O Festival Eurovisão da Canção, quer se goste ou não dele, é um dos certames musicais mais antigos do mundo, e realiza-se anualmente sem interrupções desde 1956. Organizado pela European Broadcasting Union (EBU), remonta aos primórdios das transmissões televisivas na Europa, a maioria das suas audiências acompanhavam o festival pela rádio. A popularidade do evento coincidiu com a multiplicação dos aparelhos de TV pelos europeus, nos anos 60. O Festival foi nesse tempo a rampa de lançamento para nomes como Sandie Shaw, France Gall, Gigliola Cinquetti, Massiel, Cliff Richard, Julio Iglesias, Nana Moskouri e outros. Mudavam-se os tempos, mudavam-se as modas, e o Festival da Eurovisão ia acompanhando as tendências, e nos anos 70 um dos seus vencedores tornava-se "apenas" o segundo grupo mais vendido de todos os tempos: os suecos ABBA. Nos anos 80, a última década antes da queda do bloco de leste que alargou as fronteiras da Eurovisão até à Ásia menor, e desse equívoco que foi a votação do público pelo telefone, algumas das canções ficaram no ouvido. Vamos recordar alguns desses momentos.
Logo em 1980 surge um vencedor que faria história na Eurovisão, o irlandês Johnny Logan, que vencia com o tema "What's another year". Conhecido por "Senhor Eurovisão", Logan voltaria a vencer como intérprete em 1987 com este tema "Hold me Now", de que muitos certamente ainda se recordam, e em 1992 foi o compositor da canção vencedora, tornando-se assim o artista de maior sucesso na história do Festival. Curiosamente nos dois anos em que venceu como intérprete, deixou a concorrente da Alemanha em 2º lugar: em 1980 bateu Katja Ebstein, com "Theatre", por 15 pontos, e em 87 a banda Wind, com "Laß die Sonne in dein Herz", por 31 pontos. A Alemanha venceu em 1982 pela primeira vez com Nicole e o tema "Ein bißchen Frieden", seguindo-se um jejum de 28 anos interrompido apenas em 2010, quando a jovem Lena venceu com "Satellite".
No ano seguinte a festa da Eurovisão realizou-se em Dublin, com os cumprimentos de Johnny Logan. O vencedor voltou a ser uma canção em língua inglesa, e num tempo em que os concorrentes eram obrigados a cantar na língua do país que representavam, além da Irlanda apenas o Reino Unido usavam o inglês. E foram os britânicos Bucks Fizz que sairam vencedores com "Making your mind up", tornando-se um dos quatro grupos a vencer nesta década - os outros foram os suecos Herreys, em 1984, os noruegueses Bobbysocks! no ano seguinte, e os Riva, representando a então ainda unificada Jugoslávia em 1989.
Em 1982 em Harrogate a alemã Nicole deu a primeira vitória à Alemanha, como referi atrás, e no ano seguinte em Munique a cantora Corinne Hermès deu a última vitória ao Luxemburgo. Foi preciso esperar três anos até que outra canção interpretada em francês vencesse a Eurovisão, e foi em 1986 em Bergen, na Noruega, que a Eurovisão viria a conhecer uma das suas "mascotes": a belga Sandra Kim, que aos 13 anos se tornaria a vencedora mais jovem de sempre de um Festival da Eurovisão - um título que dificilmente perderá, pois actualmente as regras definem que os concorrentes têm que ter pelo menos 16 anos. Sandra Kim não prosseguiu a carreira musical, mas foi enternecedor vê-la ali toda mexidinha de lacinho a dizer que "amava a vida", era "J'aime la vie", um dos tesouros do museu da Eurovisão.
A Suíça ficaria em 2º lugar em 1986, e pediu a desqualificação de Sandra Kim por causa da idade, mas só teria que esperar mais dois anos ano para se sagrar vencedora, em Dublin, para onde Johnny Logan levava novamente o festival depois da sua segunda vitória em 1987. Sendo a Suíça um estado onde existem três línguas oficiais fortes, o francês, o italiano e o alemão, os seus concorrentes podem usar qualquer uma delas, e foi assim que em 1987 a Europa ficava a conhecer Celine Dion, uma canadiana com uma grande voz que se viria a tornar um dos grandes actos a nível mundial. Foi apenas já em plena década de noventa que a cantora viria a obter o estatuto de grande estrela, e muitos desconhecem que tudo começou ali, na Eurovisão, com este "Ne partez pas sans moi".
O Festival da Eurovisão tem sido muitas vezes criticado pela sua componente política, nomeadamente na questão da repartição de votos entre países vizinhos, um problema que se agravou mais tarde com o televoto. Estávamos em 1989 e a situação política nas balcãs eram sensível, com o agudizar dos conflitos étnicos que menos de dois anos depois viriam a originar uma das piores guerras a que a Europa assistiu desde o final da agressão nazi. Talvez como um apelo à união entre os povos da então Jugoslávia, a vitória em 1989 foi para os Riva, um grupo de origem croata. Os sérvios não terão entendido a mensagem (!) de "Rock Me", mas pelo menos a Eurovisão fez o que pôde. E o que se pode fazer na Eurovisão? Cantar, e foi assim nos anos 80, e é assim hoje, três décadas depois.
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