Há dias em que acordo mesmo muito mal disposto, e na eventualidade de um desses dias cair entre segunda e sexta, ainda pior. Não podendo assim evitar sair de casa e ter contacto com o resto da humanidade, irrita-me especialmente quando me cruzo com pessoas que sei de antemão que näo gostam de mim, ou que nutrem pela minha pessoa uma certa antipatia, ou que têm sérias reservas sobre a minha personalidade – porque não me conhecem, claro – e mesmo assim me dizem bom dia, boa tarde ou boa noite, conforme a hora do dia.
Alguns leitores já devem estar a pensar: “pronto, lá está o Leocardo a descarregar outra vez a sua bílis, só faltava mais essa”. Mas façam uma pequena análise interior e pensem nisto. Se não gostam de nós, preferem manter distância, evitam entrar em diálogo connosco, e em 99,9% dos casos o sentimento é recíproco, porque raio nos cumprimentam? Passo muito bem sem o vosso “bom dia”, ó palonços e palonças. Prefiro que finjam que não me viram, que receberam uma mensagem no telemóvel ficaram momentaneamente aleados da realidade, ou melhor ainda, que fujam e atravessem a rua a correr, sendo atropelados por um autocarro no processo.
Quem não gosta de nós e nos cumprimenta, fá-lo normalmente com desdém. É como quem diz “este tipo não interessa nem ao Menino Jesus, mas eu sou um(a) gajo(a) super bem-educado(a), e cumprimento-o na mesma”. Se por acaso se cruzam connosco na rua, pestanejam uma vez mais demoradamente e inclinam ligeiramente a cabeça para baixo sem sorrir (reparem nisto, é mesmo verdade!) e das suas bocas imundas não sai mais que um “bom dia” ou “boa tarde”. Eu respondo sempre “olá”, porque se retribuo com “boa tarde” ou algo do género, preciso de acrescentar “…bom salvo seja, na verdade quero que te f…s”. E mesmo este “olá” sai a muito custo. O que me dá vontade de dizer mesmo é “bom dia o c…! sabes onde é que podes meter o bom dia?”.
Se os encontramos num café, livraria, supermercado ou outro local público, fingem que não nos vêem – e ainda bem! Obrigadinho, ó pázinhos. No caso de se dar contacto visual, viram a cara e dizem-nos “bom dia”, sempre sem sorrir. Se somos nós a tomar a iniciativa, o que nunca acontece no meu caso, alguns respondem com um vago “então…”. A resposta adequada é apenas esta: “então o quê, palerma?”. Torna-se mais embaraçoso se estiverem acompanhados de alguém com quem temos boas relações. Fica difícil dizer ao nosso amigo ou amiga que precisa escolher melhor as companhias. Ah como é ingrata a sinceridade…porque é que precisamos de representar e mentir para sobreviver neste mundo cão?
É que não sei se estão a ver, sou um tipo muito independente e tal, e não vos vou inquirir sobre as razões dos vossos “azeites”. Às pessoas que tenho que aturar além da família, de que normalmente dependo para trabalhar e não tenho outra escolha senão ser no mínimo suave, coloco normalmente uma barreira que nos permita uma relação positiva sem no entanto lhes dar muita confiança. Se não preciso de V. exas para nada, passo muito bem sem o vosso “bom dia”. As vossas trombas de cão sarnento agradam-me mais que os vossos cumprimentos fajutos. Façam de conta que sou invisível, que nada me dá mais gosto que o vosso desprezo, que para mim sabe a mel de crisântemo. Agradecido por antecipação – não esperem é que alguma vez vos diga “obrigado”.
Para baralhar ainda mais as contas há ainda aquelas pessoas com quem mantemos relações cordiais, mas que subitamente nos começam a tratar com frieza. Ora porque algum sacana lhes meteu uma intriga a nosso respeito, interpretaram mal atitudes, gestos ou palavras nossas, não gostaram de qualquer coisa que fizemos ou dissemos, sei lá, pelo menos eu ainda não tenho a capacidade de ler os pensamentos. Há pessoas que são apenas parvinhas, e alguns dos seus comportamentos não obedecem a qualquer lógica. Quem não está contente connosco e não tem coragem de nos encarar com o que o incomoda a nosso respeito, então pode-se juntar ao grupo daqueles referidos acima, e ir mamar na quinta.
Por vezes cruzamo-nos com gente que não viamos há bastante tempo, e subitamente lembramo-nos que estávamos muito bem assim…até àquele preciso momento. Se me cumprimentam, tenho tendência para responder “faz tempo…”, como quem diz “e eu a pensar que tinhas morrido, ou sumido do mapa, e afinal não…estragaste-me o dia”. Era um mundo perfeito se pudessemos escolher quem encaramos no dia-a-dia, como num restaurante. E há dias – muitos, mas isso é problema meu e só a mim me diz respeito – em que eu diria apenas “não quero nada, hoje estou de dieta…”.
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