Ontem Macau voltou a recuar no tempo. Durante cerca de uma hora, a luz deu lugar à treva, e em vez de som tivemos vácuo, só o vazio e mais nada. Quem não estava e tentou entrar em contacto com este canto esquecido por Deus e atirado para a margem do Rio das Pérolas pensou que Macau se tinha evaporado, dissipado, desintegrado. Assim como acontece em cada vez que Macau deixa de existir, os créditos vão todos para uma companhia em particular: a CTM. Já aqui disse uma vez que na região Ásia-Pacífico apenas dois territórios são servidos por uma rede de telecomunicações que está nas mãos de uma única companhia : Macau e...a Coreia do Norte. Portanto não é surpresa (pelo menos para nós), que assim como a grande maioria norte-coreanos não têm luz eléctrica em casa, aconteça que amiúde fiquemos nós também privados de comunicar com o mundo exterior. Aquilo que chamam de "monopólio" mas eu prefiro chamar por aquilo que é, uma DITADURA, já deu o que tinha a dar, está na hora de dizer "basta". Chega desta palhaçada. O Governo deve, em nome quer da coerência, quer da transparência, liberalizar as telecomunicações em Macau. Nem que seja nome daquilo que é a responsabilidade do Governo de um território que de acordo com os últimos números tinha o quarto maior PIB "per capita" do mundo: a qualidade de vida dos seus cidadãos.
Nada me move contra a CTM, ou alguém da CTM, e estou-me nas tintas para quanta massa fazem, ou ganham os seus administradores, epá, troquem tudo por moedas de 5 HKD e enfiem...bem, já sabem. O meu problema é com a falta de alternativa. Tenho a certeza que a CTM poderia muito bem oferecer um serviço de elevada qualidade e a preços irresistíveis, se para isso tivesse motivação na forma de um ultimato: "ou me dão um serviço decente, ou mudo de companhia". Não existindo outra companhia, riem-se na nossa cara com o dedo em riste e os olhos esbugalhados enquanto vociferam: "Ai não gostas?! Então muda de companhia, pacóvio", seguindo-se uma inevitável gargalhada sinistra e cavernosa. E "cavernosos" ficamos também nós, consumidores, como na noite passada, sem rede durante perto de uma hora, isolados do mundo. Quantos de vocês não sentiram uma vontade inexplicável de pegar numa clava e ir caçar um brontossauro? Se a rede de comunicações fosse liberalizada, como em qualquer jurisdição que se diz moderna, pluralista e progressista, teríamos uma forma de dizer que estamos. E podia ser uma companhia de chacha, uma merdoca qualquer, mas desconfio que se alguém começa a fazer sinais de fumo, os "gulosos" da CTM vão logo fazer queixa, roxos de raiva e espumando da boca. É deles, é tudo deles. Grrrr....
Ontem a desculpa - e digo "desculpa" porque não acredito em peva dos que dizem estes gajos - foi o "hacking". A rede foi vítima de "hackers". Ah bem, assim ficamos mais descansados, sabendo que a ÚNICA rede que temos em Macau é tão vulnerável que os "hackers" entram nela quando e como querem. É como nas naquelas aldeias do antigamente onde só existia uma rameira onde todos iam, mesmo que minada de sífilis e gonorreia. Aliás as semelhanças entre este exemplo e a própria CTM são tão gritantes que já nem sei se estou a ser sarcástico, ou se estou acidentalmente a revelar um segredo (de polichinelo). Fico com curiosidade de saber que "hackers" eram estes - sim, porque se afirmam com tanta certeza que este "apagão" foi obra de "hackers", é porque sabem quem são, certo? Portanto estão a deixar-nos que a qualquer momento vai o 3G outra vez ao ar porque a uns tipos quaisquer "apeteceu lixar-nos a vida um bocadinho", e vocês como boas pachachas moles que são ficam aí de perna aberta a deixá-los entrar, é isso? Ou será que é uma daquelas desculpas padrão, do tipo "olha agora diz que foram "hackers", que já gastamos a ladainha da lagosta entalada no cabo e do navio que encalhou na fibra óptica". Para mim pouco importa se foram "hackers", ou se um espadarte queria fazer uma chamada e ocupou a linha, ou o raio que os parta: ficámos sem rede durante uma hora. Por muito que me custe aceitar que vivemos na decadente era da ciberdependência, em que somos escravos das redes sociais, e já nem sabemos que é o vizinho do lado, etc., etc., é assim que vivemos, e o que me interessa é VIVER. Com a CTM andamos neste limbo entre o estado de consciência e o coma induzido.
O nosso prezado, estimado e venerado Executivo, que muito democraticamente afirma que o mercado "é livre" na hora de explicar a pouca vergonha que é a especulação imobiliária, ou que se arma em "liberal forever" quando é para ferrar o dente nos casinos e chamar os "yankees" para cá com a sua máquina de fazer notas tem que nos explicar melhor esta "confiança a toda a prova" que deposita na CTM. Não consigo vislumbrar porque será menos grave eu ficar incontactável do resto do mundo durante um considerável espaço de tempo, do que não poder vender a minha casa por 10 milhões quando ela não vale nem uma décima parte disso. Não entendo esta indiferença, este "deixa andar", e só cada vez que alguém se lembra de puxar o assunto vêm com uma promessa oca de que "vai entrar um concorrente", como os tais que há mais de quatro anos estão para vir, com a treta a renovar-se na imprensa de dois em dois anos. O tempo passa, há quem não dê por isso, mas também há quem registe para memória futura estes constantes dislates que só revelam inaptidão em todos os aspectos. E vocês povo, que marcham por tudo e por nada? Não vos incomoda que estejam a pagar um serviço móvel e de internet dos mais caros do mundo, e com esta qualidade, ou melhor dizendo, esta falta de qualidade? Se não estivesse aqui a falar de uma pessoa colectiva, como é o caso da CTM ainda desconfiava de qualquer coisa sinistra: "não mandam o tipo embora porque ele sabe muita coisa". É assim, com a CTM? Ou se reclamamos demais cortam-nos o pio, e desligam de vez a respiração artificial?
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