Duas notícias distintas e ao mesmo tempo relacionadas. A OCDE congratulou-se com o levantamento do sigilo bancário em Macau e outros territórios da região conhecidos por paraísos fiscais, e o Gabinete para a Protecção dos Dados Pessoais (GPDP) divulgou um relatório das suas actividades do ano passado. Por um lado levanta-se o sigilo, do outro cai uma cortina de sigilos que nunca mais acabam, e não se sabe bem onde podem parar.
Alguns casos referidos pelo GPDP são deveras interessantes. Um deles conheço bem, o de uma agência de empregos aqui perto de casa (entretanto encerrada, e onde funciona actualmente o Comfi Soup) que colava na montra fichas com potenciais candidatas a empregadas domésticas que continham a sua fotografia, bem como o nome, idade, número do documento de identificação e religião. Neste caso particular considero o número do documento de identificação supérfluo, mas que mal há num potencial empregador em saber o nome, idade e religião da potencial empregada doméstica?
O GPDP "puxou as orelhas" ao Fundo de Beneficiência dos Leitores do Jornal Ou Mun por ter este publicado informação pessoal - incluíndo a morada e o estado de saúde - de indivíduos que receberam assistência financeira daquela associação de caridade. Se isto for para levar a sério, o diário da Pedro Nolasco da Silva vai dar muitas dores de cabeça ao GPDP. O Ou Mun tem a "mania" de publicar informação como o nome, idade e local de trabalho de suspeitos da prática de crimes, e mesmo informação detalhada e fotografias de crimes, acidentes e suicídios que podem ser entendidas como ofensivas às famílias das vítimas. Isto para não falar de alguns editoriais de ídole racista, mas isso não tem a ver com dados pessoais e são contas de outro rosário.
Depois há os serviços públicos. A questão que fica no ar é esta: até que ponto um funcionário público pode disponiblizar informação que não seja considerada uma quebra de sigilo? Macau é um lugar exíguo, e até algum tempo era possível saber tudo. Bastava ter um "pangiao" neste ou naquele departamento para saber fosse o que fosse. Agora com este mais ou menos recente GPDP, será que vai pairar mais uma sombra do tipo CCAC? E quanto aos FP que prestam atendimento ao público, em alguns casos centenas por dia? Não se arriscam a violar a lei mesmo sem saber?
É que pelo menos o CCAC já levou a cabo inúmeras acções de formação aos funcionários públicos, cola cartazes, produz anúncios televisivos. E o GPDP? Pouco se conhece deste departamento, o que faz, como actua e sobretudo que poderes tem. É preciso não esquecer que os serviços públicos são públicos. Alguma da informação é pública, e o público tem direito a saber. E além disso os FP têm o dever de sigilo, contemplado no Regime Jurídico dos Trabalhadores da Função Pública. Já sabem exactamente o que devem e não devem fazer. Mas à luz desta nova forma de proteccionismo, como é? Onde ficamos?
E no fundo o que são dados pessoais? Parto do princípio que será tudo, desde o nome à profissão, passando pela data de nascimento ao estado civil. Cabe a cada um proteger informação sensível relacionada com o seu património (o código do cartão multibanco, por exemplo), mas assim chegaremos ao dia em que não se pode saber nada de ninguém? Como "ainda está só a começar", desconfio que as actividades do GPDP vão ainda fazer correr muita tinta. Aliás penso que esta forma de protecção dos chamados "dados pessoais" cai que nem uma luva na população, que não gosta mesmo nada que o vizinho meta o nariz na sua vida. E é este mesmo argumento que servia para sustentar o tal sigilo bancário que é agora levantado e recebe aplausos. Ou será mesmo assim?
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