domingo, 28 de julho de 2013

O raio do "feng-shui"


O “feng-shui”, ou como se diz no dialecto cantonês, “fông-sói”, é uma pseudo-ciência muito respeitada pelos mais supersticiosos – os chineses e não só. A palavra “feng-shui” significa literalmente “vento e água”, e terá a ver com a procura do equilíbrio ideal que conduza a vida no sentido da paz e da prosperidade, e que afaste as forças negativas que trazem consigo o azar. Como este “equilíbrio” e a sua procura não está ao alcance de qualquer um, existem estudiosos do tema, “iluminados” que dizem conhecer as curvas do labirinto que leva à sorte ou ao infortúnio. Há quem não tome decisões sem consultar o seu mestre de “feng-shui”, e mesmo os não-crentes respeitam a superstição quando chega a hora de comprar uma casa ou montar um negócio. Escusado será dizer que para os “especialistas” este é um negócio bastante lucrativo, e os mestres do “feng-shui” mais mediáticos enriquecem à custa de consultas, previsões, livros e presenças na TV, tudo graças à crença de muito boa gente, que os considera uma espécie de intermediários entre os deuses e os mortais. Estão para a vidência como os meteorologistas estão para a previsão do tempo, mas gozam de mais popularidade, apesar da meteorologia assentar em princípios científicos. Para se habilitar a uma carreira no “feng-shui” basta passar alguns bons anos a “estudar” patranhas, e depois alegar uma relação íntima com o sobrenatural. Além da indispenável cara-de-pau, alguma publicidade também pode dar jeito. Não queria chegar ao ponto de os chamar “charlatões”, mas o estatuto que alguns adquirem é invejável: ganham rios de dinheiro sem trabalhar, e para isso basta debitar previsões ambíguas e contraditórias, suportadas sempre com um “senão” qualquer caso não se concretizem. Mas se por um lado isto dá a entender dinheiro fácil e boa vida, existe o reverso da moeda. Se o que não falta por aí são tansos que acreditam nos contos da carochinha, existe a possibilidade de alguns desses tansos levarem a sua burrice tão a sério que de podem tornar perigosos, ao ponto de pedir ao seu “guru” que lhe preste contas caso as coisas dêm para o torto. E foi o que aconteceu com Alieon Yu (na imagem), uma das celebridades do “feng-shui” de Hong Kong, que viu um dos seus clientes pegar fogo ao seu escritório em Tin Ming, depois de uma previsão que não bateu certo. Nãããão! Impossível, uma previsão de um mestre de “feng-shui” que não dá certo. Ao que este mundo chegou.

As razões que levaram o cliente insatisfeito a incendiar o escritório do mestre chegam a dar pena. Suen Lok Wai, um empresário actualmente com 42 anos, foi em tempos um milionário com negócios na construção civil, e cliente de longa data de Alieon Yu. Numa das primeiras consultas o empresário lamentou-se das tentativas frustradas de fazer um filho à sua esposa, e depois das orientações do mestre, foi abençoado com uma criança dois anos mais tarde, e outra passados três anos. Obra e graça do divino, certamente. Entusiasmado com as boas graças, Suen passou a confiar cegamente no mestre, que num assomo de arrogância e sem medir as consequências fez uma previsão mirabulante: um dos filhos do empresário seria no futuro uma alta figura do governo na China, mas para que isso acontecesse, Suen precisaria de mudar os seus negócios para o continente. E assim foi, com o construtor a mudar-se de armas e bagagens para Xangai. Quem não achou muita piada foi a sra. Suen, que pediu o divórcio e foi viver para os Estados Unidos com os filhos, levando-os para longe dos delírios do pai. Os negócios em Xangai correram mal, e quase falido Suen regressaria a Hong Kong para recomeçar a fortuna, mas sem sorte.

Apercebendo-se da sua ingenuidade, o empresário culpou o mestre, e no ano passado foi pela primeira vez ao seu escritório pedir-lhe que lhe pagasse 12800 dólares de Hong Kong por um figurino que lhe havia oferecido em tempos. Meio sem graça, sentindo-se parcialmente culpado, Alieon acedeu e deu-lhe o dinheiro. Em Janeiro Suen voltou a exigir dinheiro, desta vez 25 mil dólares, o dinheiro que Aileon cobrou pelas consultas, mas levou uma nega. E nem foi do próprio mestre em que tanto confiara, que delegou para os seus assistentes a função de “enxotar” o cliente insatisfeito. Passado meia-hora, ouviu-se um estrondo, e a entrada do escritório do mestre estava em chamas. A única vítima foi o próprio incendiário, que ficou com queimaduras num braço, e viria mais tarde a ser detido pelas autoridades. Suen diz ter tentado provocar o incêndio para demonstrar que Alieon Yu “é uma fraude”, e avisar os seus potenciais clientes desse facto – ele há gente que só aprende quando é tarde demais. Aileon, por seu lado, diz que previu o incidente, e por isso “deixou nove baldes de água no escritório”, antes de se ausentar. A história agora contada numa reportage do Sing Tao Daily em conjunto com o Apple Daily não indica se o vidente terá alertado os seus empregados para a eventualidade de fogo posto. Mas talvez habituados às manias do seu chanfrado patrão, terão achado isso “normal”. Um dia como qualquer outro nesse emocionante mundo do “feng-shui”.

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