sábado, 5 de setembro de 2009

Irresponsável


"O domínio da língua portuguesa no sector jurídico está a obstruír as reformas do sistema judicial e legal"; "O português só serve para enganar a população e proteger os interesses de uma comunidade"; "toda a legislação devia ser traduzida para chinês"; "os operadores de Direito portugueses deviam ser substituídos por chineses". Estas são afirmações do deputado Lee Chong Cheng publicadas na edição de ontem do Hoje Macau, e retiradas de um artigo de opinião publicado no Jornal Ou Mun, esse diário onde a liberdade de opinião transborda, especialmente se for para cascar nos portugueses.

Lee Chong Cheng vai depois por ali fora, dando sugestões fantásticas de como melhorar o sistema, como "rever leis portuguesas" de modo a adaptá-las melhor "à realidade local", e às "mudanças" que acontecem no território. Mesmo as que estão consagradas na Lei Básica. Insurge-se contra o ensino do Direito em português, e defende que o ensino do Direito deve estar ao acesso de "toda a população". Lee Chong Cheng é subdirector da Associação Geral dos Operários de Macau (AGOM) e concorre às eleições para a AL como nº 2 da UDT, encabeçada por Kwan Tsui Hang. Nos últimos quatro anos esteve sentado na AL eleito pela via indirecta. Como é da AGOM, se calhar sente-se mais à vontade a falar de estuque e argamassa, ou de gestão comercial, curso que tirou na Universidade Aberta Internacional da Ásia. Mas apeteceu-lhe falar de Direito. Está no seu...direito.

Era muito giro que fosse assim tão fácil, não era? Traduziam-se as leis para chinês, e toda a gente que sabe ler percebia o que está lá escrito. Não havia necessidade de recorrer aos advogados, com os seus honorários quase criminosos, e não era preciso aturar os juízes. Era uma alegria. Ou aquela outra palavra que rima com alegria. Já sei: anarquia! Não interessa o que está escrito na lei. Interessa interpretar as leis, e como se sabe, isso não está ao alcance de qualquer um. Infelizmente as ideias de Lee Chong Cheng colhem junto de um sector da população com menos recursos, ou com um nível de habilitações mais baixo. É fácil atirar as leis de raíz portuguesa às feras. A alternativa é que se torna um bocadinho mais difícil de engolir.

Lee Chong Cheng pensa que assusta a comunidade portuguesa acenando com o fim dos operadores de Direito em português. A comunidade portuguesa já demonstrou que não precisa do Direito para sobreviver, e também contribui de muitas outras formas para o progresso da RAEM. Era muito mais fácil convencer a população que os portugueses são "maus", foram "os colonizadores" e "não estão aqui a fazer nada" se essa mesma população estivesse encantada com a governação dos últimos 10 anos. Não está, e penso que é escusado estar a recordar aqui porquê. Os vícios são vícios, independentemente dos seus intérpretes. Quem garante que a justiça estava melhor e seria mais célere se os processos fossem todos em língua chinesa?

A Lei Básica, o Direito, as liberdades e garantias são o que fazem Macau funcionar. A população olha para Macau e depois olha para os bons exemplos - ou pelo menos devia olhar - e quer alcançar a prosperidade, progresso e modernidade de outras cidades semelhantes, como Hong Kong e Singapura, para dar dois exemplos. Mesmo os dirigentes da RPC consideram isto importante cada vez que reiteram o princípio de "um país, dois sistemas". Se estão a falar a sério, não sei, não sou telepata. Mas não precisam que venha o vice-presidente da AGOM para falar por eles. Quando Lee Chong Cheng diz que a China se "submeteu à aceitação deste sistema legal" por causa da negociação com o Governo português para a entrega de Macau, está a dizer o que exactamente? Que a China devia esquecer a amizade secular que tem com Portugal, entrar por aqui dentro com meia dúzia de tanques e ficava tudo resolvido?

Quando Chan Meng Kam e a restante malta de Fujian falam mal da calçada portuguesa ou batem nos cybercafés, ou queixam-se dos carros mal estacionados que não permitem aos bombeiros realizar o seu trabalho, isso é lá com eles. São balelas. Agora quando um deputado que se prepara para se submeter ao sufrágio directo faz declarações desta tez, revela uma enorme ignorância e irresponsabilidade. Só me surpreende que ainda não tenha tido uma resposta à altura. Por quem de direito, claro.

8 comentários:

Anónimo disse...

Era enrolar um jornal e dar-lhe com ele no nariz e dizer "feio!"

Anónimo disse...

Isso, como se faz aos cães que se portam mal!

Pedro Coimbra disse...

Pois meu caro Leocardo, o problema é que o senhor que profere estes dislates até é capaz de ser eleito.
Isso é que preocupa um bocado.
Se tiveres pachorra dá um saltada ao http://devaneiosaoriente.blogspot.com/
Pedro Coimbra

Português Atento disse...

Isto só prova que a pior coisa que poderia acontecer a Macau era a democracia plena que a maioria dos portugueses até defende. Quando o Chefe do Executivo for eleito por sufrágio universal, não esperem melhor do que alguém do calibre deste Lee Chong Cheng.

Anónimo disse...

Que comentário tão infeliz!

Anónimo disse...

É capaz de explicar por que é que é infeliz? Pode demonstrar o seu ponto de vista sem recorrer a frases feitas?

Anónimo disse...

isso tudo é CULPA do TUGA que NUNCA preocupou em ensinar portugues nas escolas chinesas de Macau.Estavam mais preocupados em roubar o dinheiro de Macau para regressarem de bolsos cheios para Portugal

Anónimo disse...

Isso também não deixa de ser verdade.