quinta-feira, 3 de outubro de 2013

Adieu


Aí está a notícia da semana. Para surpresa geral, a companhia de transportes públicos Reolian declarou falência, depois de não ter conseguido pagar os vencimentos respeitantes ao mês de Setembro aos seus cerca de 600 trabalhadores. O adminsitrador-geral da empresa, Cedrid Rigaud, aguardou por um milagre da Nossa Senhora de Lourdes até à meia-noite de segunda-feira, e no dia seguinte apresentou ao tribunal o pedido de insolvência da empresa. Este é um feito inédito na história do território, onde a falência de uma concessionária é um caso raro. Quatro anos e muitas tropelias depois, a companhia dos autocarros verdes passa a ser gerida pelo Governo, que nos próximos seis meses vai garantir as carreiras e o vencimento dos funcionários. Mas então vamos lá a ver: como é que chegámos a isto.

Cedrid Rigaud tem sido o rosto da Reolian desde o início, para o melhor e para o pior - mais para o pior, diga-se em abono da verdade. Não o conheço pessoalmente, não sei o que pensa, o que sente, o que acha de Macau ou sequer tenho quaisquer referências que me elucidem da sua competência ou da falta dela. Suponho que terá formação superior como gestor, e que a Reolian o tenha mandado como missionário das operações em Macau. O que Rigaud representa aos olhos da opinião pública é o fracasso de um projecto que ninguém percebeu muito bem desde o início. Porquê uma terceira empresa de autocarros num território com pouco mais de 20 km2 e meio milhão de habitantes? Mesmo que se justificasse, porquê uma empresa da longínqua França, quando se podia optar por uma da região, à qual seria mais fácil seguir o rasto e estabelecer contacto em caso de necessidade?

Rigaud justifica a falta de liquidez da empresa com uma série de factores: a demora no início das operações, a inflação, com reflexo no preços dos combustíveis, a dificuldade em contratar motoristas, a concorrência dos autocarros dos casinos, a recusa do governo em negociar o preço das tarifas, mil e uma coisas. Uma razão curiosa foi o facto do governo nunca ter facilitado a vida à companhia, e ter-lhe negado os mesmos subsidios que atribuíu às concorrentes da TCM e da Transmac, devido à "avaliação negativa" que foi feita à Reolian. Realmente é muito malvado, este governo. Só porque os autocarros da empresa se envolveram com uma frequência alarmante em acidentes, alguns deles que custaram vidas humanas e num caso muito badalado levaram uma idosa a perder uma das pernas, não lhe dão um prémio. "Ma que injustizia", como diria o Calimero, que não é francês mas italiano. Que falta de sorte.

O reinado de terror da Reolian, que tornou as estradas de Macau menos seguras, foi uma dor de cabeça da a recém-criada DSAT, que aparou muitos dos golpes da empresa dos autocarros verdes. Cada vez que um dos Reolians derrapava, batia ou matava, lá vinha o director Wong Wan derreter-se em explicações - e digo "derreter-se" literalmente; em cada conferência de imprensa gastava pelo menos duas caixas de lenços a limpar o suor que lhe escorria em cascata da testa. Reolian à parte, ainda não consigo entender porque Wong Wan não se demite ou é demitido. Nem a juventude da DSAT explica certos equívocos, e esta direcção tem sido um peso nas costas do Executivo, transmitindo-lhe uma má imagem, de fraqueza, incompetência e condescendência com o erro. Por menos de metade da azelhice que Wong Wan tem demonstrado, já tinha eu ido parar ao olho da rua, como agente público. A decisão de resgatar a Reolian para "tapar a vergonha" é pouco consensual. Quem é que concordou com esta ideia de que o Executivo deve usar nove milhões por mês do erário público para limpar a porcaria que uma companhia privada fez?

A falência da Reolian apanhou a opinião pública de surpresa. Ontem na TDM entevistaram uma passageira que "desconhecia por completo" a notícia, mas diz não ter ficado surpreendida, pois o serviço "era muito mau". Ora o serviço é mau em todas as companhias, e para os utentes é indiferente qual a companhia responsável pelo autocarro que apanham, desde que os leve onde pretendem. Detendo 44% dos percursos, o que lhes dá uma vantagem sobre a concorrência, e encarando as mesmas dificuldades, é difícil encontrar que custos de operação são estes que "tramaram" a Reolian. Cheira-me que alguém terá feito muito dinheiro com este negócio instantâneo, da companhia de transportes que chegou, viu mal e não venceu. Sem querer levantar falsas suspeitas, o meu faro leva-me até a uma das accionistas da empresa, a H. Nolasco da Silva, e uma certa empresária com conhecidas ligações aos "franciús", apesar de negar qualquer envolvimento com este negócio em particular. Para quem sabe ler chinês, desafio a ir espreitar o que diz a senhora no seu tão aclamado blogue. Se é que se atreve...

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