Já dediquei vários posts neste blogue à cadeia multi-nacional de “fast-food” da McDonald’s, e na maior parte dos casos não fui nada simpático. A implantação que tem no território, com vários restaurantes em todas as freguesias (não sei se já existe algum na Vila de Coloane) e a sua aceitação por parte da população é mais que uma questão de mau gosto: é um problema de saúde pública. A comodidade, a rapidez e o preço (Macau tem o McDonald’s mais barato do mundo) tornam o gigante americano numa opção convidativa para quem não tem muito tempo para tomar as refeições, e a sua estratégia de cativar os consumidores mais jovens são uma aposta no futuro. Quem come habitualmente McDonald’s na infância, vai continuar a fazê-lo na adolescência e na idade adulta, e de forma quase reflexiva. Num território onde a restauração sofre da falta de espaço e do preço proibitivo das rendas, o McDonald’s está um pouco por toda a parte, todos são servidos e há lugar sentado para a gente. Nem os mais velhos resistem ao seu “calor humano”. Por vezes encontramos lá cidadãos idosos que até há poucos anos nunca tinham comido um hamburguer na vida – nem imaginariam vir a comer. É esta a vantagem do McDonald’s: facilita-nos a vida, oferece “refeições” completas a preços acessíveis e adapta-se a todos os gostos. Nem os críticos como eu consideram a comida “intragável” de todo.
Falo da minha experiência pessoal. Quando deixei Portugal em 1993 não existia um único restaurante McDonald’s. Não precisam de puxar pela cabeça e tentarem lembrar-se da chegada dos “arcos dourados” a Portugal, pois garanto que até 1993 não existiam. Mesmo o único Pizza Hut que existia ficava em Picoas, em Lisboa (ou seria no Saldanha?), e apesar de nunca ter lá entrado ouvi dizer que havia uma lista de espera de semanas! Claro que existiam hamburgarias e pizzarias em Portugal, mas com um carácter mais privado e menos “industrial”. Lembro-me do Maxi Burguer dos Restauradores, onde quem pedia um hamburguer tinha que esperar que este fosse especialmente preparado; não exisitiam hamburgueres pré-fabricados e embrulhados em papel vegetal. Mesmo qualquer cidade ou vila mais ou menos cosmopolita tinha casas onde se faziam hamburgueres, cachorros e pizzas. Mas nada de McDonald’s, isto posso garantir.
A primeira vez que entrei no McDonald’s foi em Macau. Uma amiga minha que chegou alguns anos antes de mim contou-me que ainda assim a chegada da multinacional ao território tinha sido mais ou menos recente, no início dos anos 90, e que antes disso os miúdos “faziam a festa” durante as idas a Hong Kong, onde a passagem pelo McDonald’s era obrigatória. Confesso que fiquei impressionado com a variedade, e como sou curioso, não descansei enquanto não provei tudo o que o McDonald’s oferecia no menu. Comia “set meals” entre as refeições lá de casa, e em poucos meses fiquei completamente esclarecido. Depois de ter provado o último pequeno-almoço, concluí o meu curso intensivo sobre o McDonald’s. O “american dream” escorregou-me pela goela abaixo empurrado pelas colas e “milkshakes”. Era finalmente um cidadão do mundo. O que me valeu na altura (além da elegância, claro) foi a minha juventude – quando se tem 18 ou 19 anos quase tudo é permitido, e o metabolismo encarrega-se de rectificar os excessos.
Actualmente contam-se pelos dedos as vezes que como no McDonald’s num ano civil. Se quero fazer uma bucha rápida, prefiro uma sandes da Maxim’s ou alguns iogurtes, qualquer coisa que engane o estômago até à próxima refeição decente. Não que me considere superior ao comum dos mortais e imune ao apelo do McDonald’s, mas a idade não perdoa, e mesmo uma “happy-meal” mais modesta deixa-me com uma azia que faz com que logo me arrependa, apesar de muitas vezes me sentir tentado, como toda a gente. O problema é apenas meu, portanto. Quando levo lá o meu filho não me inibo de dar uma dentada num hamburguer mais apetecível ou “roubar” um nugget, mas evito sempre a “ida à loucura” que representa um “set” completo. Deve ser mentira que juntam à comida algum aditivo que “vicie” os clientes, algum parente afastado da nicotina, mas não garanto. Mesmo não sendo um consumidor habitual, tenho uma opinião formada. Há coisas de que gosto mais que outras. Até no menu do McDonald’s.
Então e o que se come afinal neste McDonald’s? Para quem não consegue mesmo resistir, o que lhe recomendo? Em primeiro lugar deixemos de parte os ingredientes e a componente higiénica – o melhor mesmo é não pensar nisso, e o McDonald’s não será o único “pecador”. Vamos ficar pelo sabor, pelo que nos diz o sentido do gosto. O que primeiro me chamou a atenção foi a qualidade das batatas fritas. Em Macau é impossível fritar em casa batatas fritas tão boas como as que encontramos no McDonald’s – mesmo as congeladas, e as mais caras. O problema é a expectativa de vida destas batatas. Se não forem comidas em dez minutos começam a transformar-se em borracha. Se decidirmos acompanhar um frango grelhado ou um bife feito em casa com batatas fritas do McDonald’s, estas arriscam-se a passar de validade durante o caminho de regresso. Nesse caso o melhor é comprar batatas acabadas de fritar, e de preferência ainda impregnadas de óleo a ferver.
Das opções mais simplistas e baratas do menu temos o clássico “hamburguer” e o “cheeseburguer”. A diferença entre ambos consiste numa mera fatia de queijo quadrimétrico. São ambos comestíveis, enchem mais que a cova de um dente por menos de dez patacas, mas dificilmente chamaria a isto de “hamburguer”. O pão é aquilo que os americanos chamam “bun”, um primo redondo do nosso pão-de-leite. Pelo menos para mim hamburguer que se preze vem num pão viçoso e consistente, que exija a utilização dos dentes. O “hamburguer” clássico e o “cheeseburguer” oferecidos pelo McDonald’s vêm já semi mastigados e semi digeridos. Não têm piada nenhuma. Das opções mais económicas destaco o Egg McMuffin, que consiste num ovo frito numa forma arrendondada mais volumosa que o próprio pão e uma fatia de uma espécie de paio, entalados num “bun” branco bem mais apetecível que o do hamburguer. Há ainda a versão “Sausage McMuffin with Egg”, a mesma coisa, mas com um “burguer” alegadamente de carne porco (sausage) com uma consistência semelhante ao haxixe e um sabor herbáceo, meio picante. O “egg” sem o “sausage” come-se bastante bem.
O menu principal de hamburgueres de carne de vaca (e dizem que um simples hamburguer chega a conter carne de mil vacas diferentes) tem pelo menos o mérito de ser bastante consistente. O “Quarter pounder with cheese” e o “Big & Tasty” têm o condão de encher a barriga através de uma injecção massiva de bife, e o célebre “Big Mac” nunca desilude o cliente mais pretencioso: dois hamburgueres entalados em pão (outra vez o “bun”) com sésamo, alface e tomate para dar colorido e um molho que só por si chega para que não se coma mais nada nesse dia. Apesar de inegavelmente deliciosos, estes hamburgueres são ao mesmo tempo um desafio à etiqueta. É quase impossível não lhes dar um dentada sem que se começem a desmontar e a pingar molhanga. Comer um Big Mac é regressar por instantes ao estado natural mais bruto, e uma imagem captada por alguma câmara mais indiscreta pode muito bem servir a uma campanha contra a obesidade e a hipertensão.
Nem só de bife se faz a ementa do McDonald’s. A galinha diz presente em algumas variantes, sendo a mais conhecida o “Chicken McNuggets”. Gosto do molho que acompanha os nuggets, mas não consigo sentir que estou a comer carne de galinha. Ninguém sabe muito bem de onde vêm os nuggets, e se calhar é melhor que permaneça um mistério. As asas de galinha, ou “chicken wings” são um dos meus favoritos, e pouco ao nada ficam a dever às suas congéneres do rival KFC. Sabem ainda melhor com o molho picante que é servido separadamente. Existem três sanduíches de galinha: o McChicken, que é bastante fraquinho, o Chicken Fillet Burguer, que é sofrível, e o McCrispy Chicken Fillet, que é delicioso: estaladiço, saboroso e com a dose ideal de picante. Um dos poucos triunfos da cadeia norte-americana.
Quem desconfia do tratamento que a empresa dá aos animais, não come carne de vaca ou sofre de algum tipo de consciência ambiental e afins mas mesmo assim quer frequentar o McDonald’s, tem um leque reduzido de opções, mas não se arrisca a passar fome. Assim o Filet-O-Fish é um dos mais requisitados, um sanduíche de filete de peixe com um molho branco que divide opiniões (eu pessoalmente gosto). Aqui há uns anos investigou-se a origem do peixe que compõe o Filet-O-Fish, e mais uma vez é um daqueles tópicos que ficam melhor de fora desta “prova de sabor”, e aí o Filet-O-Fish até merece nota positiva. Há também uma salada, meio crua e sensaborona, milho em copo, que pode ser misturado com manteiga, e em alguns países (às vezes em Macau) há sopa de vegetais. Uma refeição completa sem que coma bife ou frango. Quem disse que o McDonald’s não pensa em todos?
Deixei o pequeno-almoço quase para o fim. Tenho uma filosofia de vida muito simples: para comer pequeno-almoço do McDonald’s, mais vale aguentar até ao almoço para quebrar o jejum. Um simples copo de leite é preferível. O Deluxe Breakfast, conhecido por conter valores de gorduras saturadas acima da média diária recomendada, consiste num dos tais “sausage” que lembram haxixe, uma tentative de ovos mexidos, um pão do “Egg McMuffin” sem nada lá dentro, um pacote de geleia de uva e um “hashbrow”, uma espécie de bolinho de batata frito tão oleoso que se pode espremer. Além da componente do “faça você mesmo”, deixa pouco lugar à imaginação e parece incomplete: o pão sem nada serve para quê? Entalar o hamburguer? Besuntar de geleia? Pode-se optar por um pequeno-almoço de sopa de macarrão com “sausage” ou filete de galinha. Escusado será dizer que para comer macarrão não é preciso ir ao McDonald’s. Existe ao pequeno-almoço um “set” que consiste num “hashbrow” e um hamburguer que dá pelo nome de “McSausage”. Ao contrário dos outros “sausage” (que relembro, lembram haxixe), este é mais suculento, sumarento, e apresenta-se numa cor avermelhada. Não sei quanto mal faz, mas pelo menos sabe bem. Do que servem ao pequeno-almoço, é a única coisa que se come bem.
O açucar em quantidades industriais não podia faltar numa ementa de “fast-food” que se preze. A começar pelas bebidas acompanham a maior parte das “meals”: Coca-Cola, Fanta e Sprite. Não é preciso dizer mais nada. Quase tão doces quanto estas temos os “milkshakes”, ou “batidos”, com sabores de chocolate, baunilha e morango. Se estes “batidos” contêm algum leite é bastante discutível, mas a sua consistência inicial assemelha-se a gelado. Só se começa a beber bem depois de deixados durante alguns minutos a temperatura ambiente. Para quem quiser existe chá, café e até água para acompanhar a refeição (e leite da marca McDonald’s, pasme-se). Há um chá gelado de limão (“Lemon Ice tea”) completamente insipido se não for misturado com o açucar liquido que acompanha o pedido. É água gelada com açucar e uma rodela de limão, basicamente. Para a sobremesa existe a “apple-pie”, cujo interior é tão quente que provocaria queimaduras de segundo grau na lingua se fossem consumidas de imediato, e os gelados. Além da recente introdução dos McFlurry, gelados com Oreos, Smarties e etc. temos os clássicos “Sundaes”, simples gelados de baunilha em copo de plástico com calda de morango ou chocolate e algumas amêndoas. Existe ainda um simples gelado de baunilha em cone que custa a módica quantia de 5 patacas, muito requisitado por quem quer simplesmente…comer um gelado. Sabe bem nos dias de mais calor.
Além do menu fixo, aparecem algumas ofertas temporárias, promoções sasonais ou variantes do produto original. Em Macau priviligia-se o gosto local, e apesar do McDonald’s (ainda) não servir sopa de fitas ou “chow mein”, existe “pie” que em vez de maçã tem feijão vermelho ou inhame, e sacrilégio! “Sundaes” com sabor a durian! Certamente há quem goste, ou quem tenha provado, mas a minha audácia não me leva tão longe. Que se alterne os habituais chocolate morango som outros sabores, laranja, limão ou ananás ainda vá lá, mas tinham que ir estragar tudo e levar o aroma da fruta-doninha até aos inocentes gelados. Dos hamburgueres “temporários” que fazem parte do menu de tempos em tempos, destaco dois: o McPepper, uma versão do hamburguer normal com cebola extra e temperado com molho de pimenta preta, e o Shogun Burguer, de inspiração japonesa, outra vez um “pattie” de vaca com um molho agridoce (desconfio que se trata de mostarda que foi deixada muito tempo ao sol). Ambos deliciosos, e que justificariam fazer parte do menu fixo.
Espero que tenham gostado deste pequeno “tour” pela ementa do McDonald’s. Lembro que estas são apenas considerações pessoais com base no meu próprio gosto, e o facto de não gostar da comida do McDonald’s e não a recomendar a ninguém não significa que existe hipocrisia da minha parte. Como podia eu falar mal se não soubesse exactamente do que se trata?
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