segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Os sons dos 80: The Smiths


These charming men.

Meninos, acham que a música que os vossos papás ouviam era uma trampa? Isso é por nunca ouviram os The Smiths, senão iam ter a certeza! Estou a brincar, é claro, e antes que me linchem, vou deixar claro que esta foi uma das melhores bandas dos anos 80 e arredores. E não sou o único: os The Smiths são considerados uma das bandas britânicas mais influentes do "rock", pioneiros daquilo que hoje se designa por música independente, ou "indie", e tinham um som que ainda hoje se mantém actual. O impacto dos The Smiths e a forma como influenciou outras bandas do seu tempo e que lhes seguiram tem ainda mais valor se considerarmos a sua curta existência, pois gravaram apenas quatro álbums entre 1984 e 1987. Pode-se dizer que a sua herança encontra-se num elevado grau de "pureza".


Corria o ano de 1982, e dois amigos de Manchester, Steven Patrick Morrisey e Johny Marr, estavam entusiasmados com a onda musical no Reino Unido, encabeçada pela "new-wave" e o "synthopop". O primeiro tinha uma excelente voz e sabia usá-la, e o outro tocava guitarra, e depois de se juntarem o baixista Andy Rourke e o baterista Mike Joyce, formaram uma banda a que chamaram The Smiths. Porquê este nome? O apelido "Smith" é o mais comum no Reino Unido, o equivalente ao nosso "Silva", e o grupo considerava que outras bandas da moda tinham nomes muito pretenciosos, como Orchestral Manouvres in the Dark (OMD) ou Spandau Ballet, e assim optaram pela simplicidade - "The Smiths" poderia traduzir-se em português para "Os Silvas". Com o vocalista já conhecido apenas por Morrisey, o grupo assinava pela editora independente Rough Trade Records, e em 1983 lançava o seu primeiro single, "Hand in Glove", mas só chegaria ao top-40 britânico à segunda tentativa com este "This Charming Man", que apresentaram em Novembro no programa "Top of the Pops", da BBC, como podemos testemunhar neste vídeo.


O impacto do grupo foi imediato. Era um som novo, diferente mas despretencioso, e o estilo de Morrisey tinha o seu quê de especial. Não surpreendia que o primeiro álbum, o homónimo "The Smiths", entrasse directamente para o 2º lugar do top do Reino Unido. A crítica aplaudia, e mais tarde em 1997 o The Guardian considerou-o o 73º melhor disco de todos os tempos. Um dos temas do álbum, "The Hand that Rocks the Cradle", esteve envolto em alguma polémica, por sugerir na letra uma relação pedófila. Mas "What difference does it make?", diria o letrista Morrisey, ele próprio polémico por natureza, e esse seria o nome do single principal do trabalho de estreia, e que seria nº 12 no top britânico. Em Junho lançam mais um single, "Heaven knows I'm miserable now", que se tornaria num dos seus temas mais emblemáticos. O tema, que não foi incluído em qualquer álbum mas faria parte da compilação "Hatfull of Hollow", não foi além do 10º lugar do top, mas entrou no Rock'n'Roll Hall of Fame como "Uma das 500 essenciais da história do rock".


Em Fevereiro de 1985 sai o segundo álbum, "Meat is Murder", um título que se explica pelo facto de Morrisey ser vegetariano desde os 10 anos. O líder dos The Smiths começava a tornar-se maior que a própria banda, e não se poupava nas declarações polémicas, ora contra o governo conservador da Primeira-Ministra Margaret Thatcher, ora contra a monarquia. Ficaram célebres os seus comentários infames a propósito do Live Aid, muito publicitado nesse início de 1985: "Uma coisa é combater o sofrimento das pessoas na Etiópia, outra é torturarem-nos aqui na Inglaterra". E "This Joke Isn't Funny Anymore" - era assim o título do primeiro single do novo disco - que teve uma passagem discreta pelos tops, assim como o single seguinte "Shakespere's Sister". Em Setembro, antecipando um terceiro trabalho de originais, lançam o single "The Boy With the Thorn on His Side", que apesar de não ter ido além do nº 23 no top, era um sinal de que algo grande estava para vir.


"Bigmouth Strikes Again" - "o boca grande volta a atacar", é o título do single seguinte, já no ano de 1986, e bem podia descrever o carismático Morrisey, cujo nome já se confundia com os The Smith. O terceiro disco saía no Verão, e lembram-se como o cantor não simpatizava com a monarquia? Pois é, e assim o título do disco ficou "The Queen is Dead", algo que na Inglaterra quase nem se pode dizer em público, quanto mais escarrapachar na capa de um disco, e mais: era também o tema de abertura. Apesar dos títulos algo "estranhos" que surgiam neste registo ("Vicar in a Tutu", "Franky Mr. Shankly" ou o single "Some Girls Are Bigger Than Others"), "The Queen is Dead" deixou a crítica rendida, e os fãs aos pés do grupo, especialmente do seu líder Morrisey, que além de estar com a voz melhor que nunca, escrevia letras inspiradíssimas. A revista Rolling Stone deu a pontuação máxima de cinco estrelas ao álbum, que seria nº 2 no top do Reino Unido. Este single "There's a light that never goes out", o último do disco, marcaria também a última aparição no top-40 de sigles, ficando pelo 25º lugar.


Quando se pensava que os the Smiths não podiam ir mais longe, eis que Morrisey e companhia puxam mais um trunfo da manga, e lançam em 1987 o quarto álbum de originais, "Strangeways Here We Come", que seria novamente nº 2 no top de álbums. Um disco excelente, o meu favorito do grupo, que abre logo com uma tema fortíssimo, "A Push and a Rush and the Land is Yours", segue para "I Started Something I Couldn't Finish", um tom abaixo mas igualmente potente, e varia entre a "pop" fácil de "Girlfriend in a Coma", provavelmente o tema mais conhecido, ao "pop" comercial de "Stop Me If You Think You've Heard This One Before", antes de finalizar o lado A. No lado B, mais sombrio, abrem com "Last Night I Dreamt That Somebody Loved Me", muito "easy-listening", segue para o amargo "Unhappy Birthday", e desce até ao abismo do desespero até ser interrompido pelo "finale" de "I Won't Share You". Os The Smiths estavam no pique da sua forma, e depois disto, acabam. "Strangeways here they are".


Mas onde começavam os Smiths, estava Morrisey, e onde acabam...também. O "génio maldito" não perde tempo e nesse mesmo ano entra em estúdio para gravar o seu primeiro trabalho a solo. O single "Suedehead" sai em Dezembro de 1987, anunciando o álbum "Viva Hate" (muito apropriado) no início do ano seguinte. O segundo single é este "Everyday is like Sunday", um som muito The Smiths, que é como quem diz, muito Morrisey. Sempre polémico, sempre disposto a chocar, sem saber em que direcção vai, Morrisey continua igual a si mesmo, e insiste em continuar a gravar hoje, aos 56 anos, sendo o seu último registo "Years of Refusal" de 2009. Agora o leitor mais introspecto perguntará: "mas ó Leocardo, este gajo é rabeta, não é". Bem, não conheço o senhor na sua intimidade, mas em relação ao tema da sua sexualidade, que sempre foi considerada "ambígua" por a ter mantido sempre em segredo, disse no seu "website" a propósito de rumores que o davam como sendo homossexual: "Infelizmente não sou homossexual. Tecnicamente sou humanossexual - sinto-me atraído pela espécie humana". 100% Morrisey, sem misturas.

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