sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Liberdades, parte II: liberdade académica


Na última quarta-feira no campus da Universidade de Macau (UMAC), na Ilha da Montanha, um grupo de estudantes exibiu uma faixa onde se liam palavras de apelo a uma maior liberdade académica e menos pressão sobre os docentes daquela instituição de ensino superior. Esta manifestação teve lugar durante a apresentação do campus aos novos alunos do ano lectivo 2015/16, e foi organizada pela Associação de Estudantes (SU ou "Student Union" na sigla em inglês) eleita em Outubro e totalmente composta por jovens com filiação na Associação do Novo Macau (NM). Ainda ontem Bill Chou, vice-presidente daquela associação assinou um artigo dedicado ao tema no jornal "Human Rights in China", uma publicação "online" assumidamente anti-Pequim, bilingue e com o apoio de uma organização com o mesmo nome e com representação em Nova Iorque e outra em Hong Kong. Podem ler aqui a versão em inglês do artigo do ex-professor de Ciência Política da UMAC.

Neste artigo Chou aproveitou para tecer novamente duras críticas à direcção da UMAC, especialmente o reitor Zhao Wei, que a julgar pela troca de palavras entre ambos durante o último Verão não teve o apoio que esperava da "cavalaria". Se há alguém que pode ter razões de queixa de alguma marcação cerrada feita pelos democratas é o actual reitor da UMAC, que já em 2011 tinha Jason Chao e seus pares à perna, como se pode ver por esta notícia de Setembro desse ano, onde um grupo de signatários pede contas mais transparentes no orçamento no campus da Ilha da Montanha. Não restando dúvidas de que a figura de Zhao Wei é contestada pelos democratas e muitos dos estudantes, nada abona a seu favor o facto de Alexis Tam, recentemente apontado como novo Secretário da tutela responsável pela educação, ter vindo hoje a público dizer que está "chocado" com os alegados casos de assédio sexual que têm vindo a lume nos últimos tempos. Tudo indica que mais cabeças vão rolar na UMAC, é tudo uma questão de tempo, e entre os candidatos estão não só o próprio Zhao Wei, incontornável "condenado por suspeição", mas ainda o deado da Faculdade de Administração, Wong Kin Wai, que segundo consta terá deixado quatro casos de assédio ocorrer durante o seu turno de vigia à caserna.

Agora vamos imaginar que estes casos de assédio sexual e até a certo ponto a própria indignação em nome da liberdade académica são as Ruínas de S. Paulo. Muito bem, de frente parece indesmentível que temos aqui um belíssimo monumento, e todos concordarão que vale a pena bater o pé por ele, e ai de quem disser o contrário. Agora vamos olhar por detrás da sedutora fachada, e talvez não seja um deleite para as vistas o que vamos encontrar. Esqueçam por um minuto esta conversa do "assédio sexual", pois se fosse realmente tão grave como querem fazer crer chamava-se a polícia - não se deixem deslumbrar pelas luzes psicadélicas e mantenham os olhos no chão onde pisam. Sabendo Zhao Wei que ia comprar uma guerra de que dificilmente sairia vencedor, porque raio ia ele despedir Bill Chou pelas razões que viria a alegar? Não era de ontem, nem do ano passado nem do outro antes que as ligações do académico com o NM eram conhecidas. E depois, se ele aproveitava o tempo das aulas para fazer "campanha", algo de que nem um pevide da abóbora da prova vimos sequer? Não são os alunos da UMAC maiores e vacinados para ter o bom senso de distinguir o certo do errado? São estudantes universitários ou atrasadinhos mentais? Agora olhem para isto:


Reparem no ar vidrado de resignação do reitor enquanto os estudantes exibem a faixa onde se lê o apelo ao "fim da repressão política". Parece que ignora por completo a humilhação de que está a ser vítima no seu próprio território, enquanto é notório um certo desconforto entre as restantes individualidades presentes naquela cerimónia. Esta foi uma mudança de 180º na forma como se lidou com a situação em relação ao incidente de 21 de Junho durante a cerimónia de graduação. Zhao parece ter atingido a real dimensão do problema: trata-se de uma questão política, e ele não é um político, mas um académico - o seu papel aqui é o de cordeiro para sacrifício. Bill Chou prometeu retaliar, não fosse o caracter que compõe o seu apelido parte do caracter que designa "vingança". Então afinal quem apertou o gatilho e viu o tiro sair-lhe pela culatra? Só dá mesmo para especular, mas para quem quiser prestar-se a esse exercício de adivinhação, convido a contar as "cabeças": recuem ao início do caso Bill Chou e vejam qual o personagem que está em falta, "misteriosamente" desaparecido.

E realmente isto mais parece uma novela, e é possível que o quase sempre infalível Arnaldo Gonçalves, esse Nostradamus da análise política, tenha sintonizado a sua bola de cristal no Canal +, onde viu o académico Eric Sautedé, e agradou-lhe mais o idioma francês, mais musical, e a perspectiva de fazer de cruzado e lutar contra o infiel. E Sautedé aparece por mais do que uma vez no texto de Bill Chou, que na sua longa dissertação vai tecendo o mais variado tipo de considerações, umas com que nos identificamos, e outras que só ele entende do que se trata. O que parece um facto difícil de refutar é o apoio que os alunos da UMAC parecem dar à sua associação, e de como as promessas vazias e a retórica já gasta da nomenclatura talvez tenha convencido os seus pais, mas já não diz muito às novas gerações. Aparentemente de pouco valeu mudar a "fábrica de talentos" do segundo sistema para um espaço mais próximo do primeiro. Vamos ver que carta tira o agora hiperactivo Alexis Tam da manga para manter o "status quo" e apaziguar os espíritos.

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