sexta-feira, 9 de maio de 2014

As mães da invenção


Chegados ao fim de mais uma produtiva (e cansativa) semana no Bairro do Oriente, fecho com chave de ouro, com o artigo da última quinta-feira do Hoje Macau. Este é dedicado a todas as mães, a todos os filhos, a todas as mães dos filhos e a todos os filhos da mãe. Bom fim-de-semana!

Um destes Domingos foi Dia da Mãe, ou vai ser – não sei, uma vez que não tenho mãe, pois nasci de chocadeira. Contudo um dos problemas levado às ruas pelos manifestantes deste último 1 de Maio foi o do “excesso de turistas” que visitam o território, que de acordo com eles, são “mais que as mães”. Tenho um problema com esta expressão muito portuguesa; basta uma mulher ter dois filhos para que estes sejam “mais que as mães”, que neste caso é apenas uma. Juntando-se a estes mais uma mãe com apenas um filho, são duas mães e três filhos, e por aí adiante. Os filhos só seriam menos que as mães se as mães não tivessem filhos, só que assim não seriam mães. Parece confuso, mas adiante.

Eu próprio acho que os tais turistas do continente que visitam as RAE de Macau e Hong Kong durante os feriados das denominadas “semanas douradas” são em demasia. Quer dizer, o que leva estes turistas a vir gastar o seu dinheiro aqui em Macau? Que parvoíce! Mas junto com estes turistas chegam ainda maus elementos, desde amigos do alheio e outra ladroagem diversa, a prostitutas e afins, mas pronto, é mais fácil aos cidadãos da grande China obter vistos para estas regiões do que para outro país, e custa-lhes 50 ou 60 patacas a obtê-los em alguns casos, portanto estas são “moscas que entram quando se deixa a janela aberta”, nas palavras do saudoso camarada Deng.

Mas os motivos que levam os residentes a queixarem-se da vinda destes “abonos de família” da economia local têm a ver com algumas diferenças culturais, uma espécie de “bairrismo” que leva a que tanto os locais como os honconguenses olhem de cima para os seus compatriotas do continente. De facto incomoda que venham estas moles incomodar os pobres nativos, que assim ficam impedidos de circular livremente nas ruas enquanto utilizam os seus “smartphones” sem olhar por onde andam, e apenas incidentalmente não passam a vida a esbarrar uns nos outros como se fossem carrinhos de choque. O que eles exigem é apenas a liberdade de andar por aí feitos zombies de cabeça baixa a mandar SMS, S&M ou M&M’s. É que só podem ser mesmo de fora, essas madamas que andam por aí a conduzir com os joelhos na direcção e sem olhar para a estrada, enquanto mandam uma mensagem ao marido, ao amante ou à empregada, ou esses tipos que conduzem o motociclo aos “esses” ao mesmo tempo que falam no telemóvel, com a desculpa que se perderem a chamada, isso “custa-lhes milhões de patacas”. É que a malta daqui é o pináculo do civismo e das boas maneiras.

Mas o pior de tudo isto é o comportamento inaceitável destes bárbaros, autênticos animais, que, imaginem só, chegam ao ponto de urinar e defecar em plena via pública! Sim, especialmente quando se trata das suas crias, que quando têm vontade de fazer um chichi, fazem-no onde calha, seja numa sarjeta no meio da rua, ou num alguidar para deitar o chá que lava a loiça dos pratos no restaurante. De facto não são raras as ocasiões em que assisto a criancinhas a urinar nos bueiros, auxiliadas pelos paizinhos ou pelas avós – devem ser turistas, com toda a certeza: está-lhes escrito na testa. Devem ser turistas também os cidadãos que teimam em atirar lixo das janelas dos apartamentos, desde caixas de comida, a pacotes de amendoins, pensos higiénicos, a loja dos horrores completa. Devem ser esses turistas malvados, que andam por aí a alugar apartamentos e a manchar o bom nome dos nossos impolutos residentes. São também eles que entram pelas casas-de-banho públicas, mesmo as dos edifícios governamentais, anunciando a sua chegada com uma sonora escarreta, retirada lá do fundo dos brônquios – é a forma ideal de remover as impurezas, dizem. É isso e é comer com as patorras descalças em cima das cadeiras nas tascas de “chow mein”, e palitar os dentes com a unhaca do dedo mindinho, uma atitude muito “turista”.

Se estou a ser sarcástico? No shit, Sherlock. Nem há créditos extra para quem percebeu logo à primeira. Não estou aqui a desculpar quem quer que seja pelos seus comportamentos pouco civilizados, mas neste particular, e em vez do tal “são mais que as mães”, prefiro recorrer a outra expressão do nosso riquíssimo léxico popular: “Diz o roto ao nu: olha lá, porque é que não te vestes, tu?”.

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Quem também são mais que as mães são essas forças de bloqueio malvadas, que enviam os seus agentes provocadores e destabilizadores da ordem social disfarçados de jornalistas, com o intuito de manchar o bom nome de Macau, esse oásis da liberdade de expressão. Um desses mini-terroristas, armado de uma mochila de ponta-e-mola, tentou aproximar-se do nosso Chefe do Executivo com o pretexto de, e vejam bem a ousadia desta gentinha, “fazer-lhe uma pergunta”. Graças a Deus que estava lá um dos seguranças do nosso Chefe, esse paladino que dá o corpo ao manifesto (e às mochilas) em nome do bem estar das vacas sagradas (e dos texugos…) do capital e do poder político da RAEM, que convidou gentilmente a jovem a retirar-se, com um leve toque no ombro. Só que esta, matreira, sentiu o contacto e simulou a falta, “fazendo-se” ao “penalty”, e a seguir foi-se queixar a uma daquelas 259 associações que representam os profissionais da imprensa, e por isso valem o que valem: peva.

Mas felizmente as “mães da invenção” estão atentas, e sabem muito bem que o que estas forças militantes querem é que estes casos cheguem às instâncias internacionais, que depois desancam na pobrezinha da RAEM, coitadinha. Queixinhas pé-de-salsa, é o que eles são. Mas o que já começa a ser mais grave do que o preço da habitação é andarem por aí esses falsos-jornalistas, que não precisam de se identificar ou fornecer explicações. Sim, porque isto não é jornalista quem quer, mas quem pode. Afinal trata-se de uma carreira aliciante onde se aufere um vencimento que chega para mudar de BMW todos os anos e comprar casas de férias em Malibu. Anda por aí alguém que não está a fazer o seu trabalho de casa, e as mãezinhas vão puxar-lhes as orelhas.

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