Depois de anos e anos de abusos da parte dos taxistas em Macau, chegamos finalmente à fase em que pensa em soluções para o problema. É um pouco assim com tudo nesta terra; foi assim com a habitação, com a inflação, com o trânsito, e agora até com a reforma administrativa, colocando-se na mesa a possibilidade de reduzir secretarias, mergir e extinguir departamentos, mudar o elenco, enfim, depois de muitas cabeças a fazer força e nenhuma a pensar, lá alguém acabou por dizer: "epá pois é, isto de ter secretarias, departamentos e secções a dar com um pau atrasa mais do que adianta; e olha lá, aqueles tipos que aparecem às vezes na televisão parecem sempre os mesmos desde...sempre?!". Aqui a resolução dos problemas não passa por aquilo que nas sociedades desenvolvidas com oficiais públicos competentes e uma população atenta e responsável se chama "combater o mal pela raíz" - nós cá esperamos que a árvore cresça, porque faz falta mais sombra. Em Macau o problema aparece, há duas ou três pessoas que se queixam (se forem turistas não faz mal porque depois vão-se embora), depois começa a queixar-se um número de pessoas cada vez maior, até que aparece a primeira menção na imprensa, o Governo "está atento", mas se a China não diz nada, fica-se nas tintas, até que a insatisfação é tão grande que começa a entrar no "guisado" de outros problemas "mais sérios", aí "manda-se lá alguém ver", e chega-se à conclusão que "não há nada a fazer"/"é difícil de resolver"/"a fiscalização faz o que pode mas não é suficiente"/"está-se a preparar legislação adequada". Se a solução for na forma de subsídios, ai ai mãezinha, que os prevericadores chamam-lhe um figo, e deitam a unha a esse dinheiro mais depressa do que um diabético guloso a uma caixa de macarones.
O caso dos táxis apareceu não na forma de árvore, mas de trepadeira. Existiram sempre taxistas desonestos, mas se antes se limitavam a dar três voltas à cidade com uma passagem pelo Alto de Coloane quando apanhavam um turista do Jetfoil que lhe pedia para ir ao Jaialai, a proliferação dos casinos e sucedâneos foi um "El Dorado", com resmas de novos turistas que não só não se importavam de ser "depenados", como ainda lhes ofereciam as penas e tudo! Com isto os homens do táxi tornaram-se finórios, começaram a rejeitar que tivesse "cara de Macau", e os tais casinos e etcetera passaram a ter cada um a sua frota de veículos de aluguer ao seu serviço - não que tivessem pedido uma, mas "aconteceu". Existiu sempre fiscalização, pelo menos no papel, e quando as queixas se multiplicaram toda a gente se lembrou: "'pera aí, há fiscalização, não há?". Haver há, mas estes taxistas funcionam assim um bocado como a Camorra napolitana, são todos "primos" uns dos outros, e têm um esquema que os torna imunes aos fiscais, às multas e às queixas. Quando alguém tem desplante de dizer que "mesmo pagando a multa ainda vale a pena infringir a lei", qualquer dia dá-se o caso de um taxista ser abordado por um fiscal e dizer-lhe "já sei, já sei, toma lá e vai-te embora", enquanto lhe enfia meia dúzia de notas de cem na boca.
Com tudo isto e muito mais a passar em sessão continua no Cine-RAEM, o Hoje Macau publicou hoje
uma entrevista com Tony Kuok, presidente da Associação do Mútuo Auxílio dos Condutores de Táxi, que parece o nome duma associação de gente muito pobrezinha - "mútuo auxílio", olha estes. O senhor diz que os taxistas são uma malta porreira, e tal, e que "dos 1080 existentes em Macau, 'apenas' 200 são trafulhas". Não há problema, portanto. Isto mais parece o diagnóstico de um médico chanfrado que chega perto de um cadáver e diz: "não sei como é que este gajo está morto...tem um buraco de um lado ao outro do crâneo e a mioleira toda espalhada pelo passeio, mas o resto do corpo está bom". O sr. Tony, que mais parece um fantoche com este cargo de elevada irrelevância e gritante impotência, vai desculpando os rapazes, porque a gasolina e manutenção estão caras, demoram a negociar com o Governo o aumento da bandeirada de 15 para 18 patacas, as licenças custam de um milhão para cima, enfim, não entendo onde que nós entramos aqui. Não me lembro de nenhum taxista ter-se recusado a apanhar-me atirando-me na cara com um "isto é para aprenderes a aumentares-me o preço da vulcanização dos pneus, seu malvado!".
Mas a parte mais fascinante da entrevista e que mostra de que matéria é feita esta gente (matéria fecal, para quem ainda não sabia), é aquela onde Tony Kuoc fala da fiscalização propriamente dita - os fiscais e a polícia sabem onde estão os infractores, mas "não os apanham". Não? Que porra, mas porquê? Têm medo, é isso? Claro que não, o medo é uma coisa que não lhes assiste, como dizia o outro. A lógica aqui é a seguinte: um polícia recebe um bónus se apanha um ladrão, mas se apanha um taxista infractor não recebe nada - então chatear-se "para quê"? Pois é, "para quê", boa pergunta. Os agentes da autoridade e os fiscais da DSAT recebem um salário para vestirem farda, pendurarem o distintivo ou o cartão, respectivamente, e fazer figura de corpo presente. Agora se lhes pedirem para trabalhar, de acordo com as suas atribuições, e fazer cumprir a lei, alto lá, que não lhes pagam para isso. São fiscais mas não são parvos. E não se pense que isto acontece só nesta cavalgada imperial que tem sido a novela dos táxis; é um pouco assim opor toda a parte. Temos em Macau uns tipos que a trabalhar são uns verdadeiros "pros" - não "pros" de "profissionais", mas de "prostitutos".
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