segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Com que então, a verdade...



Para se ser feliz é preciso ser-se um bocado parvo. Eu, por exemplo, sou. A felicidade é inversamente proporcional a uma série de coisas de boa fama, como a sabedoria, a verdade e o amor. Quando se sabe muito, não se pode ser muito feliz. A verdade é quase sempre triste.

Miguel Esteves Cardoso


Mas vejam só, que compromisso sério, aquele o que fazemos com a verdade. Anda muito bem cotada na bolsa, a verdade, estes dias. Deve ser a tal lei da oferta e da procura de que por aí falam. Estranho, muito estranho, atendendo aos quilos, litros e metros de "inverdade" com que os "donos da sua verdade" inundam o mercado. O que é a "inverdade", no fim de contas, senão a mentira? Alto lá, que é feio chamar alguém de mentiroso; há a verdade, una, indivisa e imutável, e há depois a "verdade de cada um", que às vezes pode ser uma mentira em que nem os próprios acreditam, os velhacos, ou algo que ingenuamente tomam por verdadeiro, mas carece de qualquer fundamento que lhe de pernas para andar - tolos, essoutros. Ambos pecam no único ponto que têm em comum: é como verdade que tentam vender este sub-produto, e se há quem como tal o consuma, ignorando a sua falácia, está a ser enganado, vitima da mentira. Se por outro lado há ainda os que, conscientes do logro, ainda assim o toleram, primeiro porque "não tem importância", e mais tarde porque depois de tantas coisas "sem importância" já ninguém se lembra de quando a prática se tornou lei. A isto chama-se "viver da mentira".

E quem vejo eu a fazer da verdade a sua bandeira? Exactamente, ele mesmo, "tal igual", citando o próprio. Mas e depois, se "tal igual" ou "tal e qual", se o tempo do verbo está correcto ou não, ou se foi bem feita a concordância? O que importa, e passo a citar, "é fazer passar a ideia", e de preferencia em poucas palavras, pois tudo o que se torna prolixo deve ser mandado..."pró lixo". Que mania esta, a dos "intelectuais", criaturas que foram ler todos aqueles livros cheios de letras não em proveito próprio, mas só para aborrecer os que não leram, que andaram ocupados com coisas mais importantes, como obter a sua licenciatura na "escola da vida". Que bonito, que filosófico, só que não sei se filo, se só fico. A propósito, quem era a professora de Português nessa tal "escola da vida", se alguma houve? Se a virem, digam-lhe que tenha vergonha!

Não falo do alto da torre da arrogância quando digo o que lhe vou dizer a seguir. Não sou o dono da razão, e nem gostaria de ser, pois a razão é um pouco como um cachorro que está sempre a pedir que o levem a rua, que lhe dêem festinhas e atenção, e há dias em que simplesmente nos falta paciência. Mas assim como não podemos abandonar o cachorro ou deixá-lo no canil para o ir buscar cada vez que nos apeteça a sua companhia, também com a razão e com a tal verdade - a autêntica, não a outra entre comas, a falsa - é necessário assumir um compromisso. Quando nos metemos nas redes sociais, e aí perdoe-me o desaforo, sou o padre que reza a missa e V. Exa. o fiel que baixa as orelhinhas e escuta: são as REDES SOCIAIS, entendeu? Não são o recreio que V.Exa. escolheu esta semana para brincar, não são o bar que abriu para se divertir sozinho, e se acha que as regras são você que as faz, e quem discorda "pode sair", vai acabar a falar sozinho para uma parede. E não, não vai bater em ninguém. Deixe-se lá de merdas, e tenha no mínimo a noção do ridículo.

A diferença entre as redes sociais e a imprensa tradicional consiste no facto das primeiras terem a vantagem de não se regularem por um Código de Conduta, mas no momento em que V. Exa. se compromete a elaborar estatutos (?), organizar Assembleias Gerais (?!), de onde saem actas e sabe-se lá mais o quê, estamos então na presença de uma ONU, ou de uma NATO, com a particularidade de não servir qualquer fim - a não ser que reportar carros mal estacionados ou barafustar a torto e a direito por não poder fumar onde lhe apetece sejam um "fim". Reservo-me ao direito de discordar  da validade desse "fim". Mas a coisa parece séria, e torna-se séria, no momento em que no nome da...e mais uma vez não consigo encontrar as palavras. Bem, seja em nome do quê, foi necessário alienar amigos, fomentar intrigas e acabar com amizades de infância para servir esse tal "fim". Só não bato palmas porque sabe o que mais? Não está aqui ninguém para escutá-las, e se estivesse ia ficar a perguntar "porquê". Já agora: a questão do anonimato foi algo que me custou bastante manter durante cinco anos, e se no início foi uma opção, chegou a um ponto em que passou  a ser um mal necessário. Se acha assim tanta piada, lamento não poder ensinar-lhe como se "brinca", mas posso adiantar que não é inventando um personagem, passar uma semana a ser o único a perguntar "quem será?" (quando aliás nunca enganou ninguém...) e depois revelar-se sem que ninguém tenha encomendado o sermão.

Quando valemos por aquilo que somos e os outros reconhecem-nos valor, é preciso não esquecer o essencial: foi por aquilo que somos que chegámos ali, e não pelo que não somos. Excuso-me de atirar com a velha máxima do sapateiro que quis tocar rabecão, pois não se trata aqui da presunção de alguém que quer dar um passo maior que a perna - nada disso. Trata-se de alguém que pretende ser o que não é, e tendo a plena liberdade para o fazer, também os outros a têm para se levantar da sala e sair. É o mundo do "show business", mon cher. Adoro o Ozzy Osbourne por cantar odes ao Senhor das Trevas, mas resolvesse ele dedicar-se de repente aos cânticos Marianos à Virgem de Fátima, e talvez eu já não lhe bateria palmas. E teria ele direito a ficar indignado com isso, sendo que eu não fico (de todo) indignado com o rumo que ele decidiu tomar?

O que está aqui é o que é, preto no branco, e para quem quiser reflectir e daí tirar as devidas ilacções. Se não for muito trabalho ler, e já agora do principio ao fim, sem fazer segundas leituras e sem se armar em rufia, que só lhe fica mal, permita-me que lhe diga. Não acredito que tenha "mudado" - está apenas atordoado com o "barulho das luzes" - mas os que o conhecem bem, esses pode ter a certeza que não mudaram, e estão atentos, têm dois olhos na cara e dois ouvidos ao fundo do pavilhão auricular, e não, lamento desiludi-lo, mas não ficaram embevecidos com a sua "grandeza", nem mais burros perante tamanho monumento...ao disparate. Semper fidelis.

Leocardo

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