quarta-feira, 25 de setembro de 2013

SOS Lusofonia


Atenção! Alerta! Os Jogos da Lusofonia estão em risco! Mulheres e crianças primeiro! É mesmo assim, e isto tem-me tirado o sono. Os III Jogos da Lusofonia, competição organizada pela Associação de Comités Olímpicos de Língua Oficial Portuguesa (ACOLOP) iam realizar-se em Novembro em Goa, cidade da antiga India portuguesa, mas o atraso nas infra-estruturas torna impossível organizar os jogos nessa data, pelo que se ponderou o cancelamento. A ACOLOP (que tem este logo que parece ter sido desenhado pelos alunos da 1ª classe da Escola Portuguesa de Luanda) reuniu-se de emergência em Macau (que honra), e ficou decidido o adiamento para Janeiro de 2014 – dois meses depois. Para garantir que a malta goesa se mexe e não fica deitada à sombra da canforeira, a ACOLOP vai mandar em Dezembro uma delegação para inspecionar as obras.

Os Jogos da Lusofonia, uma ideia inspirada nos Commonwealth Games, onde participam os melhores atletas de inúmeros países que fizeram parte do vasto império britânico, tiveram a sua primeira edição em Outubro de 2006 em Macau, aproveitando então as infra-estruturas criadas na RAEM para acolher os Jogos da Ásia Oriental um ano antes. Em 2009 foi a vez de Portugal organizar o certame, já com Goa no horizonte quatro anos depois. O futuro destas olimpíadas lusófonas está assegurado, pelo menos no papel; Maputo organizará em 2017, e Luanda em 2021. Não sei bem porque razão, Goa não parece muito entusiasmada em acolher os Jogos da Lusofonia, e uma eventual desistência poderia colocar em causa a própria legitimidade do evento.

E é da legitimidade do evento, e já agora da sua liquidez, que importa falar. Ao contrário da Commonwealth, que é composta por países que são potências do desporto mundial (África do Sul, Austrália, Nigéria, Canadá, além dos países que compõem o Reino Unido), esta Lusofonia é um pouquinho insonsa em competitividade. Brasil e Portugal açambarcam o grosso das medalhas sem muito esforço, Angola e Moçambique fazem uma gracinha ou outra, mas para as restantes delegações é difícil obter uma medalha, e sai caro participar, quanto mais organizar. Acolher um evento desta natureza, onde o retorno não justifica o investimento – nem de longe – é dispendioso, e se é para fazê-lo "por amizade", façam os outros. Sejam eles os "amigos".

Em termos desportivos os jogos não são o que se pode chamar um chamariz de multidões. Os países levam atletas de segunda, e mesmo dos desportos colectivos, que podem atraír mais público, salva-se o basquetebol, onde há três ou quatro países que podem disputar o ouro. O voleibol é uma lástima, e todos pecam pela ausência de uma formação brasileira. O COB leva sempre uma delegação numerosa, mas ao não levar uma equipa de futebol de onze, por exemplo, comete um ultraje que leva a questionar a importância com que encara estes jogos. O número de atletas que o futebol movimenta no Brasil é mais que suficiente para que mandem 20 à Lusofonia. Nem precisavam de ser profissionais, podiam ser até um grupo de "brinca-na-areia", que seriam com toda a certeza candidatos ao ouro.

O desinteresse geral, a falta de promoção, a ausência de público, as indiferentes transmissões televisivas, são tudo obstáculos que a ACOLOP tem pela frente nos próximos anos. O pior mesmo é a indiferença dos atletas; voltando a comparar com os Jogos da Commonwealth – ao contrário destes a vitória de um atleta numa prova da Lusofonia mal chega a ser notícia nacional, quanto mais internacional. Que atleta se vai sentir honrado por participar nestes jogos, ou vencer perante competição nitidamente inferior? Quantos choram ao subir ao lugar mais alto do pódio e escutar o seu hino? E porque não incluir desportos mais, digamos, "lusófonos"? Não estou a falar do chinquilho nem do jogo da malha, mas o desprezo pelo hóquei em patins, por exemplo, é imperdoável.

O que pode salvar estes Jogos da Lusofonia é uma operação de cosmética, qualquer coisa que possa alargar o âmbito de interesse destes jogos. Gostava de poder dizer que a adesão da Guiné-Equatorial e do Sri Lanka à ACOLOP é "um bom começo", mas nem isso. É preciso muito mais, caso contrário estes jogos entrarão para a História como mais um delírio desses "tugas com a mania das grandezas". E de facto, se não somos grandes, para quê aspirar a tal empreitada?

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