Segunda-feira após mais um Domingo de eleições em Macau, regresso à normalidade. A imprensa escrita e audiovisual dava natural destaque aos resultados do sufrágio, dando primazia à vitória histórica e esclarecedora de Chan Meng Kam, da Associação dos Cidadãos Unidos de Macau (ACUM). Em segundo lugar ficou Mak Soi Kun, que de virtual desconhecido em 2009, quando obteve a eleição para um primeiro mandato na AL. Quatro anos depois, a sua Associação Macau-Guangdong "dispara" na votação, e transforma-se na segunda maior força política. Tanto a ACUM como a Macau-Guangdong têm algo em comum: a ligação com o continente. É preocupante que mais de um terço do eleitorado, qualquer coisa como 43 mil alminhas, tenha optado por listas com fortes ligações à RPC. Se no caso de Mak Soi Kun trata-se de um gritante caso de foleirice da parte de 16 mil indivíduos que votam em quem lhes ofereça um prato de sopa, a popularidade de Chan Meng Kam é passivel de outras leituras.
Chan Meng Kam é originário da provícia de Fujian, na costa nordeste da China. Vindo para Macau ainda pequeno, integrado no seio de uma família pobre, começou a trabalhar desde muito cedo, travou os conhecimentos certos, e na idade adulta já tinha construído um respeitável império financeiro. Em 2005 resolveu levar a sua determinação à esfera da política, elegendo dois deputados logo na primeira tentativa, o que muitos entenderam como um grito de revolta da parte dos chineses da China, que procuravam uma referêcia. Depois da queda em 2006, a ACUM passou a realizar acções de campanha além da esfera eleitoral da sua preferência. A ascensão de Chan Meng Kam em termos politicos não é de desprezar. O actual presidente do PC chinês foi Governador da provincial de Fujian entre 1999 e 2002, altura em que criou laços de amizade com Chan, bem como uma importante parceria no ramo dos negócios. Não é nenhuma loucura assumir que os próximos nove anos de Xin na liderança da China poderão significar a ascensão de Chan a um cargo de maior responsabilidade, e no contexto de Macau, esse cargo pode ser o de Chefe do Executivo. A seguir com atenção, com final e epílogo prolongado depois de 2020.
No rescaldo dos resultados da eleição, e enquanto alguns celebravam e outros se lamentavam, havia quem tivesse dúvidas. A luta pela eleição do 14º e último deputado foi renhida, e o nº 2 da Nova Esperança de Pereira Coutinho, Leong Veng Chai, levou vantagem sobre o vice de Angela Leong, um tal de Kent Wong, por apenas 17 votos. No dia de hoje a patroa da SJM apareceu nos SAFP a exigir a recontagem dos votos, para ver se se aproveita qualquer coisinha entre os votos nulos, mal contados ou borrados de escarreta e cócó. Pereira Coutinho foi chamado à Comissão Eleitoral pela hora de almoço, ainda a ressacar da farra da noite anterior, e lá ficaram os dois a tarde toda na cave do Edifício Administração Pública a chover no molhado, com a candidata lista 1 a tentar enfiar o seu imediato pela porta do cachorro, passando a perna ao seu adversário, um expediente que não lhe é de todo estranho, sendo ela uma especialista neste tipo de jogo de cintura. E de anca. E ainda de quadril. Bom, é melhor ficar por aqui. Esta proximidade no número de votos recorda-me de um dos maiores exemplos de "fair-play" democrático em toda a história. Nas eleições presidenciais de Cabo Verde em 2001, o candidato Pedro Pires bateu Carlos Veiga por menos de mil votos - e recordo que esto a falar de eleições presidenciais - e este último apressou-se a reconhecer a derrota e a felicitar o adversário, sem pedir uma recontagem. Para bem da caganita de democracia que ainda vai restando, espero que Coutinho mantenha o segundo deputado, e a senhora mais conhecida por "a quarta" vá dar uma curva. Daqui a dois dias ficaremos a saber.
Esta manhã procurei recolher reações da parte dos meus colegas chineses quanto aos resultados eleitorais. Entre alguns mais agitados - na maioria macaenses - notei uma indiferença gélida entre os restantes, que pareciam ter achado alguma graça ao facto de mais de um terço dos lugares elegíveis para a AL fossem ocupados por listas compostas de elementos da China continental. Entre os que riam para espantar os maus espíritos e os que tinham opinião formada, não encontrei uma única pessoa que considerasse estes resultados positivos para Macau, para o seu futuro, e para os desafios que temos pela frente. Foi mais que um passo atrás no longo caminho da autonomia e da construção de uma identidade própria. Com o sinal que foi dado pelo eleitorado, mais vale derrubar já as Portas do Cerco e começar a aprender o dialecti fukinense. Uma palavra final para o director do JTM, José Rocha Dinis, que comentou os resultados na sua habitual rubrica dedicada à opinião no Telejornal das segundas. Quando esperava que se fosse vangloriar da derrota das forças anti-poder, JRD desvalorizou a importância do acto eleitoral, reduzindo-o à importância residual que tem em termos de influência política no território. Concordo e assino por baixo.
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