quinta-feira, 7 de agosto de 2014

O Armagedeão, o Apocalipse, o Referendo


Não sei se viram o filme "Armageddon", com Bruce Willis no principal papel, e que conta a história de um grupo de perfuradores de rochas salvam a Terra de um asteróide que se encontra em órbitra prestes a colidir com o nosso planeta e acabar com toda a vida, animal, vegetal e mineral (já sei, "mineral" não é vida). O referendo informal que os três grupos do campo da pró-democracia-por-oposição-ao-regime-de-partido-único-na-China pretendem realizar em Macau é um pouco como esse asteróide: cada vez mais perto do território, faltando apenas 17 dias para o impacto, e as consequências são de todo imprevisíveis. Mas retiremos a acção, o suspense, o heroísmo ou todos os ingredientes daquilo que seria um filme que valesse a pena ver (e o tal "Armageddon" foi mal recebido pela crítica, pasme-se): aqui o medo da colisão resume-se a um nervoso miudinho com intensidade q.b. para deixar manchas húmidas na zona da braguilha das calças. Os democratas não parecem querer recuar nas suas intenções, lembrando um carocho que injecta consultas públicas para a veia como se não houvesse amanhã, a elite dirigente e os seus imediatos levam as mãos à cabeça berrando "ah sê desgraçade, que matates tê pai!", e há um puxador de riquexó de sandálias e chapéu em bico que vai abanando a cabeça e fazendo a trança dançar que diz: "aya, nan podi, nan podi!". Sim, caros leitores, isto não chega a uma super-produção hollywoodesca com todo o seu charme. Isto é um "low-budget" tuga filmado no Porto Interior, com muitos planos parados e conversa da treta a dar com um pau. E os actores...uff.

Agora vem o Centro de Estudos "Um país, dois sistemas" do Instituto Politécnico (IPM) reiterar a tese de que o referendo "é ilegal", além de "um desafio às autoridades", e portanto "prejudicial". Mas o elemento de comédia, sempre muito, muito discreto nestas produções cinematográficas filmadas por cima de porno-chanchadas brasileiras dos anos 70 com o propósito de economizar fita, está presente no argumento de que o referendo é, vejam bem isto, "hipócrita". Ah, ah...porra que o filme ficou chato outra vez. Por "hipócrita" entende-se algo cujos actos não correspondem às convicções ou às palavras, e para que fosse assim, os democratas teriam que ter apoiado inicialmente o actual método de eleição do CE, e mais tarde vir com isto do referendo. Não me lembro de os ter ouvido dizer alguma vez que teriam outra intenção senão levantar a hipótese do sufrágio universal. Enfim, "hipócrita" é um termo que cai como ginjas quando se quer desacreditar alguém, mesmo que não faça sentido. E por falar em falta de sentido, a questão da ilegalidade do referendo continua a sofrer de uma falácia aguda em matéria de raciocínio. Estes investigadores deste centro, supostamente gente muito inteligente e experiente, verdadeiras cabecinhas pensadoras, fecham-se em copas na hora de fundamentar a putativa ilegalidade - é ilegal "porque sim", porque a Lei Básica não fala nisso, e portanto não, não e não. Mas a questão do "desafio às autoridades", sim senhor, é bem visto, e certamente que poderá ser "prejudicial", pelo menos para alguns, mas e para quem está atento aos desenvolvimentos e não é uma besta quadrada que acredita em qualquer coisa? Isto do "ilegal porque não é legal nem ilegal" não convence ninguém, mas o incómodo é evidente; parecem putos da escola que acabaram de levar um enxerto de porrada, e ainda a chorar baba e ranho e a fugir do agressor vão prometendo o que não podem cumprir: "Ai é assim? Vais ver, vais ver! Tás f...o, c.... . O meu irmão sabe karaté. Vou contar ao director. O meu pai vem cá amanhã". Ridículo, e vindo de gente que se diz educada. Surpreende-me como ainda ninguém se lembrou da ladainha do "patriotismo" para intimidar os apoiantes do referendo. Alexis Tam deu um lamiré neste sentido quando há algumas semanas sugeriu algo como "traição", mas ficou-se por aí. Felizmente ainda há quem ande aos esses devido às folgas na direcção, mas tem o travão de emergência operacional.

Agora falando a sério, e mudando as agulhas para quem sabe do que fala e fundamenta os seus argumentos com bases sólidas e válidas. O jurista António Katchi, curiosamente docente no mesmo IPM do tal Centro de Estudos "Um país, dois sistemas", publicou em 22 de Julho no site "Direito Online" um texto onde defende a admissibilidade jurídica de sondagens e referendos em Macau, texto esse publicado em duas partes no Ponto Final, nas suas edições de terça e quarta-feira. Mais uma vez gostava de relembrar que não tenho nenhuma "paixão" pelo referendo nem coloco os autores da iniciativa num pedestal de heroísmo ou nada que se pareça. O que me incomoda é que venham uns senhores que inicialmente prometiam "jogo limpo" para que toda a gente pudesse dormir descansada e os deixasse fazer as suas "trafulhices" em paz, e ficava todo o mundo feliz, mude agora as regras do jogo perante a mínima contrariedade, ameaçando criar um precedente catastrófico, acenando com esta teoria do "não legal=ilegal" que uma vez aplicado pode ser usado por analogia a muitas outras coisas. É o fim das liberdades como as conhecemos, e faz-me confusão como um grupo supostamente dedicado a questões da dualidade de sistemas vigentes na RPC e nas RAE de Macau e Hong Kong alinhe neste diapasão, demonstrando ser parcial e irresponsável. António Katchi é habitualmente crítico do desempenho do Executivo, mas não acredito que tenha alguma simpatia especial pelos organizadores do referendo. O que faz aqui é manter-se fiel aos princípios da legalidade que fazem parte da sua formação, e só por isso merece todo o reconhecimento de quem quer levar isto a sério, e não "às vezes" ou "depende", ou "quando convém". Como diz o povo: "Ou comem todos...".

Finalmente gostaria de referir o editorial de hoje do director do JTM, José Rocha Dinis, que mais uma vez faz referência a este tema do referendo. Em primeiro lugar queria pedir desculpa a JRD pelas vezes que lhe chamei "apaga-fogos" - desculpe, perdão, arrependo-me com montes de chantilly e uma cereja marrasquino em calda de chuchu por cima. É que chamá-lo "apaga-fogos" fica a anos-luz da verdade; o que ele é uma "super-cola", tão forte que conseguiria juntar eficazmente a Grande Muralha da China depois desta se partir ao meio deixando uma fenda de 50 metros de diâmetro por uma distância de 2 km. Na eventualidade do sol explodir e a população da Terra entrar em pânico, ele viria dizer que "é apenas uma aurora boreal", e mesmo depois de se confirmar que o sol explodiu e vamos todos desta para melhor, ia assegurar-nos que "em Macau estamos seguros, pois o Governo vai dar a cada família um frasco de protector solar mesmo muito bom (menos aos trabalhadores não-residentes)". O director do JTM tem um sentido de humor tão especial, tão refinado, que no fim só ele se ri - muitos percebem, mas ele fica a rir sozinho. Mas que elasticidade tem aquela imaginação, em vir buscar um inquérito "online" de um sítio da internet em Portugal sobre a infidilidade conjugal e misturá-lo com o tema do referendo de Macau. Resultados interessantes, contudo, aqueles do inquérito: 45% dos traidores são adeptos do Benfica - lá se vai a máxima do "quem não é benfiquista não é bom chefe de família", que não perdem uma oportunidade para dar uma facadinha no matrimónio "mesmo rodeados pelo cônjuge e família", e que a maior parte deles "são cristãos", mas "não se importam com a religião da parceira de traição". Claro, claro, eu próprio pratico uma hora de auto-flagelação e dou dez voltas de joelhos ao santuário de Fátima cada vez que reparo na bunda de uma pagã, e isto da religião tem tudo a ver com a debochada arte da pinocada casual. Ao tentar menorizar o referendo informal dos democratas através deste exemplo, querendo dar a entender que qualquer que seja o resultado, será sempre uma farsa (na segunda-feira disse que o "sim" ao sufrágio universal ia ganhar com 99%; ele lá sabe), que leitura podemos fazer? Já sei! O referendo vai demonstrar que 45% da população de Macau não se importaria de trair o Chefe do Executivo por "e-mail" ou no Whatsapp, desde que fosse com um parceiro benfiquista, mas não era capaz de ir com ele à missa. Vêem como é fácil?

2 comentários:

Pedro Coimbra disse...

Acho piada o tempo de antena que tem tido esta recolha de assinaturas.
Os promotores é que se riem.
Estão a dar-lhes uma importância, a ter um impacto, que nunca julgaram poder ter.

Leocardo disse...

Nunca vi o Governo tão empenhado na resolução de um "problema" ;)