quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Abaixo da cintura


Faltam apenas quatro dias para as eleições, e nesta fase terminal da campanha, as listas concorrentes à AL pela via do sufrágio directo não poupam esforços para convencer o eleitorado. Como tem sido já habitual, e o fenómeno vai crescendo de intensidadade a cada eleição, recorrem-se a expedientes menos ortodoxos. Quando já não basta tentar angariar o maior número de votos, convém também denegrir a imagem de outros candidatos, especialmente os das listas que mais se aproximam em termos de ideologia, ou que "pesca" junto do mesmo eleitorado base. Na caça ao voto, vale tudo menos arrancar olhos, mesmo arrancar olhos pode ser permitido, desde que se faça à revelia da Comissão Eleitoral. Citando o próprio presidente da CE, Ip Son Sang, "se o candidato acha que está a violar a lei caso queira arrancar olhos, não o faça". Por exclusão de partes, se achar que não faz mal, não há problema.

Muitas listas de respeito e os seus nº 1 têm sido vítimas de anti-campanha; rumores, boatos, difamação, insinuações várias no sentido de denegrir a sua aura de candidato sério e impoluto. A candidate da UPD, Kwan Tsui Hang, tem perdido o sono com as acusações anónimas feitas contra a sua Associação dos Operários, que segundo essas mesmas acusações, "vira as costas aos seus associados". A deputada foi vítima da mesma campanha negra em 2009, e acabou por ser a lista mais votada, pelo que não se entende a sua preocupação em "perder votos" por causa de umas "bocas" vindas não se sabe de quem, e sem apresentar outros argumentos que as suportem em termos de veracidade.

Ainda há quatro anos, altura em que o Novo Macau tomou a pioneira iniciativa de concorrer com duas listas separadas, a de Au Kam San sofreu um inesperado revés em plena campanha, quando se revelou que um dos seus candidatos estava a braços com um processo judicial em decurso, e nunca poderia integrar a lista. A candidata, uma senhora, neste caso, foi afastada, mas isso não impediu Au Kam San de ser eleito. Já este ano Agnes Lam foi acusada de ter recebido uma avultada quantia para realizar um estudo enquanto professora e investigadora da Universidade de Macau, sendo acusada de não ter apresentado contas, e até de falta de qualificações para realizar o tal estudo. Duvido que quem esteja a pensar em dar o seu voto ao Observatório Cívico mude de ideias perante estes factos não comprovados. A menos que não sejam tão "inteligentes" como apregoam ser os eleitores de Agnes Lam.

O ponto alto de toda esta lavagem de roupa suja deu-se ontem, e o alvo foi José Pereira Coutinho, presidente da ATFPM e cabeça-de-lista da Nova Esperança, procurando a eleição para um terceiro mandato. Uma utilizadora do forum Macau da CTM, que se identifica como uma antiga assistente de Pereira Coutinho, acusa o deputado de a ter engravidado, e depois obrigado a interromper a gravidez em Zhuhai. A mesma utilizadora, que não se identifica, vai mais longe ao afirmar que Pereira Coutinho "tem uma doença sexual", citando a ex-mulher do próprio, actualmente a residir no Canada. Apesar do nome do deputado da lista 9 não ser referido, são dadas pistas no sentido que se trata realmente de Pereira Coutinho, e o deputado pondera tomar acção judicial contra desconhecidos por "difamação".

Quem conhece Pereira Coutinho mais de perto - e curiosamente o Ponto Final faz uma reportagem sobre ele na edição de hoje sem mencionar o escândalo - sabe que não é nenhum anjinho. Mas e depois, se é divorciado e livre de fazer o que quiser com o sua vida afectiva, desde que dentro da legalidade? É curioso que a "ofendida" que acusa Pereira Coutinho a abortar se lembre de tornar isto público a poucos dias das eleições. Será que andava mesmo distraída e teve uma epifânia quando viu a cara do candidato num panfeto? E Agnes Lam, que mesmo que se tenha abotoado ao patacame para o tal estudo, só agora em plena campanha vê esta acusação recair sobre ela? E no caso de Au Kam San, em 2009, será que a Comissão Eleitoral errou sobre a capacidade eleitoral da tal candidata, enquanto havia alguém que já sabia e aguardou pelo momento certo para lancer esse trunfo? Muito suspeito.

Na China não se realizam eleições directas, ficando esse privilégio democrático reservado a Hong Kong, Macau e Taiwan, falando de jurisdições onde os eleitores são chineses. Em Hong Kong existe uma forte cultura democrática, enraízada pelos antigos senhorios ingleses, e sem dúvida que a consciência política da sua população é um exemplo para quem acredita no sufrágio universal em território chinês. Em Taiwan é o que se sabe, uma fantochada, com episódios mirabolantes no decurso das campanhas eleitorais e a pressão da China, que observa de perto as intenções separatistas dos nacionalistas. Diz-se mesmo que algumas listas concorrentes às eleições em Macau contratam em Taiwan "especialistas" nestes expedientes eleitorais mais obscuros. Até pode ser que o façam, mas sem produzir resultados significativos. O eleitorado de Macau é demasiado esperto para cair na esparrela. Ou então "duro de pedra" para entender a mensagem. Agora destas duas, escolham uma.

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