Racismo? Não...é um Donut, estúpido!

Adoro Donuts, e sempre que vou a um país das redondezas onde existam donuts dignos desse nome, mato as saudades causadas pela pasmaceira que em Macau faz com que os consumidores pensem que “dar 20 patacas por um bolo é um roubo”. Assim ficam-se pelos po-lou-paus, pois com uma nota de vinte “compra-se uma caixa de arroz”. Coitados. Mas adiante, que dos fracos não reza a História. Mal chego ao aeroporto de Clark, em Manila nas Filipinas, compro logo uma caixa cheia de delícias cremosas de todos os sabores, e de rosquinhas cobertas de chocolate ou polvilhadas de açucar e canela, com “sprinkles”, amêndoas, e bolas que agora vou parar que a saliva escorre-me pelos cantos da boca.

A maior marca que produz estas delícias é a Dunkin’ Donuts, e não é nas Filipinas mas sim na Tailândia que está agora no centro de uma polémica, e tudo por causa de um cartaz publicitário “atrevido”. O anúncio em questão anuncia o “Charcoal Donut”, que literalmente se traduz para “donut de carvão”, uma rosca coberta de chocolate negro. O cartaz mostra uma mulher com a cara pintada de negro, lábios carregados de baton vermelho e um penteado “retro”, fazendo lembrar a cabeleira das mulheres negras da América dos anos 50, segurando o tal donut. Talvez isto tenha passado despercebido à maior parte dos tailandeses, mas a secção asiática da Human Rights Watch considera o anúncio “racista”, fazendo lembrar a descrição estereótipada dos negros nos tempos da segragação racial na América, considerados hoje síbolos de uma era racista – ainda bem que a modelo no cartaz segura um donut, e não uma fatia de melancia.

Phil Robertson, representante daquela associação de direitos humanos na Ásia, diz que “é tragicamente bizarro que para publicitar um donut de chocolate pintem uma mulher de negro, acentuando orubro dos lábios”. Robertson apela à Dunkin’ Donuts que retire o anúncio e faça um pedido de desculpas, reiterando que “na América um cartaz deste tipo causaria ondas de choque”. E eu digo mais: causaria tumultos a fazer lembrar a Batalha de Los Angeles, os incidentes que se seguiram à agressão do motorista negro Rodney King por agentes policiais brancos.

Mas aí está, isso é lá na América, e aqui estamos a falar da Tailândia, e quem recordou a Human Rights Watch disso mesmo foi Nadhim Salhani, administador-geral da Dunkin’ Donuts tailandesa, que diz que tudo não passa de “paranóia americana”. Salhani, um libanês radicado na Tailândia, diz que não compreende a preocupação da associação: “Isto é ridículo; quer dizer que não podemos usar o preto para publicitar os nossos produtos? E se pintasse alguém de branco, seria também racista?”. Curiosamente o modelo escolhido para esta campanha é a própria filha de Salhani, portanto fica tudo em casa. O CEO recordou que a Dunkin’ Donuts tailandesa opera independentemente da sucursal norte-americana, e que as vendas subiram em 50% desde que a campanha foi lançada há duas semanas – suponho que será porque os tailandeses gostam de donuts, e de chocolate? Não sei.

A relação dos tailandeses com este tipo de “sensibilidades” é atribulada. Uma marca de esfregonas do chão e espanadores chamada “Black Man” usa um logotipo onde se vê um homem negro de “smoking” a sorrir, exibindo os dentes imaculadamente brancos. Um anúncio televisivo de cremes branqueadores diz que “as pessoas com pele mais branca têm mais perspectivas de uma carreira de sucesso”, enquanto uma pasta dentifrica herbal de cor preta anuncia que “é preta, mas é boa”. Recentemente uma universidade em Bangkok foi notícia ao pintar um mural onde aparecia Adolf Hitler lado-a-lado com conhecidos super-heróis da ficção. Talvez os tailandeses tenham muito que aprender no que diz respeito ao politicamente correcto, e precisam de umas lições de História, mas não posso deixar de ficar do lado dos donuts: os americanos vêem racismo em quase tudo. Se calhar ainda não conhecem os nossos Conguitos, aqueles deliciosos amendoins cobertos de chocolate com o desenho de um pigmeu africano no pacote. O que para nós é apenas um “snack” para adoçar a boca no cinema ou no serviço, para eles é um símbolo da opressão, um passado racista, e onde há apenas amendoins para eles há negros acorrentados a levar com o chicote. Não há mesmo pachorra para estes gajos.