aqui a casa, insisto que se mantenha calçado, a não ser que seja uma senhora de saltos altos, por uma questão de conforto, apenas. Se me tiram os sapatos quando entram na minha casa, dá-me vontade de lhes perguntar se andaram a pisar esterco de vaca, caca de galinha ou pocilgas de porcos, ou se estão a pensar que vou para a cama com eles tão facilmente. Além disso não me está a apetecer deparar com pézongas deformadas, unhas encravadas ou odores característicos. Essas visões deixam-me com stress pós-traumático pelo menos durante um mês.

É uma diferença cultural interessante, que de um lado tirar os sapatos à entrada seja considerado um acto de gentileza, e do outro uma agressão e um insulto. Quando se vai a casa de alguém durante poucas horas ou apenas alguns minutos, não se justifica tirar os sapatos. Se vem aqui alguém visitar-me por meia hora e tira os sapatos, começo a ficar preocupado que queira passar cá a noite, e não tenho lugar para mais ninguém dormir. Para quem desconfia que o convidado pisou acidentalmente numa bosta qualquer no chão da rua, há uma invenção nova que anuncio agora aqui em primeiríssima mão: uma "carpete".

É simples: adquirem um dessas tais "carpetes", colocam-na à entrada, e qualquer pessoa minimanente educada passa por lá as solas antes de entrar, não vá levar ali uma pastilha elástica já mastigada ou o cadáver de um escaravelho. Já para os hipopótamos como aquele ali no filme já uma carpete não deve ser suficiente. Uma garagem com lavagem automática seria o mínimo necessário. E é por isso que eu não sou um hipopótamo.

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