sexta-feira, 14 de março de 2014

Os sons dos 80: rap/hip-hop


A história do "rap", ou de como é mais conhecido hoje em dia, "hip-hop", reporta-se aos anos 70, e terá nascido no bairro nova-iorquino do Bronx (onde mais?), criação da comunidade afro-americana (quem mais), como forma de protestar contra a sociedade que lhes come a pinha (o que mais?). Seria fastidioso estar aqui a falar das raízes do "hip-hop", da evolução, dos seus estilos e das suas metamorfoses, mas só para não deixar isto insonso, posso dizer que o termo "hip-hop" foi utilizado pela primeira vez em 1978 por Keith Cowboy, elemento dos Grandmaster Flash and the Furious Five, um grupo de...adivinharam: "hip-hop". Já a palavra "rap", a primeira forma pela qual ficou conhecido o "hip-hop", tem qualquer coisa a ver com tornar o que seria uma música com pés e cabeça numa confusão de discos mexidos para trás e para a frente, "beatboxes", sintetizadores e indivíduos que em vez de cantar, rezam, enquanto mexem muito as mãos, como quem vai dar um enxerto de porrada em alguém, mas no fim é só conversa. Portanto, o que é preciso para ser um artista de "rap" ou de "hip hop"? Fácil: ter uma parafernália de equipamentos de som, não saber cantar, e ter uma imaginação muito fértil, juntando a isso a capacidade de ler 100 palavras por minuto, ao ponto de não ser possível entender uma palavra sem recorrer ao livro com as letras. Mas isto é para ser levado a sério ou quê? Bem, agora sim, há alguns anos sem dúvida, mas no início nem por isso. Só para ilustrar isto que acabei de dizer, saibam que o primeiro single do género a chegar ao nº 1 da Billboard foi "Ice Ice Baby", de Vanilla Ice. Tudo dito. Agora antes do "hip-hop" se ter tornado um enorme êxito nos anos 90 nas suas variantes de "gangsta rap" e etcetera? De que forma nos chegava este som tão interessante, sem que fosse preciso viver no Bronx? Vamos até à auto-estrada da memória que nos leva aos anos 80.


Kick it! Ooops, desculpem, mas é o que dá quando se recorda o início dos Beastie Boys, que são actualmente uma respeitável banda de "hip-hop", mas que no início mais pareciam uma brincadeira. Ou não...? Formados em Nova Iorque em 1981, lançaram o seu primeiro EP, "Polly Wog Stew" em 1982, e em 1984/85 faziam a primeira parte dos concertos de Madonna. Em 1985 gravaram o seu primeiro álbum, "Licensed to Ill", que só sairia em Novembro de 1986. Os Beastie Boys até pareciam que se estavam a divertir, como é possível constatar no "videoclip" deste single, "(You Gotta) Fight for Your Right (To Party!)", mas a brincar, a brincar, foram o primeiro LP de "hip-hop" a chegar ao nº 1 da Billboard, e vendeu nove milhões de cópias. O disco ouve-se muito bem do início ao fim, mesmo para quem não é apreciador do género, e outros temas fortes incluem "Girls", "No Sleep Till Brooklyn" ou "Brass Monkey". Os Beastie Boys mantêm-se em actividade ao fim de mais de 30 anos, apesar da morte de Adam "MCA" Yauch, em Maio de 2012.


Em meados dos anos 80, dizia-se que bastava falar enquanto outro tipo fazia barulhos esquisitos para se fazer um "rap", mas quem levasse isto a sério, juntando um pouco de profissionalismo, podia ser recompensado. Foi o caso dos DJs holandeses MC Miker G & DJ Sven, que pegaram nos já existentes "Summer Holiday", de Cliff Richard, e "Holiday", de Madonna, misturaram os dois e fizeram este "Holiday Rap". O sucesso foi instantâneo, e a juntar ao nº 6 no top do Reino Unidos chegaram a nº 1 na sua Holanda natal, na Suíça, Alemanha e França.


Basta de falar de gente branca, agora. Aqui está o pioneiro do mais parecido com "gangsta rap" que existia em 1987: LL Cool J. James Todd Smith tinha apenas 17 anos quando adoptou o pseudónimo LL Cool J, literalmente "Ladies Love Cool James". Se o rapaz já tinha jeito para as "ladies" (mais tarde conhecidas por "bitches", ou "biatches"), também não era estranho ao "rap", e com este "I Need Love", do seu segundo album, chegou a nº 14 da Billboard, e foi top-10 em vários países europeus. Diz-se que para este video o James usava um colar de ouro com o peso de cinco quilos ao pescoço.


E começamos a subir de tom. Chuck D na voz, Flavour Flave nos gritinhos histéricos, equipado com óculos escuros de morcego e um relógio da sala pendurado ao pescoço, eis os Public Enemy. Formados em 1982 mas sem que ninguém lhes desse muita importância, os Public Enemy terão sido a primeira super-banda de "hip-hop" da história, e lançaram o seu primeiro álbum em 1987, "Yo! Bum Rush the Show", com um impacto significativo, seguido de "It Takes a Nation of Millions to Hold Us Back", em 1988, que continha este "Bring the Noise", e "Fear of a Black Planet" no ano seguinte deixavam o grupo com o cognome de "mauzões do rap".


E pronto, queriam "gangsta"? Aqui está ele, com os Niggaz With Attitudes, ou N.W.A., um grupo de "hip-hop" californiano activo entre 1986 e 1991, e que foi uma espécie de universidade para alguns dos actuais grandes nomes do género. Assim tinhamos nem mais nem menos que Ice Cube, Dr. Dre e Eazy-E na formação inicial destes N.W.A., que tinham até um single intitulado "Gangsta, Gangsta", além do infame "Fuck tha Police", ambos de 1988. Sim, de facto alguém tinha que dizer isto qualquer dia no título de uma canção, provavelmente...


Outro Ice que também mandou a polícia ao mesmo sítio foi Ice T, cujo album "Rhyme Pays", de 1987, foi o primeiro do género a conter a etiqueta avisando para o conteúdo explícito. Nisto Ice T foi um pioneiro, e depois dele foi um ver-se-te-avias. A sua carreira nos anos 80 foi em tudo semelhante aos restantes dos primórdios dos "hip-hop", com três álbums na recta final da década, num crescendo em termos de sucesso. Depois de "Rhyme Pays" seguiu-se "Power", e em 1989 "The Iceberg/Freedom of Speech...Just Watch What You Say", de onde saíu este "Lethal Weapon". Em 1991 Ice T formou os BodyCount, um grupo de "hardcore hip-hop" que então mandou a polícia ir-se f... com "Cop Killer". Tenho uma dúvida: como era o policiamento nos concertos desta malta? Não deve ser nada agradável andar ali a garantir a segurança de uns gajos que nos estão a mandar f... .


E para acabar os 2 Live Crew, um grupo de "hip-hop" de Miami que gerou controvérsia em 1989 com o álbum "As Nasty As They Wanna Be". O disco continha tantas obscenidades e um teor sexual que houve mesmo quem achasse que a etiqueta de "conteúdo explícito" seria pouco, o que levantou um debate sobre a censura nos Estados Unidos. A faixa mais conhecida deste disco é "Me So Horny", que já tinha referido aqui a propósito dos filmes sobre a Guerra do Vietname. Oh yeah, mudafucka!

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