quarta-feira, 28 de maio de 2014

A caminho do Brasil: altos e loiros


Hoje vou falar da participação das selecções escandinavas nos mundiais. Por Escandinávia entendem-se os quatro países que compõem aquela península - Suécia, Dinamarca, Noruega e Finlândia - e as ilhas adjacentes, Islândia e Ilhas Faroé. Suecos, dinamarqueses e noruegueses têm uma história mais ou menos respeitável em fases finais de campeonatos do mundo, enquanto Finlândia e Islândia, apesar de terem um rol de jogadores que alinharam em ligas competitivas um pouco pelo resto da Europa fora, ainda não se estrearam - os islandeses estiveram perto este ano, perdendo com a Croácia no "play-off" da zona europeia. As Ilhas Faroé, que politicamente são território noruguês, dificilmente podem ambicionar a tal feito, quer pela sua reduzida dimensão, quer pela sua população, de menos de 50 mil habitantes. Os jogadores nórdicos foram em tempos considerados pouco tecnicistas, muito dependentes do seu poderio físico, e apesar da evolução nos últimos, esse aspecto nunca os impediu de obterem resultados decentes. Vamos ver, então.


A primeira selecção sueca a participar num mundial, em 1934.

A Suécia é de longe a selecção escandinava com o melhor registo, com um 2º, dois terceiros e um quarto lugar, enquanto as suas vizinhas nunca chegariam sequer a umas meias-finais. A primeira participação deu-se em 1934, na Itália, onde venciam a Argentina na primeira ronda por 3-2, e seriam afastadas nos quartos-de-final pela Alemanha, por 2-1. Quatro anos depois, numa França à beira da guerra, chegavam mais longe, mas sem tanto mérito; na primeira fase jogariam com a Áustria, que nesse ano seria anexada pela Alemanha nazi, e nos quartos-de-final aplicaram uma goleada de 8-0 à frágil selecção de Cuba, mas nas meias-finais seriam "deitadas à terra" pela Hungria, com uma derrota por 1-5, e mais outra derrota frente ao Brasil no jogo de atribuição do 3º lugar, por 2-4.


A guerra não parece ter afectado os suecos, e em 1950 voltariam ainda mais fortes, e depois de conquistar o ouro olímpico no torneio de futebol dos jogos de Londres, surgiam no mundial do Brasil, onde chegariam à "poule" final. Determinante para essa brilhante campanha terá sido a vitória na primeira partida frente à favorita Itália, por 3-2, e a seguir bastou um empate a duas bolas frente ao Paraguai, uma vez que o grupo tinha apenas 3 selecções, por desistência da India. Na fase final veio uma pesada derrota frente ao Brasil por 7-1, novo desaire com o Uruguai, por 3-2, e o terceiro lugar ficaria garantido com uma vitória sobre a Espanha, por 3-1. Foi o último suspiro de geração de talentos nórdicos, pois em 1954 falhariam a qualificação para o mundial da Suíça.


A melhor Suécia de sempre, finalista em 1958 como país anfitrião.

Em 1958 a Suécia organizaria o torneio final pela primeira vez, e até agora única, e obtinha o seu melhor resultado, indo até à final, onde perderia com o Brasil. Na primeira fase venciam o grupo 3, com triunfos frente ao México por 3-0, Hungria por 2-1, e empate sem golos frente ao País de Gales. Na fase a eliminar mostraram fibra de campeões, vencendo a União Soviética por 2-0, e a campeã em título, a Alemanha Ocidental, por sólidos 3-1. Na final tiveram o azar de encontrar o jovem Pelé, então com 17 anos, o seu mentor Garrincha e a restante "canarinha" num dia "sim", e seriam derrotados sem apelo nem agravo por 2-5. Ficava o melhor registo de sempre da Suécia em mundiais, mas os nórdicos falhariam a qualificação para o mundial do Chile em 62, e para a Inglaterra em 66.


Os suecos regressariam em 1970 no mundial do México, e ficariam no Grupo 2, com Itália, Uruguai e Israel, e este ficaria tristemente célebre como um grupo onde pouco futebol se jogou, e muitas pernas foram pontapeadas. Depois de derrota por 1-0 com a Itália, seguiu-se um empate a um golo com Israel, num jogo em que a bola foi muito mal tratada, e a vitória frente ao Uruguai por 1-0 não chegou para anular a vantagem dos sul-americanos no "goal-average". A melhor Suécia antes do ressurgimento nos anos 90 foi a do mundial da Alemanha, em 1974, onde chegou à segunda fase. Inserida no Grupo 3, estreou-se com um comprometedor empate a zero com a Bulgária, mas aguentou frente à "laranja mecânica", a Holanda de Cruyff e companhia, e levou outro ponto resultante de outro nulo, e contra o Uruguai no último jogo deu um "baile", vencendo por 3-0, com o avançado dos holandeses do PSV, Ralf Edström, em grande destaque, ao apontar dois golos. Na segunda fase de grupos seriam afastados após derrotas nos primeiros dois jogos, contra a Polónia (0-1) e Alemanha Ocidental (2-4), despendido-se de forma honrosa com uma vitória por 2-1 frente à Jugoslávia. Em 1978, na Argentina, não começaram mal na primeira fase de grupos, impondo um empate a um golo frente ao Brasil, mas derrotas com a Áustria e com a Espanha, ambas por 1-0, valiam o último lugar do grupo e uma participação para esquecer.


Mas não seria a selecção sueca do mundial de 78 a ficar com a má fama da pior de sempre, pois após ausências em 82 e 86, eis que em 1990, na Itália, surge uma Suécia renovada, recheada de jogadores a alinhar em campeonatos europeus de grande nível. O primeiro jogo dos suecos seria contra o Brasil, um velho conhecido, e tinha o aliciante de estarem em campo vários jogadores a alinhar no campeonato português, especialmente no Benfica. Assim do lado do Brasil tinhamos Valdo e Ricardo Gomes, e do lado da Suécia Mats Magnusson e Jonas Thern, além de Stefan Schwarz, o lateral-esquerdo que assinaria pelos encarnados em 1991. Do lado do Brasil alinhou ainda o ex-benfiquista Mozer, então ao serviço do Marselha, e na Suécia o avançado Glenn Strömberg, que passou pela Luz na primeira metade dos anos 80, entraria a vinte minutos do fim. No Brasil o portista Branco alinhou no onze inicial, e o sportinguista Paulo Silas jogou os últimos dez minutos. Os brasileiros venceriam por 2-1, com dois golos de Careca contra um de Thomas Brolin, e ficaria a marcada a tendência para os nórdicos no torneio, pois a seguir perderiam com a Escócia e finalmente com a Costa Rica, também por duas bolas a uma.


Em 1994, nos Estados Unidos, a Suécia apaga a má impressão deixada em Itália, e alcança o seu terceiro pódio em mundiais. Com o guarda-redes e capitão Thomas Ravelli, o mais internacional de sempre dos nórdicos até Setembro de 2013, quando foi ultrapassado pelo médio Anders Svensson, a comandar uma equipa onde pontificavam Thern, Schwarz e Brolin, além da dupla de avançados Kenneth Andersson e Henrik Larsson, especialmente inspirada. Depois de um início tremido, com empate a duas bolas contra os Camarões, seguiu-se uma vitória frente à Rússia por 3-1 e novo empate frente ao Brasil a uma bola. Nos oitavos vitória frente à Arábia Saudita, novamente por 3-1, e passagem à meias-finais após desempate nos "penalties" contra a Roménia, depois de 2-2 ao fim de 120 minutos. Nas meias-finais, novamente o Brasil, e derrota por uma bola a zero - é preciso ter azar, pois a Suécia defrontou a "canarinha" nada mais nada menos do que seis vezes, e nunca ganhou. É obra. No jogo de consolação, vitória por 4-0 sobre a Bulgária, com golos de Brolin, Andersson, Larsson e Håkan Mild (não se esqueçam da bolinha em cima do "a", muito importante). O 3º lugar ficou a ser saboreado durante muito tempo, pois os suecos falhariam o mundial de 98 em França.


As participações em 2002 e 2006 ficaram a saber a pouco; na Coreia e Japão tiveram o mérito de vencer o Grupo F à frente da Inglaterra, e afastando a Argentina, mas nos oitavos seriam surpreendidos pelo Senegal, perdendo por 1-2 no prolongamento por morte súbita. Quatro anos depois na Alemanha, ficariam em 2º lugar no Grupo B, e desta feita atrás dos ingleses, e seriam afastados na fase seguinte pela equipa da casa, numa partida em que o defesa Teddy Lučić foi expulso logo aos 35 minutos, e terminaria com 2-0 para os alemães. E foi a última vez que vimos os suecos em mundiais, pois falhariam a qualificação em 2010, e para o mundial do Brasil deste ano perderiam com Portugal no "play-off", numa jornada de boa memória para as nossas cores.


A Dinamarca só participaria pela primeira vez em 1986 no México, vinda de um excelente campeonato europeu dois anos antes, onde chegou às meias-finais. A equipa orientada pelo alemão Sepp Piontek incluía estrelas como - e atenção aos preciosismos próprios do alfabeto nórdico, com os seus "å", "æ" e "ø" - Søren Lerby, Jan Mølby, Jesper Olsen ou o avançado Preben Elkjær Larsen, e na estreia venciam a Escócia por 1-0, exactamente com golo de Larsen. No segundo jogo frente ao Uruguai os "Danes" mostram que não estão no México só para apanhar sol e comer "frijoles fritos", e goleam o Uruguai por 6-1, com Larsen a apontar um "hat-trick". A fase de grupos terminaria 100% vitoriosa com 2-0 sobre à Alemanha Ocidental, mas nos oitavos frente à Espanha seriam apanhados pelo vendaval Butragueño, com o avançado do Real Madrid a apontar quatro golos na vitória de 5-1 da "roja". Mesmo assim uma estreia auspiciosa dos dinamarqueses.


Apesar de se terem sagrado campeões da europa em 1992, não seria até 1998 que veriamos os dinamarqueses novamente num mundial. Em França, com o guarda-redes Peter Schmeichel na baliza, e
com os irmãos Michael e Brian Laudrup na frente a criar pânico nas defesas adversárias, os nórdicos viriam a obter um honroso quinto lugar. Depois de uma primeira fase complicada, com vitória por 1-0 contra a Arábia Saudita, empate a um golo com a África do Sul e derrota por 1-2 com a anfitriã França, a equipa orientada pelo sueco Bo Johansson golearia a Nigéria por 4-1 nos oitavos, perdendo depois para o Brasil por 2-3 nos quartos-de-final, mas não sem dar luta. Martin Jørgensen marcava o primeiro logo aos dois minutos, e o "escrete" iria precisar de mostrar o que valia, operando a reviravolta com golos de Bebeto aos 11, e Rivaldo aos 27. No quinto minuto da segunda parte, um lance que ficaria célebre: Roberto Carlos tenta um corte na área do Brasil com pontapé de bicicleta, mas falha e deixa a bola disponível para Brian Laudrup, que empata a partida. Valeu a tarde inspirada de Rivaldo em Nantes, e aos 60 minutos o avançado do Barcelona faz o 3-2, mandando os dinamarqueses de volta à Escandinávia.


Em 2002, no mundial da Coreia e do Japão, a Dinamarca faz a sua terceira participação, e depois de uma fase de grupos promissora, onde vencem o Grupo A, vencendo o Uruguai e a França, são banalizados pela Inglaterra, que com golos Ferdinand, Owen e Heskey, todos na primeira parte, mandam os dinamarqueses de volta ao reino da Dinamarca com 3-0. Ausentes em 2006 na Alemanha, voltam em 2010 na África do Sul, mas sem argumentos, ficando pela fase de grupos após derrota com o Japão por 1-3, um episódio deveras humilhante para quem um dia fez o Brasil de Ronaldo, Rivaldo, Roberto Carlos e Bebeto suar as estopinhas. Este ano ficam em casa, a repensar a estratégia para um regresso condigno aos grandes palcos do futebol mundial.


Finalmente falemos da Noruega, que participou pela primeira vez decorria o longíquo ano de 1938, ficando pela primeira ronda, após derrota com a Itália por 2-1, após prolongamento - nada mau, tendo em conta que os italianos se sagrariam campeões mundiais. Aliás a Itália apareceria sempre no caminho da Noruega mundialista; depois de uma longo período de hibernação, os nórdicos voltam em 1994, nos Estados Unidos, com uma equipa de pendor assumidamente defensivo, mas com o mérito de se qualificarem em detrimento da Inglaterra - mérito para Egil Olsen, autor da revolução que aproveitou a geração de jogadores noruegueses a jogar em equipas estrangeiras, especialmente da Premier League inglesa. Sem praticar um futebol atraente por aí além, estream-se com uma vitória por 1-0 em Washington frente ao México, com um golo de Kjetil Rekdal a seis minutos do fim. A seguir perdem por 0-1 com a Itália, e empatam a zero com a Rep. Irlanda, terminando o grupo em último lugar com quatro pontos - os mesmos que as restantes equipas, mas com desvantagem no "goal-average". Tinha valido pelo regresso.


Em 1998 regressava a Noruega e regressava também Egil Olsen, com uma equipa de estrelas: Henning Berg, Ronny Johnsen e Ole Gunnar Solskjær (Manchester United), Stig Inge Bjørnebye e Øyvind Leonhardsen (Liverpool), Tore Andre Flo (Chelsea), e alguns dos elementos da equipa do Rosenbrog que tinha dado nas vistas nas edições anteriores da Liga dos Campeões. A equipa prometia, especialmente depois da vitória por 4-2 frente ao Brasil no início desse ano, que seria a primeira derrota da "canarinha" em quase dois anos. Integrados no Grupo A do mundial de França precisamente com os brasileiros, além de Marrocos e da Escócia, os noruegueses estavam apostados em chegar longe, mas dois empates contra os africanos (2-2) e escoceses (1-1) complicavam as contas, e era obrigatório vencer o Brasil para seguir em frente. E foi isso mesmo que fizeram, derrotando a "canarinha" por 2-1, com golos de Flo e Rekdal nos últimos dez minutos, depois de Bebeto ter inaugurado o marcador aos 78 minutos. Nos oitavos os nórdicos voltariam a esbarrar com a Itália, com um único golo de Vieri aos 18 minutos. E mais não se viu da Noruega em mundiais, até hoje.



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