Foi com profunda tristeza que fiquei a saber esta noite da partida do meu amigo José Francisco, aquele rapaz jeitoso ali em cima na imagem ao lado do "nosso" Cristiano Ronaldo. O Zé, simplesmente o Zé, mas que eu teimava em tratar por "você" (o que faço com praticamente toda a gente, mas por hábito, e nunca por diferenciação), era agente da Polícia Judiciária, e tive oportunidade de privar com ele durante alguns dias "à força", por assim dizer, quando em Abril de 2007 fizemos juntos a "recruta" em Cantão, durante aquele curso para Funcionários Públicos que muitos dos leitores que trabalham para a Administração terão também feito, certamente.
A impressão com que fiquei dele foi óptima. Não tenho nada contra polícias ou agentes da "Judite" ou qualquer outra figura da autoridade (com a excepção de padres e restante clero, que prefiro evitar), mas o Zé para mim era tudo menos "chibo" - magrito, baixote, cabelo à escovinha, tatuagens, barbinha de gato, era um vivaço. Aliás, agora que falo da "barbinha de gato", era isso mesmo que ele me fazia lembrar: um gato à solta, daqueles que andam aí pelos telhados à procura de um carapau, ao mesmo tempo que espreita as gatas. Era o "Zé Gato", para mim.
Na última noite em Cantão ficámos até depois das duas da matina no quarto de já nem me lembro de quem, eu, ele, o Manhão, o Mendonça e o César, a jogar à bisca e a mandar abaixo uma garrafa de Chivas - tudo no mais ordeiro dos convívios, entenda-se. Como estava na brigada de combate aos narcóticos (ou pelo menos nessa altura assim era), lembro-me das suas palavras, numa altura em que já todos tinhamos despertado o filósofo que há dentro de nós, que foram "a erva...pronto, esquece, pouco importa...agora o 'ecstasy', e os pós, e isso, tiram-te bocados do cérebro que depois não voltas a ter nunca mais". É deste tipo de educação anti-droga, dada por alguém tão descontraído e porreiro como o Zé que faz falta em Macau.
Via-o com frequência à porta da sede da PJ, na Rua Central, às vezes de manhãzinha e outras vezes ao fim do dia, sempre junto à entrada da garagem; cartãozinho de identificação ao pescoço, porque "agora tem que ser", sempre sorridente, bem disposto, mãos na cintura, olhos bem abertos. Sempre com um ar de quem a vida lhe corria às mil maravilhas. Chegava a ser contagiante. Penso que erá sido por volta de 2009 que foi transferido para a secção de Coloane, pouco importa, cumprimentava-o sempre que o via, quer tivesse passado um mês, seis meses ou até um ano. Não me vou atrever a dizer que era uma pessoa da minha intimidade, ou sequer próximo disso, mas era alguém que pelo simples facto de saber que andava por aí, aos "carapaus" desta vida, deixava-me satisfeito.
Agora deixou-nos, e não sei porquê. Quer dizer, não o via vai para os bons seis ou sete meses, e não sabia que estava doente, terá sido algo repentino? Era ainda um rapaz jovem, na casa dos quatenta, quem sabe ou um par de aninhos mais velho que eu, mais coisa, menos coisa. Fico consternado, abatido, desolado, mas não sei porque diabo, quando penso nele não consigo ficar triste. Lembrá-lo a sorrir, na risota, a consumir o seu cigarrinho com aquele ar gingão, fosese eu ter confiança com ele e perguntava-lhe: "olha lá, é mesmo 'chibo' ou és um agente infiltrado?". Pouco importa agora, pois conhecendo o pouco que conheci dele, duma coisa tenho a certeza: partiu com a mesma atitude de sempre, como da vez que foi transferido da Rua Central para Coloane. E espero que seja mesmo assim, e que a gente se encontre outra vez qualquer dia , e eu lhe dê o abraço que lhe fiquei a dever. Portanto fica combinado, "Zé Gato": até logo, pá!
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