terça-feira, 3 de dezembro de 2013

O dóidóimetro de Cheong Ü


O Secretário para os Assuntos Sociais e Cultura, Cheong Ü, apresentou ontem e hoje as LAG para a sua pasta, que inclui áreas tão sensíveis como a Saúde, a Educação, a Acção Social, o Desporto, o Turismo, e parece que a Cultura também, se bem que este aspecto parece ser remetido para um plano secundário, apesar de ter a honra de constituír a segunda metade do nome da tutela.

Cheong Ü é uma óptima pessoa, e a sua nomeação em 2009 para esta secretaria foi uma espécie de recompense pelo frete de ter ficado dez anos à frente do CCAC, o Comissariado Contra a Corrupção. Não é fácil andar na rua de cabeça baixa e ignorar os larápios com quem durante anos se bebiam uns copos e se davam umas palmadinhas nas costas. E o sentimento era recíproco: quando os "bons malandros" avistavam Cheong Ü à distância, tocavam-se com os cotovelos e diziam: "epá agora disfarça, que vem aí o bufo do Cheong Ü". É uma vida triste, esta de obrigar a dar o exemplo numa cidade como Macau.

Cheong Ü não se dá lá muito bem com isto das LAG. Explicações não é com ele. O senhor gosta mais de comer, loh, beber, loh, dançar loh, como deixou claro na inauguração do último Festival da Lusofonia. Mas será que sabe dançar? Ele sabe dançar, oh oh oh. É o próprio que nos garante. Mas quando a música é dada pelos deputados da Assembleia Legislativa, o sr. secretário sente-se como um concorrente do "Dança comigo no gelo", só que não sabe patinar.

A propósito da famigerada lei sobre a violência doméstica, que se insere no âmbito dos "assuntos sociais", Cheong Ü espalhou-se ao comprido, sugerindo que alguns tipos de agressão "não são graves". Recordando a importância de uma família "unida e harmonosiosa", uma parangona muito comum em Macau, o secretário desvalorizou aquilo se chama "agressões pontuais", que considera "normais" entre casais. Enfim, uma cabeça partida ou um olho roxo não são razão para chamar a polícia. Vá lá, em briga de marido e mulher, não se mete a colher.

E quem pode censurar Cheong Ü por dizer algo que já foi repetido por outros figurões com cargos de responsabilidade? Elevar a violência doméstica ao estatuto de crime público implica que a intervenção do Ministério Público deixa de depender da queixa da vítima. Basta um copo na testa e uma chamada para a bófia, e o maridão marialva fica num mundo de sarilhos, e nem que faça as pazes com a cachopa que tem lá em casa se livra da barra dos tribunais. Isto não pode ser, meus amigos. Já se sabe como as mulheres exageram, e como podem ser sensíveis, especialmente naquela altura do mês. Levadas pelos seus instintos mais primários, "partem a loiça toda", acusam o marido de agressão, e depois para remediar a cagada que fizeram é uma carga de trabalhos.

Nesta questão da violência doméstica Macau assemelha-se à Arábia Saudita ou outro país islâmico mais radical, onde as mulheres são tratadas piores que o cão ou que o papagaio. Esqueçam a matriz portuguesa do Direito, ou o Direito continental, pois aqui o que vigora é o Corão, transmitido por Deus todo poderoso e ditado por Gabriel ao profeta Maomé. Vejamos o que diz o livro da Sura, quarto capítulo, linha 34:

Os homens têm autoridade sobre as mulheres, pelo que Alá preferiu alguns a outros, e pelo que despendem de suas riquezas. Então, as íntegras são devotas, custódias da honra, na ausência dos maridos. E àquelas de quem temeis a desobediência, exortai-as, pois, e abandonai-as no leito, e batei-lhes....

Simplificando o testamento do profeta, o que ali se diz é mais ou menos isto: se a mulher se armar em parva, primeiro recebe um aviso, e se insistir, dorme sozinha (de preferência no sofá), e se mesmo assim não tiver ainda aprendido, aplica-se uma boa dose de roupa chegada ao pêlo, que normalmente resulta, e se não resultar, é porque anda mesmo a pedi-las, a vadia. Bater, bater, e bater outra vez até ela perceber, é o que se recomenda. E depois não digam que não lhe quiseram ensinar modos.

Entregar a uma mulher o poder de decidir apresentar uma queixa-crime contra o marido, o ganha-pão do lar, é uma decisão controversa, que não pode ser tomada de ânimo leve. As mulheres pensam mais com o coração do que com a cabeça, e os seus depoimentos carecem de credibilidade. Por exemplo, na Arábia Saudita ou no Paquistão, uma mulher que seja agredida ou violada tem que apresentar testemunhas do sexo masculino, porque o seu julgamento está embaciado pelo facto de serem histéricas, e por isso é que gritam tanto quando estão a dar à luz os guerreiros de Alá, perdão, os bebés. E numa sociedade patriarcal como é Macau, quem nos garante que uma mulher está a falar a sério quando diz que o marido a agrediu?

Assim, como vamos saber que tipo de agressão justifica a intervenção da justiça? Quanta porrada é preciso dar na mulher para que seja considerado crime? É fácil: enquanto o audiodosímetro mede a intensidade sonora em decibéis (dB), o dóidóimetro mede a intensidade da porrada, e dóidóis (dd). A partir de 50 dd, pode-se considerar "agressão", mas tudo o que seja menos do que isso, são festinhas, dentadinhas de amor, beijocas apaixonadas. Portanto instala-se o dóidóimetro na potencial vítima, e assim que a intensidade da porrada ultrapassar os 50 dd, soa um alarme, vem a polícia, e lá vai o marido parar em tribunal, quer a esposa o perdoe (se sobreviver), ou não. Para quem não sabe quanto são 50 dd, e até onde pode ir, aqui está a tabela:

11-20 dd: empurrão, safanão, puxão, beliscão (sem nódoa negra).

21-30 dd: puxão de cabelos ligeiro e breve, empurrão com queda ligeira, beliscão (com nódoa negra), pontapé (sem nódoa negra), estalo com palma da mão.

31-40 dd: pontapé (com nódoa negra), puxão de cabelos prolongado e forte, estalo com costas da mão (com ou sem olho roxo), agressão com objecto pequeno, leve e não contundente (livro, aparelho de telefone, etc.)

41-50 dd: pontapé ou pontapés fortes abaixo da cintura, murro que não provoque fractura, deslocação ou quebra de ossos, empurrão que provoque queda desamparada, mas sem deixar marcas, agressão com objecto de peso médio, mas não contundente (cadeira, vaso de plástico, etc.), dentadas que deixem marca mas não provoquem derramento de sangue, arranhões (desde que não provoquem cegueira).

51-60 dd: estalos sucessivos que provoquem derrames sanguíneos, murros com olho roxo, empurrões que provoquem fracturas ou concussões, agressões na cabeça com concussão, agressão com objectos contundentes (cinzeiros, vasos de barro ou de loiça, copos, pratos, etc.).

61-70 dd: sovas de cinto ou de vergasta que deixem marcas prolongadas ou definitivas, queimaduras de cigarro, murros com olho roxo e perda de dentes, empurrões de provoquem desfalecimento, ossos quebrado e fracturas expostas, arranhões que provoquem cegueira parcial e/ou temporária, agressão com objectos pesados e possivelmente contundentes (panelas, frigideiras, pequenos electrodomésticos, etc.).

71-80 dd: pontapés na vagina, ovários, útero e seios, empurrão de uma distância considerável (até 5 metros de altura), socos que reduzam a cara da vítima a uma polpa, agressão com objectos pesados e possivelmente perigosos (bilhas de gás, extintores de incêndio), líquidos corrosivos ou inflamáveis ou objectos contundentes (facas, catanas, cimitarras, adagas, sabres, punhais) que não provoquem a morte ou incapacitação definitiva), qualquer agressão que provoque cegueira total e definitiva.

81+ dd: agressão com armas de fogo e explosivos, empurrão de uma distância de mais de 5 metros, atropelamento, enfim, qualquer coisa que provoque a morte ou a paralisia total definitiva.

E assim fica tudo mais simples. Para quê destruír um lar ou aborrecer o Ministério Público com coisas de nada, como um simples arraial de porrada, que até pode servir um propósito educativo? Como dizia o João da Ega, personagem da obra "Os Maias", do nosso eterno Eça, "aqui não há morte de homem". Ou de mulher, neste caso. Atendendo que o sr. secretário tem também a seu cargo a tutela do desporto, pode-se considerar uma simples rixa entre um casal uma actividade "saudável". Mas falando mais a sério, não sei se Cheong Ü aplica esta medida na sua própria casa. Se for esse o caso, tenho muita pena da sra. Cheong.

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