O nosso aniversário é o nosso dia, o nosso feriado particular, o dia de S. Eu. Fosse Narciso, o personagem da mitologia grega, real, e seria o patrono dos aniversariantes. Toda a gente comemora o seu aniversário, independente da nacionalidade, raça, credo ou condição social. Quer dizer, agora que penso nisso, as Testemunhas de Jeová não comemoram os aniversários (nem o Natal ou o Ano Novo), e é possível que existam mais duas ou três religiões malucas que tenham algo contra os aniversários. Depois é preciso ter em conta as pessoas que não comemoram porque no passado esse dia foi marcado por algum evento traumático. Ora bolas, vou refrasear: toda a gente comemora o seu aniversário, e os que não comemoram, deviam.
Agora vamos à Ciência, à Estatística, e à parvoíce: os aniversários acontecem uma vez por ano. Pronto, já disse. E sabem o que mais? Comemora-se no mesmo dia em que nascemos! Fantástico. Existe uma pequena confusão com as pessoas que nasceram no dia 29 de Fevereiro de um ano bissexto, e é costumeiro dizer-se que "só fazem anos de 4 em 4 anos". Oh oh oh. Isso queriam eles. É lógico que quem tenha nascido num dia 29 de Fevereiro de um ano bissexto comemora o aniversário a 1 de Março de um ano não-bissexto. Há que desconfiar destas pessoas, que nasceram num dia que só acontece uma vez em 1461. Bastante suspeito. E o Euromilhões? Não ganham?
Neste tal aniversário, decorre uma cerimónia que se convencionou chamar "festa de anos". Intrigante. Para esta cerimónia são necessários três ingredientes: 1) festa, 2) convidados, e 3) prendas. A primeira é da responsabilidade do aniversariante, e festa de anos sem bolo de aniversário não é festa de anos. Os convidados selecionam-se entre os amigos e família, e as pessoas que adoram complicar as coisas (as mulheres) têm aí uma grande dor-de-cabeça, pois há sempre familiares desavindos e amigos comuns que se odeiam, portanto é preciso avaliar os parentescos e as amizades, para saber a quem vão partir o coração nesse ano. Os convidados trazem o terceiro e último ingrediente da festa de anos, mas de todos o mais importante: as prendas.
As prendas são como que o bilhete para a festa. Quem vem a uma festa de anos sem pelo menos uma prenda em seu nome ou em nome do seu colectivo, não está a levar isto a sério. É como se estivesse a chover a potes e saisse de casa sem guarda-chuva. É como ir jogar ténis e não levar raquete. Bem. Assim, o pior é decidir o que oferecer. A importância da prenda é desproporcional à idade do aniversariante, ou seja, quanto mais velho se fica menos importa a porcaria da prenda. A minha vasta experiência no assunto levou-me a entender um padrão, que para gaúdio dos leitores, vou aqui partilhar.
Bebés de 0 a 2 anos: Roupinhas, botinhas e outras paneleirices.
Crianças de 3 a 6 anos: bonecas para as meninas, coisas que façam barulho para os meninos.
Putos dos 7 aos 13 anos: se for o seu filho, pergunte-lhe o que quer. Se for filho de um amigo seu ou colega do seu filho pergunte aos outros pais.
Adolescentes até aos 18 anos: Se não sabem do que ele gosta, dêm-lhe dinheiro. Vou aqui abrir um parêntesis para falar do meu 16º aniversário. Os convidados adultos deram-me todos dinheiro, nesse dia "facturei" mais de vinte contos. Agora imaginem o que era para um jovem de 16 anos em 1990 andar com mais de vinte contos na carteira, e sem precisar de trabalhar. Era mais dinheiro do que sobrava a muitos agregados familiares depois de pagar as contas. Se preferir algo mais atencioso do que dinheiro, só um conselho: não lhe ofereça discos, não lhe dê música. O seu gosto musical não é igual ao dele, seu "cota".
Depois dos 19 anos: "Qual prenda qual quê, pá. Já por eu ter vindo à tua festa vais daqui com muita sorte". E não é? Claro que esta estratégia só se aplica no caso de não ser um familiar próximo. Não se lembrem de usar este argumento com a esposa.
De facto é assim, tanto com as prendas como com o próprio facto de passar mais um aniversário: quando somos jovens, é uma festa, quando começamos a envelhecer, é uma merda. É a teoria do copo meio cheio ou do copo meio vazio. No caso de quem caminha para os cinquenta ou sessenta, é mais o prazo no fundo da lata que vai chegando ao fim.
No fim da festa de anos cantam-se os parabéns e sopram-se as velas. Para mim este é o pior momento da festa, e vai ficando pior cada ano que passa. Para já acho aquela canção "Parabéns a Você" horrível, e quando penso em "soprar as velas" imagino um puto de 10 anos, obeso e com sardas no rosto, a soprar o bolo com um chapéu de cone na cabeça. Ah sim, e se está a ler isto no dia do seu aniversário, permita-me que lhe apresente os meus mais sentidos pêsames.
E assim termina a rubrica "Sempre em festa", com esta nota um tanto amarga. Pensei em acabar a série ao jeito de "Os Sopranos".
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