Se há uma coisa que me agrada no Jornal Tribuna de Macau - e há muitas que me desagradam, como já sabem - é a secção que apelidei de "página do crime", onde se contam as tropelias da ladroagem em pequena escala de Macau. A ladroagem em grande escala está...oops! Ia fazendo merda. Vamos antes falar do que interessa. Bem, gosto daquela página porque nos deixa a par do melhor que se faz em termos de vilanagem no território, e deixa-nos dormir descansados sabendo que as autoridades andam-lhes aí a deitar as mãos em cima. Cheguei a discutir alguns daqueles artigos com colegas chineses, que por vezes me dizem que a notícia no Ou Mun está mais completa, e que a versão portuguesa peca por algumas imprecisões. Mas isto é apenas natural, pois certamente que a PSP se preocupa mais com a fidelidade da versão em chinês dos factos. O que vem no JTM é contudo mais que suficiente para que se entenda o essencial.
Na edição de ontem vinham dois casos relacionados com a minha sub-espécie de delito favorita: o conto do vigário. O primeiro falava de uma menina que conheceu "um inglês" no Facebook, e que completo desconhecido passou a amigo do peito, e daí ao abuso de confiança foi um pequeno passo. Desconheço o tipo de
cunnilingus virtual que o fulano usou, mas pouco depois a jovem vítima estava a mandar-lhe 3200 patacas pela Western Union, que lhe seriam devolvidos "na quarta-feira seguinte". Quem manda 3200 manda também 68280, que foi o valor enviado ao "paciente inglês" em cinco transferências. A certo ponto a conta de Facebook do "amigo" desaparece, ela acha "tudo muito estranho" e faz queixa à polícia. Há burlões que criam contas fictícias nas redes sociais recorrendo a nomes falsos e fotos aleatórias que encontram na rede, e dão este golpe a gente ingénua como esta menina. Mas quando há por aí gente que não empresta 500 patacas a um amigo ou colega de trabalho que encontra todos os dias, esta manda quase 70 mil patacas a um desconhecido. Um caso que passa do âmbito da criminologia para o da psiquiatria.
Um outro caso conta-nos a história de uma velhinha de 81 anos, mirradinha e curta de vistas (isto deduzo eu), que podia ser a nossa avózinha, benza-nos Deus. E não é que uns malandrins do camano ligaram à senhora, e berraram (não "disseram", porque assumo também que é dura de ouvido) que lhe tinham raptado o filho por dívidas ao jogo, e se não pagasse 81 mil yuan, começavam a devolvê-lo peça a peça, e ela depois que fizesse o puzzle. A velhota pegou em tudo o que tinha, e mandou 80 mil yuan, e os atrevidotes ainda lhe exigiram os mil em falta, que acabou também por mandar. Só depois disto a velha ligou ao filho, que lhe disse que "nunca foi raptado", e que ela deveria estar a alucinar de uma sobredose daqueles opiáceos que a vão mantendo viva e funcional. Aqui está uma das regras de ouro do "Manual dos Sonsinhos": primeiro manda-se o dinheiro, jogando pelo seguro, e só depois se telefona, para saber se o menino chegou inteiro a casa ou se ainda vem uma orelha pelo correio. E sabe-se lá se os ladrões lhe guardaram o telemóvel, ficavam nervosos se a velha ligasse, e rebentavam os miolos ao refém? Nunca se sabe. Usem a vossa imaginação, porra!
Dois incidents que são sérios candidatos ao Nobel da asneira, caso existisse um, e qe provam que em Macau o "pato" é uma espécie longe de estar em vias de extinção - nasce pelo menos um todos os dias. É possível que o leitor esteja a pensar que nunca mandaria dinheiro a alguém que mal conhece e que vive do outro lado do mundo, ou que mandaria um SMS ao filho para saber se foi realmente sequestrado - mas não falem de boca cheia. Quem sabe se são acometidos por um ataque de demência aguda instantânea, ou tomam uma daquelas novas drogas sintéticas que apodrecem o cérebro? O que fazia eu no lugar do agente que atendeu estas duas vítimas? No caso da velhinha, que se calhar pensou que está no tempo da Guerra do Pacífico e que o filho foi feito refém pelo exército nipónico, chamava os filhos à parte e recomendava-lhes um bom asilo. Não precisa de ser muito bom, basta que a deixem sem contacto com a sociedade. Quanto à menina que transferiu as 70 mil lecas para o "inglês", bem, o que fazer? Olha, pedia-lhe dinheiro emprestado, e prometia pagar-lhe no Dia de S. Nunca à tarde. Mais depressa ligava ela para o Vaticano para perguntar "quando é afinal esse feriado consagrado a S. Nunca", do que me vir bater à porta.
Sem comentários:
Enviar um comentário