quarta-feira, 4 de junho de 2014

O (muito) que ficou por dizer


Foi com uma enorme expectativa que assisti ao programa TDM Entrevista de ontem, onde o entrevistado de Marco Carvalho foi o jurista e professor do Instituto Politécnico António Katchi, um personagem que admiro, e de que tenho pena que não seja mais tido e achado sobre os diversos relacionados com a proto-política que se faz na RAEM. E com mais pena fiquei que tivesse desperdiçado esta oportunidade para abordar alguns temas "quentes" da forma incisiva e directa a que nos habituou num passado recente. Trinta já não é muito para expôr com clareza a opinião sobre a actualidade, e esta é uma fase em que há muito para ser dito, atendendo aos acontecimentos dos últimos dez dias, com um prólogo a 25 de Maio, aquando da manifestação contra a lei de garantias para os titulares dos principais cargos públicos, com "prémio da montanha" no dia 27 em frente à Assembleia Legislativa e outro que promete, hoje no Largo do Senado, e chegada à meta no dia 8, quando se realizar mais uma manifestação, esta a favor do sufrágio universal. Já que se fala tanto de "timing", este era o ideal para ouvir de Katchi, que se tem pautado pela discrição durante esta semana e pouco que tem virado Macau do avesso em alguns aspectos em que era importante virar.

Como já referi, Antóno Katchi é docente do IPM, onde lecionou entre 2012 e o presente as cadeiras de Direito Civil, Administração Pública, Direito Laboral, Ciência Política, Pensamento Político, entre outras - isto segundo a página do próprio IPM, onde estranhamente as disciplinas aparecem em chinês e inglês, apesar do docente ensinar em Português, pelo menos algumas delas, isto posso garantir. Nunca assisti a uma aula de Katchi, mas conheço quem tenha sido seu aluno, e a opinião que têm dele é positiva, contudo deixam bem claro que é um professor ideal para quem "gosta de ouvir", ou seja, que não promove a participação ou o debate na sala de aula. Por mim tudo bem, até gosto de o ouvir, mas já o vi fazer melhor que ontem no programa da TDM, onde "mastigou" a meia-hora a que teve direito, remetendo-se a uma análise muito "in libro", muita presa, muito técnica. Não chegou a exibir os dotes de oratória que tanto admiro nele, nem deixou saber o que pensa sinceramente dos últimos acontecimentos que marcaram estes últimos tempos e mexeram com a apatia que reinava na estrutura social do território. Mais parecia estar numa das suas aulas, e a certo ponto deu-me a entender que o próprio Marco Carvalho estava a ficar com sono, embalado pela retórica ambígua e redundante do professor.

Eu não quero que ele vá à televisão para me entreter, ou para me fazer rir. Nada disso. Nem quero que se comprometa disparando na direcção dos dirigentes da RAEM - como aliás fez no passado, e bem - mas gostava de o ter visto a soltar-se das amarras do mero parecer técnico, e fizesse qualquer coisa de criativo, que fizesse uma previsão, sei lá, uma crítica, um apontamento, algo de novo. Não chegou sequer a apontar as razões que levaram ao descontentamento da população com o Executivo, que os levou finalmente às ruas para se fazer ouvir a sua voz. Se o fez, será preciso filtrar o essencial de toda a "palha" que ali debitou. A opinião sobre o papel da comunidade portuguesa na vida "política" - insisto que em Macau não se faz política, daí as aspas - do território peca pelas meias intenções. Sim, é um facto que uma boa parte da nossa comunidade tem um vínculo laboral precário, e na maior parte dos casos com a Administração, o que pode levar a um certo acanhamento na hora de emitir opiniões sobre o desempenho dos dirigentes da RAEM, mas também não é menos verdade que têm o seu limite, e se optam por simplesmente desempenhar as suas funções meramente tecnocráticas, deixam entender que existe uma fronteira que não deixam ultrapassar, demonstrando que não precisam de se humilhar em nome dos contratos que, logicamente, gostariam de ver renovados. Isto era uma coisa com que os locais podiam aprender. Lealdade sim, protocolo, concerteza, mas...sempre um mas. Manter certas reservas, pois ninguém é perfeito.

Achei especialmente curiosa a análise às eleições europeias, também no dia 25, e a análise da relação entre os eleitores portugueses e europeus em geral com a própria União Europeia, focando essa análise nos números da abstenção, desvalorizando a expressão dos resultados de algumas forças consideradas "de bloqueio" para o ideal da construção europeia. Mas isto em eleições é mesmo assim: os que votam vão votar também pelos que não votam, e ninguém nos diz que partido A que teve um milhão de votos com 50% de participação, não teria um milhão no caso de todos os eleitores irem cumprir o seu dever cívico. É assim que funciona, contam-se os votos que estão nas urnas, não os que não estão, ou as intenções de voto, sejam elas do nosso agrado ou não. Foi engraçado ouvi-lo chamar de "extrema-direita" às listas que se situam na mesma esfera política da Frente Nacional francesa, liderada pela controversa Marine Le Pen, mas chama de "forças de esquerda que se opõem à integração europeia" àquilo que eu e muita gente chamaria de "extrema-esquerda", que também existe, e temos o exemplo do SYRIZA, o grande vencedor das eleições europeias na Grécia, que significa literalmente "União da Esquerda Radical", e é composto por um sortido de pequenos e médios partidos de ideologia assumidamente marxista-leninista, trotskista, e até maoista, pasme-se. Pode ser que na Eslováquia a abstenção tenha sido de 85% (87% segundo o site da UE), mas na hora de votar para o que realmente interessa, ninguém nos diz que a expressão do descontentamento por uns ou do apoio a outros não se venha também a manifestar com mais adesão às urnas.

No fundo sinto que António Katchi prefere não dizer o que pensa, ou que já terá dito tudo o que tinha para dizer. E atendendo ao facto que, e nunca é demais recordá-lo, aqui não se faz política, que as manifestações fim de Maio e início de Junho na RAEM não sejam mais do que apenas aquilo que considerou de "inevitável" quando no passado afirmou (penso que na eleição do Chefe do Executivo há cinco anos) que dos possíveis candidatos ao principal cargo político da Região Administrativa "não encontrava uma única figura que achasse recomendável ou competente". E assim o tempo deu-lhe razão. Vou continuar atento, como sempre estive, e pode ser que nos brinde com alguma da sua sempre oportuna análise da próxima vez, quando tiver novidades para nos contar. Mesmo assim obrigado poe aparecer, e até breve, espero eu.


2 comentários:

Anónimo disse...

"é um professor ideal para quem "gosta de ouvir", ou seja, que não promove a participação ou o debate na sala de aula" - a sério?!?! Para quem condena os outros por falarem do que não sabem, estás a enfiar a pata bem fundo na poça! Fala do que sabes e deixa os palpites para o futebol!

Leocardo disse...

"Nunca assisti a uma aula de Katchi, mas conheço quem tenha sido seu aluno, e a opinião que têm dele é positiva, contudo deixam bem claro que é um professor ideal para quem "gosta de ouvir", ou seja, que não promove a participação ou o debate na sala de aula.Nunca assisti a uma aula de Katchi, mas conheço quem tenha sido seu aluno, e a opinião que têm dele é positiva, contudo deixam bem claro que é um professor ideal para quem "gosta de ouvir", ou seja, que não promove a participação ou o debate na sala de aula."

Como é bonito o contexto não é mesmo, ó palerma? Ah não me leve a mal, este "palerma" está ali fora de contexto, tal como o seu comentário.

Cumprimentos.