A imagem que vemos em baixo mostra uma lista de cantores e bandas, na sua maioria de "rock" ou "hard-rock" e de "pop", que foram proibidos na antiga União Soviética devido ao seu carácter, digamos, "subversivo". A lista andou a circular pelas redes sociais desde a semana passada e até ao início desta que agora finda, e foi amplamente divulgada e partilhada, muito por culpa do seu conteúdo, que tentando parecer sério, acaba por produzir um efeito humorístico.
Ali podemos ficar a saber, por exemplo, que os Van Halen difundiam "propaganda anti-soviete", e com aquele "Jump", queriam era dizer "saltem daí para fora". Os Talking Heads versavam sobre o "mito do perigo militar soviético", o que me leva a deduzir que "Blind" ou "Road to Nowhere" tinham uma mensagem subliminar que me escapou na altura. Os Pink Floyd não se recomendavam, devido à sua "interferência com a política externa da URSS", nomeadamente com a invasão do Afeganistão pelas tropas sovietes no início dos anos 80. Acho que a censura aqui deve ter entendido mal, pois o que Roger Waters diz é "hey, teachers, leave the kids alone", e não "hey, russians, leave Afghanistan alone". Mas para dizer a verdade, o que qualquer professor possa ter feito com um aluno em matéria de abusos não se compara certamente com aquilo que russos fizeram com os afegãos.
Já quanto a bandas ou artistas afiliados com Satanás, o senhor das Trevas (salvé, Belzebu!), os Black Sabbath são acusados de promover a violência e o "obscurantismo religioso", ou em inglês, "obskurantism", com "k". Pior ainda eram os Nazareth, que além do "misticismo religioso", incluíam nas suas músicas mensagens de "sadismo". Alice Cooper, por seu lado, era um "vândalo", e penso que ainda é, mas o maior cuidado a ter é com os Genghis Khan, aquela banda alemã de música "disco" que ficou conhecida no Festival da Eurovisão em 1978, e onde se destacava um indivíduo que se vestia com trajes mongóis e dava umas piruetas no palco enquanto outros cantavam. Pode parecer inocente, mas na verdade trata-se de "anti-comunismo" e "nacionalismo". Uma forma curiosa de nacionalismo, esta, quando um alemão se veste de mongol numa banda com o nome Genghis Khan.
Uma coisa com que os sovietes se preocupavam bastante era o "neo-fascismo", tema recorrente do reportório de artistas como os 10cc, ou Julio Iglesias. Esperam lá, Julio Iglesias? Estavam enganados, os comunas, pois o Julio Iglesias de neo-fascista não tinha nada: era fascista desde que nasceu. Quanto aos AC/DC, igualmente neo-fascistas, e os Judas Priest, esses anti-comunistas, eram ao mesmo tempo "violentos", e a violência era algo que preocupava o regime, especialmente quando se trata de bandas "punk", caso dos Sex Pistols, dos "Klesh", também conhecidos no mundo civilizado por Clash, ou ainda os B52's, essa banda "punk" como o caraças. E ser "punk" já era suficiente para levar com a moca da censura, mesmo que não implicasse violência, como no caso dos Ramones. Deve ter sido por causa do "Rocket to Russia". Já os "Scorpion", que suponho serem os Scorpions, são apenas "violentos" - "I'm still loving you", mas mesmo assim tenho que te encher de porrada primeiro.
Quem surpreendentemente apela à violência são os Village People, aquela banda "disco" norte-americana que é muito "camp", e uma das predilectas da malta "gay". Bem, violência é uma forma de interpretar a coisa. Mas desconfio que os tipos que elaboram esta lista são rabetas, mesmo. Censurar a Tina Turner com o argumento de que apela ao "sexo" ou Donna Summer por "eroticismo" é simplesmente inaceitável - qual é o problema? E são hipócrita também, ao censurar a banda de heavy-metal suíça Krokus (ou "Crocus", conforme a lista) por promover "o culto da personalidade". Ah, essa é boa! Quer dizer, se calhar escolheram o "culto da personalidade" errado, pois no caso do camarada Estaline, não ia haver qualquer problema. Das muitas coisas que ali se aprendem, uma delas é a verdadeira natureza dos Yazoo ("Jazoo" lá na parvónia), o duo composto por Vince Clarke e Alison Moyet que tinha um reportório, isto pensava eu, completamente inocente, como se quer do "pop" que se preze. Afinal são "punk" e "violentos".
Entretanto eram inúmeros os comentários no sentido de que a lista em questão era "treta", alguma piada de um daqueles desocupados ocidentais a fazer pouco da mãe Rússia. Fui investigar, e descobri a versão original do documento, em russo, que podemos ver na imagem acima. Fiquei ainda a saber que a lista foi publicada por um oficial do PC soviete numa cidade da República Socialista da Ucrânia, e era dirigida a lojas de discos e clubes, para que "evitassem" tocar as músicas destes artistas. Não era bem uma "proibição", apenas uma "recomendação", o que no fundo acaba por dar no mesmo. Era bem mais engraçado se fosse uma directiva aplicável a toda a URSS, mas no fim de contas era apenas o capricho de um qualquer camarada que não apreciava a retórica neo-fascista do Julio Iglesias.
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