sábado, 11 de janeiro de 2014

Se eu morri? Não que tenha dado por isso...


Quando Mark Twain ficou a saber que circulavam rumores sobre a sua própria morte, reagiu com uma frase que ficou na história: "As notícias sobre a minha morte foram amplamente exageradas". Quem não achou muita graça nem ficou com disposição para responder com uma tirada de génio foi Rod Smith, um inglês de Kent que foi vítima de uma brincadeira de mau gosto. Smith, de 45 anos, foi submetido a uma pequena operação de rotina para remover um cálculo na bexiga, mas durante o dia e meio que esteve internado, alguém acedeu à sua conta no Facebook e anunciou que ele tinha morrido "devido a complicações durante a cirurgia". Choveram telefonemas de condolências e amigos e familiares residentes noutros pontos do Reino Unido. Os pais de Smith e a sua mulher ficaram em choque, e foi preciso verem com os próprios olhos que o seu ente querido estava mesmo vivo, e que tudo no tinha passado de um horrível equívoco. Depois de ter alta, Smith disse à imprensa que encontrou o pai agitado, "como se os seus olhos estivessem a sair das órbitas", de tanto que chorou. O homem cujo estado clínico evoluíu de morto nas redes sociais para vivo no mundo real diz que "nem quer pensar o que seria se os seus filhos tivessem visto", e que "aperta o pescoço" do autor ou autores da partida, se vier a saber quem são. Entretanto já seguiu um pedido à administração do Facebook um pedido no sentido de os identificar.

Pois é, meu caro senhor que esteve temporariamente do lado de lá, riscado da lista de prendas de Natal e de aniversário dos amigos, se calhar você até sabe quem foi. E se não sabe, se a brincadeira partiu de desconhecidos, eles pelo menos sabiam que o meu amigo ia "à faca". Isto leva-me a falar daquelas pessoas que partilham todos os aspectos do seu dia-a-dia nas redes sociais: onde estão e onde vão estar, e com quem, o que estão a fazer ou o que vão fazer logo à noite, amanhã, para a semana e para o mês que vem, quando estão doentes, contentes, tristes, apaixonados, enfim, tudo e mais alguma coisa que não interessa nem ao Menino Jesus. Acho piada às pessoas que tanto prezam a sua privacidade, não disponibilizam fotografias ou a lista de amigos a terceiros, mas quando vão viajar anunciam a meio mundo que vão estar fora durante x tempo, deixando a casa à mercê que quaisquer amigos do alheio que por acaso estejam a ler a sua página. É comum encontrar casos, normalmente de mulheres, que deixam mensagens do tipo "obrigado pelo jantar meu amor, amo-te! Muaahhh!!!", e depois respondem três ou quatro outros tipos que não são o destinatário da mensagem a responder "de nada querida", ou "também te amo". Acontecesse algo do género com uma namorada minha e dava-lhe esta simples opção: ou eu, ou o Facebook.

Eu não tenho nada a esconder, tenho fotografias e informação pessoal (nem toda, claro) à disposição de qualquer um, mas macacos me mordam se vou divulgar a minha agenda, se vou sair do território, com quem estou, estive ou vou estar nas horas ou nos dias seguintes. Mesmo os estados de espírito ou de saúde, problemas de ordem financeira, sentimental, profissional, problemas conjugais, discussões com os amigos, com os vizinhos ou com a dona da mercearia da esquina são na maior parte das vezes questões do foro pessoal, e nem todas são do interesse geral. Se vou viajar, falo da viagem e publico fotos no regress; se estou doente, espero que fique recuperado e posso agradecer a quem me desejou pessoalmente as melhoras, no máximo dos máximos; se tenho problemas de ordem sentimental ou uma situação doméstica, o problema é meu e apenas meu. O Facebook não é uma farmácia, a linha de emergência, um consultório sentimental ou a polícia. Mais cuidado com o que partilha na rede da próxima vez sr. Smith. Não é de todo descabido que fosse para a mesa de operações e a seguir para o caixão. Não seria o primeiro, e daí a eficácia da "ratoeira" onde cairam os que mais ama.

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