quinta-feira, 5 de março de 2015

Você diz que houve...o quê?!?!

Racismo: é tudo uma questão de "pedigree"

Uma bizarra locomotiva atravessou a Taipa a toda a velocidade na tarde do último Domingo, passando por cima do que resta da dignidade, deixando-a jazendo inerte num tapete verde de suposta relva onde auto-intitulados futebolistas disputam aquilo a que um campeonato - a tal "Macao Premier League", como refiro aqui por vezes em tom jocoso. Nesse dia em que o esférico rolava sobre a relva, corriam atrás dele (do esférico, pois...) 22 homens. Não, esperem, que não se pode dizer que os guarda-redes corram atrás da bola. Hmmm...vinte, então? E o árbitro? E os fiscais-de-linha, não contam, pois nem se encontram dentro do recinto de jogo. Vinte e um? Não...o árbitro não corre atrás da bola, mas dos tipos que correm atrás da bola. Que confusão. Quem não entenda nada de futebol e das regras do jogo vai pensar que o árbitro é alguma Maria Albertina, toda maluca a tentar apanhar homens suados, ali em mangas de camisa e calções, atléticos. Ui. Bem, não fugindo do assunto. Nesse Domingo os dois grupos de indivíduos que procuravam chutar uma redonda sem que esta lhes tenha feito qualquer mal tinham como designação "Monte Carlo" e "Ka I" - são uma espécie de Manchester United e Arsenal cá do sítio, mas sem o mesmo dinheiro, condições de treino, público nas bancadas, estádio próprio, escândalos sexuais que fazem as capas dos tablóides, talento, perspectivas, etc., etc. Estão a ver, não estão? É "quase" a mesma coisa.

Estavam todos ali à procura de colocar o tal esférico no fundo do uma baliza, pelo menos de forma a que o objecto atravessasse parcialmente ou na totalidade uma linha branca pintada na relva entre os postes dessas mesmas balizas (spoiler: nenhum deles conseguiu), quando um dos elementos, do Ka I, Wamba de sua graça e camaronês de origem, é alegadamente a ser insultado com referências indecorosas ao seu tom de pele, origem, e de acordo com relatos de pessoas presentes na altura no local, insinuações de que a sua aparência se assemelharia à de um símio, comportamento normalmente atribuído a uma teoria que os africanos estarão num patamar inferior na escala da evolução da nossa espécie. Um preconceito quiçá motivado pelo facto de ter sido naquele continente que apareceram os primeiros hominídeos que viriam a evoluir para o Homem actual, ou ainda pelo evento da escravatura, que está na origem da ideia de que as pessoas de pele escura são menos inteligentes do que aquelas com pele mais clara, e de modo mais extenso, menos civilizadas e propensas a actos de antrofagia e bestialismo, assumindo comportamentos próprios dos animais irracionais. Isto transposto para a linguagem popular habitualmente escutada nos estádios de futebol - o circo romano da era moderna - traduz-se para frases com cariz insultuoso, como são exemplo "preto de merda", "escarumba", "macaco" ou "vai para a tua terra" - este último aplicado a uma escala mais internacional. Há ainda quem inexplicavelmente produza com a sua própria voz aquilo se pode descrever por "sons da selva", supostamente com o intuito de menosprezar a cidadania do outro com a sugestão de que este convive com as criaturas naturais dos territórios onde predomina a savana, e que terá adoptado alguns dos seus hábitos que são considerados "selvagens" no critério da nossa civiliação.

Perante este cenário, uma mera referência ao grau de melamina presente na pele de cada indivíduo, bem como outros traços físicos variáveis de acordo com o clima, ancestralidade ou mecanismo de adaptação ao "habitat" onde o indivíduo se insere passou a ser rotulado de "racismo". Sim, "racismo", palavra derivada de "raça", como na frase "o cavalo é de raça Puro Lusitano". Para mim "racismo" é dizer que um Cocker Spaniel é mais bonito e tem o pêlo mais aprazível ao tacto que um Fox Terrier - "raça" têm os cães e os restantes quadrúpedes, onde se incluem as bestas. O "racismo" é uma coisa do passado, um parasita que pululava pelo sul dos Estados Unidos do século XIX, e é propagado noutras paragens por dois tipos de pessoas: os que fazem do seu "combate" um emprego, e sem "racismo" não tinham forma de pagar as contas no fim do mês, e outros que gostam de justificar qualquer merda com a presença de "intrusos", acenando com a corrupção do "modus vivendi" das comunidades e de uma "promiscuidade genética", e culpam os imigrantes pelo desemprego, apesar destes fazerem o tipo de trabalho que ele se recusa a fazer. Se o imigrante é do mesmo pote étnico do seu, arranja outra desculpa qualquer. Se for diferente, pimba, dá-lhe com o "racismo" em cima. O pior é que mesmo os mais tolerantes (e parvinhos) aprovam esta fanfarra do racismo, e batem-lhes palmas - vocês sabem que eles são, e já ouviram deles comentários do género "não sou racista, mas se a minha filha casasse com um preto eu não ia gostar". São os mesmos que se dizem contra a pena capital, mas defendem que os traficantes de droga "deviam é ser todos fuzilados", estão a ver a pinta, certo?

Na arena do circo romano que é o futebol acontecem coisas...inomináveis!

Nos tais estádios de futebol, onde normalmente os ânimos se elevam a temperaturas febris (algo a que chamam "paixão" mas no fundo é nada mais que fanatismo e falta de melhor maneira de ventilar as angústias), é normal que se deixe o bom senso à entrada, como se faz com os casacos nos eventos da "high society", e o recinto passa a ser um pouco como Las Vegas: o que lá se passará, de lá não sairá. Quando era miúdo ia à bola com o meu pai, que assim como todos os pais, tios e avós que vão à bola mandava as suas, e até nem era dos piores (o seu alvo preferencial era as equipas de arbitragem, algo que associo a uma repúdio da figura da autoridade). Num jogo em particular, reparei que os adeptos da casa estavam especialmente entusiasmados a mandar epítetos a um ou dois jogadores pretos da equipa adversário, imitando o guincho de chimpanzés cada que um deles tocava na bola. Foi aí que resolvi perguntar ao meu pai a razão de terem este comportamento com jogadores de cor do adversário, mas não com os da sua equipa, ao que ele me respondeu apenas: "porque esses são dos nossos". É assim mesmo, trata-se de um comportamento irracional inserido no contexto de um desafio, de uma disputa entre dois lados, como numa guerra. Quem vai para uma batalha com armas e o camano, e abate um inimigo de etnia diferente da sua, é racista também? Visita de casa dos Le Pen, e que chamou aos filhos Adolph, Heinrich, Joseph e Hermann? Claro que não, pá. Já viram que parvoíce?

Não pensem que com este argumento estou a branquear insultos de teor rácico, ou qualquer outro expediente no sentido de atentar contra a cidadania de alguém, mas acreditam mesmo que um tipo que vai mandar umas "bocas" lá na bola a um jogador de cor, é mesmo um "racista"? Daqueles referenciados, com botas Doc Martens, taco de beisebol, cabeça raspada e cartão de militante do PNR? Não me lixem, pá. São palermas, só isso, mas à pala dessa conversa do "racismo" acaba por ser pior a emenda que o soneto, como aconteceu no episódio em que um tótó mandou uma banana para dentro do campo, e que foi cair junto de um jogador brasileiro, que por acaso até é só mestiço. Gerou-se uma polémica ui, ui, que o mundo está perdido, e depois de identificado o adepto que ofereceu fruta ao tal jogador de tez bronzeada, resolveram bani-lo dos jogos da equipa de que é adepto PARA SEMPRE! Onde foi parar a natureza humanista do Ocidente, e de que tanto orgulho temos porque nos distingue dos bárbaros islâmicos e outros pagãos a quem o conceito de perdão é desconhecido? Já agora cortam-lhe as mãos, à maneira de talião, como se faz na Arábia Sodomita, e de certeza não que não atira mais bananas a ninguém. Eu tenho um ligeiro "feeling" que as pessoas confundem aquilo que é apenas natural com algum papão de outro planeta. Suponhamos que "A" é branco, "B" é preto, "C" é cigano e "D" é indiano, e tudo isto é de comprovadamente verdade. Portanto a afirmação, mesmo sendo completamente verídica, pode ser em alguns quartéis tida como "racista", pois "discrimina" os indivíduo conforme a sua origem étnica. Ah...e dizer que alguém é alto, gordo, careca, ou que tem uma verruga na penca discrimina conforme os traços particulares - é "tracismo". Começo a desconfiar que o mal não é ser "racista", mas sim que nos apontem o dedo e nos chamem de "racistas". É mais ou menos o mesmo que acontecia com os doentes de SIDA há 30 anos: "Epá não te aproximes daquele tipo, que ele é racista!"- é o vírus da deficiência político-correcta humana.

Queria reservar o direito a um processamento judicial...sim, sim, é para pagar com cartão. Obrigado.

E parece que agora a moda chegou também a Macau. Yupi! Que grande merda! A modos que alguma pessoa ou pessoas atacaram o jogador do Ka I com o que tinham à mão - insultos à sua aparência, que qualquer pessoa que não consegue descortinar, contando que não seja invisual - e houve "racismo". Se por acaso o jogo fosse disputado numa pedreira, talvez em vez de "vítima de racismo", o atleta fosse "vítima de traumatismo craniano". Mas então afinal chamaram nomes feios ao rapaz ou não? Bem, aparentemente sim, a não ser que tenha havido ali um caso de alucinação colectiva, e por "colectiva", para quem não sabe, refiro-me a uma percentagem das cerca das 50 pessoas, se tanto, que estavam a assistir àquela me...quer dizer, àquele emocionante "derby" local, disputado no reduto do...dos dois, pronto. A história foi relatada pelo jornalista Gonçalo Lobo Pinheiro nas páginas do Hoje Macau (HM forever, f****rs) no dia seguinte, segunda-feira, e na quinta é publicada uma carta enviada pelo Monte Carlo Rangers United Rovers Football Club ao jornal, onde só lhes faltou mesmo cuspir fogo. Os dirigentes daquela "powerhouse" desportiva, com créditos firmados desde a Av. Sidónio Pais até à Rampa dos Cavaleiros e armários cheios de Taças feitas por encomenda na "Son Yek - troféus, medalhas, souvenirs e artigos de culto", desmarca-se das acusações de racismo que lhe são imputadas (são mesmo?) e acrescentam que "foi Wamba" a começar aquilo que acabaria por se tornar num desagradável incidente. Coincidência ou não, também na segunda o Ponto Final publica a mesma história, com a assinatura de Sandra Lobo Pimentel. Causa-acção, vai uma cartinha para o Ponto Final, só que esta publicada dois dias depois da carta do Hoje. Deve ser porque ambas as publicações têm sede em zonas postais diferentes, apesar de distarem cinco minutos a pé uma da outra - é como que atravessar a linha da data do dia, algures lá no meio do Oceano Pacífico, e numa viagem de barquinho chegar passar para a mesma hora do dia anterior. Sim, só pode ser isso, claro. Adiante.

O que as cartas dirigidas aos dois jornais têm em comum é um parágrafo deveras curioso, onde o autor ou autores "pedem esclarecimentos", ou - reparem só nisto - "na eventualidade de uma não resposta que satisfaça os dirigentes visados (sic)", o clube, rebéubéu, "irá reservar o direito dum processamento judicial (re-sic)" - contra os jornalistas, entenda-se. Em todo caso, Gonçalo Lobo Pinheiro apresenta um pedido de desculpas que eu nunca apresentaria - mas fez o que achou melhor, pronto - e Sandra Lobo Pimentel foi perder tempo a dar uma resposta em português a um texto em merdoguês, que não só tem ponta por onde se pegue, como ainda é tão patético que não chega a dar vontade de rir. Gostava de saber como é que os jornalistas em questão decifraram aquele misterioso "uma não resposta que satisfaça" - afinal é para responder ou não? E se responderem, os tipos ficam chateados ou quê? Acho que aqui tanto o Gonçalo como a Sandra Lobo Pimentel resolveram NÃO ignorar, e assim NÃO se abstiveram de mandar resposta, optando por uma NÃO-NÃO resposta, de modo a que NÃO fiquem insatisfeitos os dirigentes pela ausência de NÃO-NÃO esclarecimento que NÃO os satisfaça. Entenderam? Se calhar a ainda estão boqui-abertos perante a forma diplomática com que o Monte Carlo manifestou o seu desagrado pelas peças jornalísticas, e por isso "pede esclarecimentos" É como quem quer saber as horas e pergunta a um desconhecido: "Faz favor, pode-me dizer que horas são, ou é preciso que lhe parta a cara primeiro?".

O artigo da Sandra Lobo Pimentel, por exemplo, não chega a tomar qualquer partido ou a acusar directamente alguém do que quer que seja, e com excepção do Wamba e das duas pessoas com que falou (treinador do Ka I e presidente do Monte Carlo) não faz referência a mais nenhum nome. Na edição de terça-feira do Ponto Final vem uma referência a uma eventual investigação em curso para tirar a limpo o que se passou nesse dia no relvado da MUST. Perdão, para não ignorar o que afinal nunca terá acontecido, evitando assim especular com toda a certeza sobre uma falsa mentira que toda a gente ignora. Basta não perguntar aos milhares de espectadores que estavam ausentes da partida nesse dia, eles não dirão que aconteceu racismo - tantas testemunhas que podem garantir não terem visto qualquer incidente. Como podem os jornalistas afirmar tal coisa, se nem o árbitro, que supostamente devia deixar escrito no relatório caso ocorra um incidente desta natureza, viu qualquer "racismo" ou algo que se pareça? Aliás, o juíz estava tão concentrado na visualização de vários não "penalties" e situações de fora de jogo, que correctamente não assinalou, e mesmo nas bancadas era evidente o silêncio dos que não comentavam a não-ocorrência.

Li a notícia e escutei comentários que vão todos mais ou menos no mesmo sentido, e o que dá a entender é que de facto aconteceu uma altercação entre elementos ligados às duas equipas, e dos quais acabou por acontecer uma troca de acusações. O mais curioso é fica a sensação de que o dirigente do Monte Carlo que afirma não ter existido qualquer acto racista da parte da sua equipa, fá-lo com a convicção de que os "gestos obscenos" que o jogador alegadamente atacado verbalmente fez, mais as palavras em tom injurioso que proferiu são justificativo quanto baste para que outros o mandem "para África". A este ponto gostaria de acrescentar que o atleta em causa é residente de Macau e portador do BIR, não sendo por isso relevante para o caso que tenha nascido nos Camarões, na Guiné ou na Ilha da Páscoa. Quem está por fora do que é o futebol em Macau em geral, ou do campeonato que chamam de Liga de Elite em particular, vai ler aquela notícia e pensar que isto é uma tropa fandanga, com um tipo a fazer manguitos durante um jogo da divisão principal de futebol profissional (?), enquanto outros lhe chamam nomes e o mandam para África. E quem é o "artista" que pensa que a justiça serve para ser usada como instrumento de intimidação, e que se não fazem o que ele manda, ele "irá reservar o direito a um processamento judicial". Olha filho, reserva um para mim também, pode ser mal passado, e manda vir as cervejas também, que eu estou quase a chegar.

Sem dúvida que se o futebol de Macau está no estado em que se encontra, para isso contribuíu em grande parte essa potência que é o Monte Carlo. Perdão, o que eu queria dizer é o seguinte: o Monte Carlo não se absteve de não contribuir para a não decadência do futebol em Macau, e como tal quaisquer incómios que não lhes sejam dirigidos serão sempre bem recebidos. E o contrário também é mentira.

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