O Porco e o Povo

Um adepto encornado, perdão, encarnado

O Hoje Macau esteve envolvido numa pequena polémica ao noticiar na sua edição de ontem que um tal "FC Porco" estaria interessado na contratação do jovem avançado do Sporting Bruma, uma das estrelas do mundial de sub-20 que decorre na Turquia até Sábado. Aparentemente esta "gralha" não é assim tão acidental quanto se quer dar a entender, pois ainda há três anos a mesma publicação repetiu a "gracinha", e talvez depois disso algumas vezes sem grande alarido. Imagino os autores da gracinha a espumar de raiva na perspectiva de mais uma temporada a limpar o pó da sala de troféus, como ainda há poucos meses, onde as esperas no aeroporto da Portela e no Estádio do Pus, perdão, da Luz, viram os atletas encornados, perdão, encarnados, chegarem de mãos a abanar.

Na edição desta quinta, à esquerda do genial artigo deste vosso mais que tudo, o director Carlos Morais José insiste na inflamada verve anti-portista, publicando uma errata onde acrescenta ao mimo de ontem outros semelhantes, como "FC Morto" ou "FC Torto". Pena que "Porto" seja uma palavra com apenas duas sílabas e cinco letras, caso contrário seria muito mais inspiradora. Imaginem que eram clubes como o Mogadourense ou o Moncarapachense a obliterar o domínio encornado, perdão, encarnado, dos salazarentos tempos dos Calabotes e seus derivados? Dos tempos em que bastava ao bigodudo Humberto Coelho levantar o braço para que fosse assinalado ao adversário fora-de-jogo, implementando com trinta anos de avanço o conceito do quarto árbitro? Eram uns visionários, estes gajos do Benfica que durante os anos 60 e parte dos anos 70 do século passado ganhavam títulos à ordem dos três de seguida intervalados por um do Sporting - os títulos do Sporting eram então um antídoto à manifesta orquestração de domínio encornado, perdão, encarnado, que manchava o país em cores de sangue dos inocentes vergados ao regime e à tortura da PIDE, consolados pelos pontapés certeiros desse símbolo do império e do colonialismo de bivaque que dava pelo nome de Eusébio, que o "equívoco" do 25 de Abril relegou para a insignificância do Beira Mar e do União de Tomar.

O aspecto mais lamentável desta brincadeira levada a cabo pela rubra redacção do jornal mais "cool" em língua portuguesa de toda a Asia foram os ataques anónimos a que foram sujeitos por parte de "cobardes a cobro do anonimato" (hmmm...onde é que já ouvi isto?). Não tendo observado nada de anormal nas redes sociais ou escutado vozes iradas nas tertúlias do costume, depreendo que a retaliação terá chegado via correio electrónico, na forma de ameaças ou insultos dirigidos ao endereço do Hoje. Sendo eu montijense assumido, não me causa qualquer repulsa ver o meu clube associado a esse nobre animal que é o porco. Levei ao colo leitões que mais tarde produziram os mais deliciosos torresmos, lombos, costeletas ou Cozidos à Portuguesa, que me enchem de orgulho e me despertam a larica enquanto escrevo estas linhas. Antes o delicioso e produtivo porco do que os ossudos e insonsos passarinhos de penas que dão pena.

Curiosamente lia a notícia de hoje, que ontem resvalou na dura carapaça da minha indiferença como "normal", atendendo aos delírios opiáceos próprios das papoilas (saltitantes), e pensava com os meus botões: "existirão portistas no Hoje, ou será o benfiquismo uma condição sine qua non para integrar a redacção do mesmo?" A resposta veio na página 12, na secção "Macau sã assado", onde a jornalista Joana Freitas (assumindo que a autora das fotos é ao mesmo tempo responsável pela rubrica) se assume como adepta do maior, e confessa o seu "estassecaganduismo" por coisas sem importância. Concordo em forma, género e feitio. Porquê dar importância aos "inbejosos" que ganharam três campeonatos nos últimos 22 anos enquanto o "Porco" em questão festejou dezasseis ceptros, e sem vestígios de que a tendência seja contrariada num futuro próximo? Citando Cervantes nas palavras do seu imortal Don Quixote de La Mancha: "Os cães ladram, a caravana passa".