Quando ouvi Jason Chao, presidente do Novo Macau Democrático (NMD) e fundadar do grupo Consciência Macau falar ontem na televisão sobre o incidente do último Sábado na cerimónia de graduação da Universidade de Macau, não pude deixar de sorrir. Isto porque a certo ponto Jason Chao afirma que "não conhecia" a jovem que empunhou o cartaz que deu origem a toda a polémica, e que "apareceu como voluntária" na manifestação de 25 de Maio. Nesta imagem em cima, publicada na conta do Facebook de Tou Weng Kei em 3 de Julho de 2013 - há quase um ano, portanto - é possível vê-la acompanhada de alguns conhecidos elementos dos grupos pró-democratas de Macau, alguns próximos de Jason Chao. Tou está do lado direito, de camisa verde e boné vermelho, e no extremo oposto podemos ver de óculos com uma garrafa de água na mão Scott Chiang, que foi nº 2 de Jason Chao na terceira lista do NMD nas eleições de Setembro último.
Tudo bem, a menina é membro do grupo, pode não ter sido uma manifestação espontânea, aquela a que assistimos no Sábado no campus da Ilha da Montanha, mas o que interessa? Não havia necessidade de Jason Chao "abri ôlo falá mentira", como se diz por cá. É bom que exista gente jovem que queira aderir aos grupos onde se discute política, onde se pratica o activismo, onde se pensa pela própria cabeça, enfim. Desde que seja feito de forma pacífica, coerente e assente em ideias válidas, não há vergonha nenhuma. Sei que pareço um adepto incondicional deste tipo de participação cívica, e que por vezes dá a entender que sou anti-poder, mas nada disso. Nem sempre concordo com os pontos de vista destes grupos de jovens, e por serem isso mesmo, jovens, é preciso dar-lhes uma margem de erro mais larga, e só após o necessário amadurecimento, o crédito que merecem - se o merecerem. O importante é que exista a tal participação cívica, seja ela qual for. Insistindo no silêncio e na apatia, deixando que os outros pensem por nós, é que está provado que não nos leva a lado nenhum.
Mas o que faz com que tantos jovens saltem do anonimato, ou arrisquem a não conseguir um emprego, ou perder o que têm, para embarcar nesta coisa do activismo político? Nos últimos anos assistimos ao aparecimento de uma nova geração de activistas, e começaram a surgir na imprensa nomes como Jason Chao, Scott Chiang, Lei Kin Yun, Sulu Sou, Kam Suet Leng, e agora também Choi Chi Chio e Tou Weng Kit, os protagonistas do "happening" do último Sábado durante a cerimónia de graduação da UMAC. É realmente pena que tenham aparecido apenas agora, pois entre os "veteranos" destas andanças, casos de Ng Kwok Cheong, Au Kam San e poucos mais, existe um fosso geracional tremendo. Não existem elementos ligados ao sector da democracia na casa dos 30 ou até dos 40 anos. Pelo menos de renome, ou que inspirem confiança suficiente para realizar a necessária renovação da liderança nesse sector. Mesmo Jason Chao, que já tem alguns anos de experiência e é
de facto presidente do NMD é ainda considerado "muito verde", e o seu "rating" de aprovação, ou a falta dele, ficou demonstrado nas últimas eleições.
A minha mulher diz-me que figuras como Sulu Sou, que se tem destacado pelos seus dotes retóricos e intervenções onde demonstra grande sentido de oportunidade, ou Kam Suet Leng, que ficou célebre pela indumentária "sexy" no 1 de Maio do ano passado, "não têm medo de nada, pois ainda são jovens". Pessoalmente considero que quanto mais velho se vai ficando, menos medo se tem da morte, e os jovens prezam mais a vida, e valores como a liberdade, mas consigo ler nas entrelinhas aquilo que a minha cara-metade queria dizer: é o tal "ímpeto" próprio da juventude que os leva a dar a cara, a aparecer na linha da frente a favor do que consideram justo ou contra o que não podem aceitar, a dar um murro na mesa. Se durante os primeiros dez anos desde a criação da RAEM tivemos sobretudo uma enorme dose de conformismo, o tempo é agora de malhar o ferro enquanto ainda está quente. Para mim isto surge como um alívio. Foram anos e anos a questionar-me: onde anda a massa crítica em Macau? Que jovens são estes que não querem nada, não dizem nada e não pensam em nada?
Como em Macau não se faz política (e não me canso de repetir isto) e a economia funciona a velocidade de cruzeiro, sempre no piloto automático, não é hábito levantarem-se muitas ondas. Tempos houve, até muito recentemente, que bastava a dialética do "pão e circo" para que a população ficasse satisfeita, e que considerasse até "com muita sorte", atendendo ao panorama de crise económica que teve o seu auge em 2009, e de que ainda não estamos completamente recuperados. O problema é que aqui no oásis há quem já esteja farto de comer só pão, e tenha percebido que o circo não é grande coisa. Quem sai do território e visita outras paragens, e nem precisa de ir muito longe, apercebe-se que Macau está muito atrasado em vários aspectos, e se o que apregoam é que os resultados financeiros são "espectaculares", então do que estão à espera para fazer desta cidade uma cidade moderna, igual às Hong Kongues, Kuala Lumpures, Tóquios e afins? Já tiveram mais que tempo suficiente para isso, afinal. Quem é que anda a pisar na cauda do progresso e a adiar a concretização da RAEM onde os seus residentes ambicionam viver?
O Executivo lê os sinais mas não os entende. Não sendo capaz de olhar para além do seu próprio umbigo, insiste nas mesmas estratégias desadequadas à realidade, dos mesmos intérpretes de que está toda a gente farta, dos mesmo métodos de dissuasão, do mesmo vazio de ideias e falta de soluções. Já ninguém compra o conceito de que tudo está bem, que o nosso papel é trabalhar e não reclamar, e que depois deles é o caos. É um discurso oco, sempre foi, e agora aberta a casca fica-se a saber que não há nada lá dentro. Não se vende um conceito tão abstracto como a "harmonia" a alguém que não consegue comprar algo tão concreto como uma habitação. Os dirigentes andaram tão entretidos naquele joguinho do Monopólio onde andaram a comprar as casas e os hotéis e as estações todas (um deles foi parar à cadeia e não tinha um cartão que o safasse), que se esqueceu de nós. Agora pede-nos juras de amor eterno, que casemos com eles, mas quem casa quer casa, com as casas a custar tantos milhões, nada feito.
Estes jovens que hoje tomam as ruas conquistaram a simpatia da opinião pública, que os ouve. Fartos de promessas vãs, de números no papel mas nada no bolso, começam a reparar que afinal estes não são os tais maluquinhos, os agitadores a soldo de uma potência estrangeira que visa destabilizar o regime e derrubá-lo. Aqui o regime arrisca-se a ser derrubado pelo próprio regime, isso sim. Se eles andam por aí, os Jasons, os Sulus e as suas "mui-muis", é porque ganharam um espaço, intervêm no tecido social da sociedade, e que diabo, angariam milhares de outros como eles, que outrora remetidos ao silêncio, marcham agora de cartazes na mão a pedir contas a quem tanto lhes prometeu e tarda a cumprir. São rebeldes com causa, se lhes perguntarem "o que vos faz ser rebeldes", eles nem precisam de responder "what do you got?", como no clássico com James Dean - têm tanta coisa. E uma delas é o futuro desta região que amamos, ou ainda não se convenceram disso?
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