terça-feira, 9 de julho de 2013

Divórcio: do que está à espera?


Um bolo de divórcio

Divórcio. A palavra provoca sentimentos tão díspares como angústia, desespero, ódio, libertação ou alívio. É uma palavra complicada, pois tal como “suicídio”, tem oito letras, termina em “io” e tem um “c” algures no meio. Mas enquanto suicídio é o fim, o divórcio pode ser o princípio de uma vida nova. Se suicídio é morte, divórcio é renascimento. Durante uma discussão, quando alguma das partes acena com a carta do divórcio, ambos deviam abraçar-se e brindar com champanhe, em vez de aumentar a tensão e o ressentimento. É injusto e até sem sentido que se festeje um casamento, onde todos estão sorridentes, e que se faça do divórcio um caso sério, com toda a gente a fazer uma cara de quem comeu e não gostou.

Quando cheguei a Macau, diziam-me que esta era “a capital dos divórcios”. Isto talvez se devesse a alguns portugueses da metrópole, já na meia-idade, que vinham para o território com a família e casavam com uma local ou amantizavam-se com a empregada. Primeiro não os censuro, e depois é facílimo ser divorciado em Macau. A partilha dos bens é o mais complicado, sobretudo devido à bolha imobiliária. Um casal que comprou uma casa por 500 mil há dez anos, pagaria mais que o dobro disso em tornas ao cônjuge. Mas em termos de poder paternal, qualquer um que o obtenha tem o outro a menos de dez minutos de carro. Em Portugal são habituais os dramas dos pais que se separam, um vai para Trás-os-Montes e o outro para os Açores, mas aqui o pior que pode acontecer é uma viagem da peninsula até Coloane.

O que leva as pessoas a pensar que o divórcio é qualquer coisa de mau, de negativo, um naufrágio nessa doce maré que devia ser o casamento, é a demonização que se faz do divórcio. Mais uma vez, quando se fala de demónios e derivados, aponto o dedo à Igreja católica. É verdade que todas as religiões têm a sua versão do casamento, e não menos sacrossantas que a do catolicismo, não discuto isso. Mas foi a mafia de Roma que urdiu conceitos como “na saúde e na doença“, “até que as morte vos separe”, ou “o que Deus uniu nenhum homem ouse separar”. Já mais alguém leu os votos de casamento católico e pensou tratar-se de um pacto com o Diabo, cheio de ameaças e condições? Durante os tempos salazarentos a toda-poderosa igreja não permitia o divórcio, nem que a vida de um deles fosse um inferno em vida. As crianças nascidas fora do matrimónio eram “bastardas”, sem que nunca tivesse feito mal a uma mosca. E mesmo hoje, onde o casamento católico não passa de um capricho, a igreja só permite que se case uma vez. Um pateta alegre que se tenha casado na igreja e se divorcie mais tarde no civil (o único casamento que conta), fica inabilitado para ler novamento o contrato com Satanás…quer dizer, os votos no altar frente ao pio sacerdote. Se um dia conhecer uma miúda giraça mas parvinha cujo único sonho é entrar na igreja de véu branco (sinal de pureza…nas orelhas, claro) e grinalda, ela procura outro que ainda não tenha sido queimado pelos Torquemadas.

O que eu gostava de apresentar como uma refrescante novidade para resolver todos os problemas, depressões, ansiedades e unhas encravadas no século XXI, é ele: o divórcio! Toda a gente se devia divorciar já, imediatamente, nos próximos dois ou três dias no máximo, e vão ver que não se arrependem. Divórcio é como a eutanásia, com a vantagem de se continuar vivo, e até com melhores cores. Esqueçam lá essa coisa dos laços matrimonais ou do “nó” (da forca) que dizem que se dá. Os laços e os nós desatam-se, e se forem teimosos cortam-se com uma tesoura. Liberte-se desse peso a quem já ninguém liga peva nenhuma. Com a chegada do casamento gay acabou esse “apartheid” da aliança na mão esquerda. Soltem as amarras, as algemas, as correntes, e tudo que nos prende. Derrubem os muros da prisão, nadem do rochedo até à praia, respirem o ar puro da liberdade. Quem disse que casar é fácil mas descasar é difícil? Permitam-me que sugira um argumento imbatível: “Vamos divorciar-nos, ok? Ciao!”. Caso tome você a iniciativa, não hesite, mostre que está a falar a sério. Enfie as melhores camisas na mala (não faz mal se ficarem amarrotadas), abra a porta muito antes de sair, e chame um táxi – se possível leve consigo pelo menos um “laptop”.

Agora o leitor mais abananado com este arrebatante orgasmo de argumentos a favor do divórcio pergunta, com voz fininha: “Mas ó Leocardo, e os casais que são felizes?”. Balelas. Se estiverem casados há 30 anos ou mais torna-se ainda mais fácil. Os filhos estão crescidos, o apetite sexual é uma miragem, e as baterias estão na reserva. Pensam que gostam um do outro? Experimentem divorciar-se, e olham para o mundo com outra perspectiva. O divórcio é como uma operação às cataratas: deixa ver com mais precisão e descobrir coisas que nem sabíamos que existiam. Além disso 30 anos são muito tempo para que se exerça um cargo de responsabilidade. É anti-democrático, não aprenderam nada com a Primavera árabe? Se quiserem podem continuar juntos, se acreditam no amor (Ah! Ah! Ah!), e se mais tarde surgirem obstáculos, não precisam de se preocupar com o divórcio, pois estão divorciados por antecipação. Uma proposta tão genial como irrecusável.

É impossível resistir a esse doce veneno do divórcio, que o magazine “Modern Junkie” considerou uma das 100 drogas que poderá ser mais viciante que a heroína num futuro próximo. Não deixe que o seu divórcio fique arruinado por litígios, caras feias, crianças que correm para o quarto a chorar quando assistem às brigas dos pais e depois escondem-se debaixo da cama com uma tesoura e dilaceram o brinquedo favorito enquanto murmuram: “um dia o mundo! um dia o mundo!”, pais que dão conselhos fúteis que no fim acabam por não resolver nada. Façam uma festa, convidem os amigos, bebam até cair para o lado, e se por acaso o sexo foi uma das poucas coisas que se aproveitou de anos dessa tortura que foi aturarem-se um ao outro, dêm uma queca de despedida. Contacte já o seu organizador de eventos, e pergunte-lhe sobre os pacotes de divórcio mais aliciantes. E vai ver que amanhã o dia tem mesmo um ar de novo, e a vida está toda pela sua frente.

3 comentários:

Anónimo disse...

A inveja é um vício sem deleite, que atormenta quando se dissimula e desacredita quando se expressa.

Meu amigo, deixe lá o casamento como está que muita gente vive muito feliz com ele.

Bloom disse...

É impossível resistir a esse doce veneno do divórcio??

O Leocardo andou a beber ou quê?

Leocardo disse...

Eh...eh...eh...
Anónimo: nada contra o casamento, mas porquê endeusar uma instituição e demonizar outra tão legítima como o divórcio?
Sr. Bloom: abraço :)

Cumprimentos