Em primeiro lugar, gostaria de deixar claro que gosto muito da Dra. Maria Amélia António como pessoa, e pelo que me é dado a saber quanto à sua faceta profissional, no exercício da advocacia, não tenho nada a apontar, e parece-me ser uma causídica competente - pelo menos é uma das mais experientes. Quanto à sua "persona" de presidente da Casa de Portugal, para que foi agora eleita para um quarto mandato consecutivo, não estou tão impressionado como o dr. Frederico Rato, que lhe teceu rasgados elogios na edição desta semana do programa "Contraponto", transmitido ontem no canal 1 da TDM. Não acho nem bom nem mau, o seu desempenho nesta função. Tenho tendência para concordar mais com outro painelista do mesmo programa, Paulo Rêgo, que diz "não se rever" no modelo da Casa de Portugal como agremiação representante dos interesses da comunidade portuguesa que ficou ou chegou a Macau no período pós-1999.
Segundo ponto: não me agrada este unanimismo em torno de quem deve presidir à Casa de Portugal. Se o trabalho da dra. Amelia António fosse realmente extraordinário, iriam votar nela e na sua lista única muito mais que vinte ou trinta pessoas. Sendo assim não existe uma demonstração de apoio, mas sim uma grande indiferença em torno da associação. O que dá a entender é que a actual presidente não é a "pessoa certa", mas a única disponível, e já cansa ver sempre as mesmas caras na direcção. Há lá mesmo alguns que parece que fazem birra e batem com o pé se não forem escolhidos. Aparecesse alguém com vontade, com um projecto diferente, ideias e caras novas, certamente que não se livraria de ouvir comentários no sentido de que estaria a fomentar a desunião no seio da comunidade. Num meio tão exíguo como é Macau, isto podia-lhe valer alguns dissabores, muitas caras voltadas, muitas portas fechadas - isto é, para quem se fizesse depender da comunidade portuguesa e das suas boas graças, claro.
Mas para quê essa sede de protagonismo, por um lado, e o receio de discordar democraticamente e apresentar alternativas? A Casa de Portugal não tem peso político, nem aqui nem em Portugal, não tem sequer peso eleitoral, pois nunca é apaparicada pelas listas concorrentes às eleições para a AL, e pelos vistos não tem qualquer peso histórico ou simbólico - basta olhar para o recente caso do Lvsitanvs para constatar que aqui ninguém dá nada a ninguém. Havia quem desse, em tempos: o Dr. Stanley Ho, que de vez em quando dava uns trocados à malta. Agora são muitos mais bicos a brigar pelo milho, e não há cá lugar a sentimentalismos de ordem alguma. O que a Casa de Portugal tem em comum com as restantes entidades de matriz portuguesa é o facto de muitos dos elementos dessas entidades serem também seus associados - a própria dra. Amelia António está inscrita na Associação dos Advogados, por exemplo. Há que ter em conta outras associações com fins semelhantes, como são os casos da Associação dos Macaenses, a APOMAC ou a ATFPM, para mencionar alguns, e sim, esses têm algum peso politico na balança da nova RAEM.
A Casa de Portugal, pelo que me é dado a perceber, tem o papel de pólo de divulgação da cultura e do "modus vivendi" português na RAEM, o Macau do pós-transição. Não é excelsa neste particular, mas vai fazendo o que pode. Organiza pequenos cursos, algumas "workshops", traz alguns artistas ou outras personalidades do mundo lusófono ao território, mesmo que quase sempre com o apoio de outras entidades, tem uma equipa de futebol, enfim, não se pode dizer que não faz nada, valha-lhes isso. Quanto a outros aspectos, os que realmente interessam, a sua importância é discutível. O papel do ensino em Língua Portuguesa cabe à Escola Portuguesa e outras de menor dimensão, e o ensino do português como língua estrangeira cabe ao IPOR e ao dept. de Português da UMAC. A defesa dos interesses da comunidade portuguesa cabe ao Consulado-Geral, e a Casa de Portugal pode, no máximo dos máximos, completá-lo nessa função, mas nunca substituí-lo.
A
entrevista que deu a semana passada ao Hoje Macau pode ser entendido como uma opinião - válida, mas uma opinião apenas. A questão da recusa ou da demora da emissão do BIR a cidadãos portugueses, o tal cartão que permite viver e trabalhar na RAEM sem depender de uma identidade que lhe assegure o visto de permanência, é uma matéria passível das mais diversas interpretações, e até fica dependente dos variados pontos de vista. Pessoalmente não conheço nenhum português a que tenha sido recusado o BIR, mas claro que acredito que existam, e é possível que o número de casos tenha tendência para aumentar. Quanto à demora na emissão dos cartões, penso que esse não será um problema exclusivo dos portugueses, pois conheço casos de outros estrangeiros que adquiriram esse direito através do casamento com um residente permanente (sempre tiro e queda), e que precisam de aguardar cinco ou seis meses pelo BIR. Mesmo os cidadãos do continente que adquiriram o direito a residir em Macau através do investimento, continuam a precisar de fazer prova junto de que mantêm esse investimento junto do IPIM. Portanto, em termos de processamento, não se pode dizer que exista discriminação por aí além.
Quanto à outra questão, a da atribuição de BIR a portugueses que tenham chegado de Portugal à RAEM à procura da sorte, o caso muda de figura. Quem já era residente permanente, deixou o território há anos e agora faz planos de regressar, penso que não vai encontrar nenhum obstáculo em renovar o documento. Quanto aos que chegam pela primeira vez em Macau, bem, nesse caso "reality bites", e um português não é diferente de um filipino, um tailandês, um russo ou um angolano. Se como diz a dra. Amélia António, existem mesmo portugueses que vêm para Macau ser professores, médicos e outros quadros de que a RAEM está carenciada com "blue card", é grave, de deve ser analisado caso a caso. Quanto ao "lobby mais poderoso que o Governo" de que a presidente da Casa de Portugal fala, não posso senão discordar. Esse "lobby" É o Governo. O Governo propriamente dito é mentira. Não existe, simplesmente.
Sem comentários:
Enviar um comentário