terça-feira, 12 de agosto de 2014

Olhó tiroliroló


Não sei se sou que me estou a tornar num dinossauro que ainda se lembra destas coisas do arco da velha, ou se mais alguém se recorda de uma anedota que se contava no tempo da primeira guerra do Golfo, em 1991: "Sabiam que o Savimbi vai apoiar o Saddam Hussein contra os americanos na Guerra do Golfo e vai mandar para lá reforços? É a coligação Iraque-UNITA!". Não sei se o pó e as teias da aranhas atrapalham, e se aqueles que não conheciam a chalaça entenderam o trocadilho, Iraque-UNITA, Ir à....Acho que sim, os leitores são uns tipos e umas tipas super-inteligentes e apanham à primeira este tipo de humor refinado. Ora bem, isto tudo a propósito de putativas coligações que possam causar embaraço ou cuja envergadura escangalhe algum orifício mais sensível, e das últimas cogitações da guerra entre os "croupiers" e as concessionárias de jogo, com as norte-americanas em destaque, e tudo por causa daquela mania parva de andar a contratar pessoas da sua confiança, competentes e com experiência para virem ganhar mais que os nossos rapazes com BIR, essas medusas de massa cinzenta, os "talentos" que brotaram do Canal das Hortas e arredores. Como se diz em patuá: "qui astrevidos, san nunca"?

Os "croupiers" são assim como uma espécie de casta superior da fauna laboral em Macau: protestam quando querem, onde querem, e fazem o barulho que muito bem lhes apetecer. Até não fazem muito, porque isto é na maioria gente simples, que sabe bater fichas, virar cartas, rolar dados, e como na maioria dos casos trabalham por turnos, às vezes ficam rabujentos do sono e não lhe apetece grandes alaridos. Mas e por detrás deste fenómeno que vai crescendo qual milho frito que já saltita na forma de pipocas há algum tempo sem que ninguém apague o lume? Nos idos tempos do monópolio da SJM, então STDM, tinhamos João Bosco Cheong como representante dos trabalhadores dos casinos de Stanley Ho. Nem era propriamente um delegado sindical ou nada que se parecesse, mas assim como um "tio" a que os sobrinhos correm para falar dos problemas, porque o pai não os ouve. Com a chegada dos americanos, Stanley Ho pensou em alguém mais próximo de si para tomar conta da loja, e como estava a pensar nisto enquanto se preparava para dormir, olhou para o lado e quem estava mais próximo era Angela Leong, que tem sido desde 2005 a voz da SJM, com plateia no hemiciclo dos Lagos Nam Van e tudo. Mas nem a "dama de ferro" do clã Ho está completamente a cobro da fúria dos "croupiers", pois a cara da contestação é este rapaz em cima na imagem, Ieong Man Teng, que se deu a conhecer numa entrevista ao Hoje Macau, publicada na sua última edição. Ieong é o líder da "Forefront of The Macau Gaming", que não sendo propriamente uma empresa organizadora de eventos, tem tocado o reunir os funcionários do jogo que temos visto ultimamente nas ruas. Apesar de não considerar um "radical", Ieong fala de associativismo, de sindicalismo, de política e pondera até usar o direito à grve como forma de protesto. E agora o mais sintomático: tem 28 anos, e não aparenta ser rapaz para se acomodar em preterimento dos seus direitos e dos direitos dos seus colegas. Onde é que já vimos isto antes? É grave?

Agora preparem-se. Estão sentados? Estão mesmo? Aqui vai: no seu editorial de ontem, José Rocha Dinis avista uma tempestade no horizonte. Não sei se ainda tem ADN de algum daqueles pescadores antigos que nunca ia ao mar se lhe doía o dedo grande do pé, e se isto é apenas faro apurado, uma daquelas (poucas) coisas boas que vem com a sabujice. Claro que aproveita para se armar em "guru", dizendo que ficou "baralhado" (mais que o habitual?) quando o Governo prometeu que a carreira de "croupier" seria apenas reservada aos residentes de Macau, e aquilo que prometia ser um bodo à população pode agora vir a tornar-se numa espinha entalada na garganta. Já era difícil prever o que será da indústria motriz da economia do território sem recorrer à mão-de-obra importada ficando a faltar alguns milhares de trabalhadores para os projectos em vista, como agora os protestos que têm como alvo as concessionárias podem chegar até ao Executivo. Isto explica-se, é claro, com uma agenda demasiado carregada do Governo: ocupados a fazer as contas de multiplicar aos retornos que chegariam na forma de impostos com a liberalização do jogo, deram-lhes um "dedo", e agora eles podem começar a mastigar por aí acima, com fome de "braço". É um pouco como acontece com as gajas: para ela nos deixarem Iraque-UNITA prometemos mundos e fundos, e depois na hora de cumprir é que são elas. Sim, sim, e a queca ainda pode sair mais cara. Querem ver porquê?

Imaginem que agora o tal Ieong Man Teng e os "croupiers" se juntam às três associações do campo pró-democrático que vão organizar no dia 24 o tal "referendo" que para o Governo tem sido água-benta na cara do Diabo. Imaginem que as reivindicações dos "croupiers" são o rum, e o referendo a Coca-Cola, e está na hora de fazer "Cubalibres". Imaginem ainda que de um lado temos o óvulo, do outro o esperma, e...bom, penso que já entenderam que esta é uma bota bem alta e apertada que o Executivo tem para descalçar, e se isto chega lá acima, ai ai, Jesus. Quer dizer: ai ai Harmonia, Amor à Pátria e Amor a Macau. Assim de nada vale acenar com a bandeira da ilegalidade do referendo, se os democratas tiverem o reforço da pedra basilar da economia para atirar à cabeça de quem tentar impedi-los de realizar a consulta. Estão no Centro de Saúde do Tap Seac, podem ter 80 pessoas à frente e o médico já está atrasado duas horas, mas dali eles não arredam pé. Ainda hoje à hora de almoço recebi das mãos de Wong Kin Long, a jovem promessa da "cantera" do Novo Macau (aquele de óculos atrás do Jason Chao, nesta imagem), isto:


Ah pois, o "referendo civil", como lhe chamam agora, está aí e é para ser levado a sério, apesar de alguns residentes já começarem a ter consciência da polémica, e assisti pelo menos dois deles a recusarem os panfletos que Wong Kin Long e Winkie Kuan Un San distribuíam esta tarde em frente ao Watson's da Rua do Campo, indiferentes ao calor que se fazia sentir (e tem estado um calor nada convidativo a andar na rua, mesmo para o activismo). A menos de duas semanas do pronunciamento final, a possibilidade da insatisfação dos "croupiers" se juntar à fome de referendo dos democratas é uma dor de cabeça para Chui Sai On e seus pares. Quando o tiroliroliro e tiroliroló se juntam à esquina a tocar a concertina e de dançar o solidó, a mãe China acorda da sua sesta e pode ficar rabujenta.

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