sexta-feira, 3 de junho de 2016

A "Mesquita" em cada um de nós


Alguém decorou uma data, mas não aprendeu nada: Portugal adquiriu independência...de Castela

Muito se tem dito e escrito sobre a construção de uma nova Mesquita na Mouraria, em Lisboa, um projecto que vai ser inteiramente financiado pela Câmara Municipal de Lisboa, e que ficar por qualquer coisa como 3 milhões de euros - uma bagatela. "Então paga tu!", estarão já a pensar alguns, convencidos de duas "verdades" tão sólidas quanto duras são as suas cabecinhas. E isto dando de barato que estas pessoas se tornaram num estalar de dedos especialistas em Gestão da Fazenda, ou que de um dia para o outro deixaram de se estar nas tintas para o uso e abuso (mais este, infelizmente) que é dado ao erário público, que como se sabe é consiste "nos impostos pagos pelos contribuintes", que para estas contas são "todos os portugueses". Não é totalmente verdade, nem uma coisa nem outra, mas para facilitar a discussão digamos que sim, que cada vez que um qualquer figurão do Estado atesta o depósito da sua viatura, é  menos uma refeição que faz um pobrezinho. Comovente, deveras.

Passando ao que interessa. Portanto os argumentos contra a construção da mesquita prendem-se sobretudo com contenção de custos "nestes tempos de crise", onde "existe uma elevada taxa de desemprego", e "há crianças a passar fome", enquanto "os sem abrigo dormem nas ruas". Os sem abrigo, como se sabe, nunca existiram, ou eram apenas conhecidos por "aqueles chungosos", e "deram à costa" o ano passado, juntamente com os milhares de migrantes oriundos de zonas de conflito. Entre estes estava uma maioria, mesmo que em número incerto, de refugiados de guerra, e cuja situação foi também o mote para dar o nome a este drama humanitário: "crise dos refugiados". Estes migrantes são na sua maioria originários de países periféricos ao próprio continente europeu, e não demónios fugidos das entranhas do Inferno, nem canibais das profundezas de África que se perderam no caminho de volta para a selva. E o que tem isto a ver com a construção da tal Mesquita?


Uma petição às (extremas) direitas

Para mim nada, mas talvez tenha para os autores e signatários desta petição que vem circulando há meses e conta com mais de cinco mil assinaturas virtuais - aqui sim, não se requer o fornecimento dos dados completos quanto à identidade dos signatários, por isso vale o que vale, que é muito pouco. E ainda bem, digo eu. É talvez devido à educação que tive, que me dotou do discernimento de que todos são iguais perante a lei, e que a sacrossanta democracia que nos distingue da barbárie implica que não se faça uso dos valores em que assenta apenas quando nos convém. Se forem espreitar os comentários vão encontrar com bastante frequência esta curiosa dialéctica, com a sua carga de paradoxal: "Portugal é um estado laico e por isso não tem que financiar Mesquita nenhuma" / "Portugal é um país de maioria cristã e como tal é preciso respeitar a nossa cultura". Sim senhor, este é um conceito pioneiro: todos para a pqp, menos eu e os meus. Claro que depois por uma questão de coerência cumprem assídua e rigorosamente os mandamentos da sua religião/cultura, e praticam o culto predominante, que não se coaduna com a existência de outro aparentemente "antípoda", certo? É o "praticas", que aí alto lá, que eu sou eu, menos na hora de correr daqui para fora com a mourama, que aí já somos "uma cultura". Mas então e eles, que diacho, que querem aqui mesquitas, "mas não permitem igrejas na Arábia Saudita!" - um argumento de que se socorrem amiúde, julgando-o pertinente e irrefutável. Claro que a Arábia Saudita é uma merda, e se forem procurar nos arquivos de 8 anos deste blogue, afirmo isso várias vezes. Então porque é que queremos seguir-lhes o exemplo? Ai eles depois impõem-nos o mesmo? Quantos são da Arábia Saudita, entre os refugiados, que até na hora de se erguer um local de culto levam com as culpas de tudo e mais alguma coisa?

E por falar em Arábia Saudita, um dos argumentos a favor da construção da Mesquita, perdão, um dos argumentos referidos por pessoas que não têm macaquinhos no sótão e não vêem mal nenhum naquilo, é exactamente o de não ser financiada pelo Wahidistas do reino saudita, que como se sabe são os responsáveis pelas mesquitas e madraças em algumas cidades europeias, e apontadas como responsáveis pela radicalização de jovens islâmicos, nomeadamente em Paris e Bruxelas. Julgo que seria fácil ao reino saudita "sacudir" uns cobres para construir uma mesquita em Lisboa, e como não seria financiada por "dinheiros públicos", então aí já não havia problema, não é, ó mui zelosos e poupados fiscais instantâneos da aplicação do erário público? Quer dizer, lá haver quem fizesse barulho, havia, mas dos três pontos enunciados na tal petição só poderiam alegar o terceiro. E no fundo é aquele que REALMENTE motivou toda a gente que a assinou. Deixem-se de tretas, que essa do "urbanismo" e não sei que mais não cola. Nem foram consultados quaisquer especialistas na matéria, nem ninguém me vai convencer de que uma mesquita estaria a destoar...na Mouraria. Sabem porque é que a Mouraria tem esse nome, não sabem? Nem é por acaso, e curiosamente sabem responder em que bairro de Lisboa nasceu o fado, a que tantos chamam "a alma do povo", do nosso povo? Não vou aprofundar mais esse ponto que não é o que está aqui em causa, mas essa dos "dinheiros públicos", desculpem lá que vos diga isto, até vos fica mal. E quem diria...


Que distraídos que nós andamos, ah? Não deve ser da idade...

...que até alguém supostamente inteligente e bem lido como o João Miguel Tavares, alinha neste tipo de chicana? Ora bem, antes que me acusem de fazer julgamentos precipitados, vamos analisar os pontos fortes da argumentação do JMT, começando por esse da "laicidade do Estado". Ai espera aí, aquilo é uma pergunta ou quê? Com a devida vénia ao "perguntador", permitam-me que responda: depende. De facto o Estado é laico, mas isso basicamente prende-se com a não-interferência de Estado e Igreja nos assuntos um do outro, mas longe de se poder dizer que a Igreja sai de alguma forma "injustiçada" com a construção de uma mesquita pelo Estado, enquanto se ela quiser construir igrejas, que se amanhe. E isto porque em Portugal a Igreja funciona como se de um Estado paralelo se tratasse. Sim, meus amigos, eu suspeito que a "desatenção" do cronista vai muito para lá "do passado dia 18", quando subitamente "reparou" que a CML ia construir uma Mesquita para oferecer à comunidade islâmica. Talvez não saiba e ainda vá a tempo de saber que existe um Documento que o Estado Português assinou com a Santa Sé há muito, mas mesmo muito tempo, quando ele ainda não era nascido e os portugueses tinham muito medo que "Deuxe e o Xexuze xe jangxem": a Concordata. Deixo aqui o "link" para a última revisão da mesma, mas quanto à parte que interessa para estas contas, reproduzo já e imediatamente o  artº 26º desse documento, onde podemos ficar a saber que a única "laicidade" que confere ao Estado é não ter lá um Cardeal Cerejeira qualquer a dizer ao Governo o que Deus aprova e desaprova:


A lei. Não gostam? Citando: "quem está mal, muda-se"

Beeem, o que para aqui vai. E viva o luxo - com que então a Mesquita "favorece o Islamismo em relação às outras religiões". E que tal aqueles brincalhões que arrotam aquelas barbaridades, do tipo "eu também quero que a Câmara me construa uma casa, oh oh oh", não pedem uma migalha do imenso património da Igreja? Coitadinhos...ah, é verdade, e olhem que isto já foi muito, mas muito pior (ou melhor, para quem acha uma maravilha pagar impostos e a Igreja não). Esta é a revisão de 2004, pois se forem ler a original de 1940, celebrada entre os esbirros do beato de Santa Comba Dão e um "spaghetti" de batina lá da Santa Sé, vão ver que começa logo com "Em nome da Santíssima Trindade". Se calhar o conteúdo foi ditado pelo Arcanjo Gabriel, o mesmo que ditou o Corão a Maomé, e antes havia anunciado a Maria que receberia a visita do Espírito Santo (o espírito propriamente dito, não o banco). Heresia? Entendam-se lá com o Gabriel, que eu só digo aquilo que toda a gente sabe, e se ignora é porque quer. Mas têm razão: a Igreja Católica e o Islão nada têm a ver uma com a outra, pelo menos em Portugal, e perante aquilo que apresentei acima. Uns detêm um património incalculável e ainda gozam de isenção fiscal - se calhar não precisam de pontes, pois caminham pela água - enquanto outros não podem ter 1 (uma) Mesquita. Ai podem, podem, desde "que paguem", persiste-se tenazmente nessa cantilena, julgando que se está aqui a ser "imparcial". O que foi, não gostam de viver em democracia? 


Lei da Liberdade Religiosa: foi Deus que mandou cumprir

Parece que não, caso contrário atenderiam ao princípio da igualdade constante da Lei da Liberdade Religiosa, legislada conforme o disposto na Constituição da República Portuguesa, no que toca à liberdade de escolha e prática de culto. Porque quer gostem ou mandem para trás, o Islão é uma confissão religiosa como qualquer outra, e está sujeita aos mesmos deveres e ao cumprimento da lei que as restantes. Como é na Arábia Saudita ou no Longistão não sei nem me interessa - onde é que vão construir a mesquita, mesmo? Ah bem. E que conversa é essa de "mais uma", há assim tantas? Mais que MiniPreços? Ou será que para estas contas também somos "Europa", e estão a incluir os "milhares" de mesquitas que existem na Bélgica?  (Juro que li isto algures). Não se armem em fresquinhos, que com esta palhaçada toda estão a subvalorizar direitos constitucionais que são de todos. Ai este "não é vosso"? E quando for um dos vossos, e que o Estado tem o dever de proporcionar,  e eu não considere isso uma aplicação útil dos MEUS impostos. Quanto é que custou a IC1, por exemplo, que eu não pedi para fazerem essa m...? "Ah Leocardo, a IC1 liga o Porto a Viana do Castelo, e é um troço importante que...". Importante para os gajos do Porto e Viana do Castelo, eles que o paguem, que "a maioria dos portugueses não é de Viana do Castelo". Estão a ver, que bonito? Mas os impostos são de alguém, agora? Santa Ignorância, que me leva a suspirar de alívio por ser agnóstico. Ah pois, mas uma vez que é ponto assente que aqui não há nada de "irregular" ou sequer "estranho", quanto é que isto vai custar aos contribuintes, ao ponto de levantar tanta celeuma? É isso que o JMT quer saber, também. Vamos já ver isso, mas primeiro...

...e com os "nossos" impostos?!?!

...gostaria de deixar isto à consideração dos mui "económicos" contribuintes. Este é uma notícia que dá conta da derrapagem orçamental do Centro Comercial de Belém (CCB), orçado em 1 milhão de euros, e que acabaria por custar 200 vezes mais - 200 milhões de euros, portanto duzentas vezes mais. "Derrapagem"? Chamai-lhe antes cataclismo. Mas pronto, aquilo deu imenso jeito não deu? Para acolher a presidência da UE em 1992, lembram-se? Deu-vos gozo presidir à UE, foi? Ah sim, a mesquita vai custar 3 milhões de euros. Pronto, digamos 5 ou 6 milhões, apesar de o orçamento anunciado ser de 3 milhões, efectivamente, mas assim ficamos com 1 (um) euro para cada contribuinte, quiçá menos. Não dava para pagar o parque de estacionamento do CCB, e até nem estou o incluir o facto deste ter custado 200 milhões em 1992, e não agora. Dava para umas 50 mesquitas, isto, e gostava de saber quantos artigos escreveu o JMT a este respeito - afinal ele "não tem nada contra a Mesquita", mas quer saber "quem paga", só isso. Mas alto lá, que o CCB é uma coisa "de todos", é ou não é? Que "todos podem usufruir", ui ui, que eu vou lá dia sim, dia não, e entre pagar um euro por uma mesquita ou 50 por isto, claro que pagavam os 50 de bom grado. Não iam era sair este fim-de-semana, se calhar, mas pronto, podiam sempre ir ao CCB esta noite ver o espectáculo da Vânia Conde, "Há Fado no Cais", e quando fossem chutar os 12 euros do bilhete, podiam alegar que "já pagaram o CCB", e que "é vosso". Assim pode ser que acabem metidos numa daquelas camisas sem mangas, sabem, ó zelosos contribuintes. Mau exemplo, foi?


Aguenta!

Estádio de Aveiro, construído para acolher 2 (dois) jogos do Euro 2004, e depois disso foi palco de cinco jogos da selecção, três amigáveis e dois de qualificação para competições internacionais, contra Lietchenstein e Albânia - epá, que luxo! Além disso realizaram-se seis finais da Supertaça, o que vale por dizer que foi posto ali para acolher um total de 13 jogos em 12 anos - pode-se dizer que é mais de um jogo por ano, ah? E tudo "apenas" por 62 milhões de euros, ou seja, umas vinte mesquitas, mais coisa menos coisa. Mas isto não "doeu" ao aflito contribuinte que agora teme o "vespeiro islâmico", não tivesse sido o idealizador desta maravilha o arquitecto Tomás Taveira. Aguenta!

Um euro, ou menos, é quanto a construção da nova mesquita vai custar a cada contribuinte. Eu não sei quanto é que o JMT ganha, nem me interessa saber, mas garantidamente será mais que um euro por hora, que terá sido o tempo que levou a tecer aquelas considerações estu...pendas, sobre como não está nada preocupado com a infiltração do Daesh na capital, ou como nada tem contra aquela confissão religiosa em particular. Eu finjo que acredito. Expropriações, essa coisa "horrível" que "expulsa" as pessoas das suas casas, que depois "são destruídas", e que é prática comum em todos os governos de todas as democracias de todo o mundo? É óbvio que os proprietários são ressarcidos, e ainda têm a possibilidade de negociar, mesmo quando o motivo de os fazer sair dali é "utilidade pública", e recusar nunca é uma das opções. Na China, quando foram feitas com o pretexto das obras para as Olimpíadas de 2008, aceitavam a primeira e única indemnização que lhes era proposta e já se podiam dizer cheios de sorte. Se protestassem só o faziam uma vez. Mas então qual é o VERDADEIRO problema, afinal?

...e assim se tenta "mudar o mundo". Não, obrigado

Estes são alguns dos argumentos usados pelos signatários contra a construção da mesquita. Como se pode ver, alguns motivos ali apresentados e que aqui tratei são "atirados" para a fogueira da argumentação um tanto à toa, e nota-se que os menos dotados de retórica vão logo directos ao assunto: é o tal ponto nº 3 que os aflige, e não impostos nem nada disso. Num dos comentários dos muitos que li na página do Facebook da tal petição, uma senhora diz que "assinaria, não fosse pelo ponto 3". Claro que não acredito nestas "boas intenções", e nem era necessário vocalizar tamanha asserção - bastava não assinar e pronto, sem precisar de apresentar esse atestado de "não-xenofobia" que ninguém pediu. Mas então quer dizer, será que os portugueses são de um modo geral xenófobos? Eu quero acreditar que não, pelo menos por aquilo que a minha percepção permitiu e me permite entender. Nasci e cresci em Portugal, foi lá que fiz a escolaridade até ao 12º ano, e  aqui em Macau tive contacto com outros portugueses de todas as regiões do país, e sempre me deu a sensação de que este tipo de discurso e de atitude merece a reprovação da generalidade. O que existe aqui é um misto de ignorância e orgulho; por um lado sabem que é errado assumir aquela posição quanto a este tema, e é evidente a exaltação quando alguém lhes aponta esse facto. Mas isto foi o que viram, o que sabem, o que lhes disseram: o Islão é inevitavelmente associado ao terrorismo, não estão para pensar muito no assunto, e muito menos admitem "lições" de nenhum tipo vindas de ninguém - não querem arriscar, e pronto. 

É um bocado como a lógica daquele senador republicano nos EUA, que sobre o acolhimento dos refugiados e o perigo do terrorismo islâmico usou a analogia dos amendoins: se tiver um saco com 500 amendoins, e sabe que 4 estão envenenados, deixaria os seus filhos comer? Eu pessoalmente faço para que os meus filhos, ou neste caso filho, tenha uma alimentação mais substancial que apenas amendoins, que são o pitéu predilecto dos chimpanzés e outros símios. Posto isto, penso que não vale a pena dizer o que penso do "boneco" pintado pelo tal senhor. Chamo a atenção para um dos comentários no quadro ali em cima, da autoria do Bruno M., que diz rejeitar quem "vê o mundo de maneira diferente". Acham isto normal? Tem alguma coisa a ver com religião, cultura ou costumes em geral? É um bocado perigoso pensar assim, mesmo que seja da boca para fora, ou não tenha sido essa a ideia que se quis transmitir. Mas a brincar, a brincar...


O mais patético é que provavelmente nem um nem o outro se chamam aquilo

...chegamos a isto que aqui vêem. "Para quem não sabe inglês" (onde é que eu li isto? hmmm...), o que está ali é o seguinte: na imagem de cima vemos alguém que é obviamente seguidor da religião islâmica, e uma legenda onde se lê "Este é o Achmed. Ele nasceu na Suécia, e por isso é sueco" . Em baixo vemos um ratinho e uma outra legenda que diz: "Este é o Pip. Ele nasceu num estábulo portanto é um cavalo". Ah ah ah! Que giro! E que respeito demonstram estes tipos por quem procura saber o que eles pensam ou defendem. Isto pode não ser exactamente verdade, e aposto que não é, vindo de quem vem, mas querem ver um cavalo a sério?


A galope, meninos

Pode ser que se sintam mais familiarizados com este cavalo, uma vez que é um "puro sangue", que ainda por cima viveu no século XIX - carrega consigo o valor da "tradição". Fora de brincadeiras, isto é a cama que vos estão a dar para fazer, e onde se podem ou não deitar. Hoje querem correr com os islâmicos, refugiados, etc., e tudo com um discurso de "Portugal para os portugueses", ou "querem não-sei-o-quê vão para a terra deles", e ainda "aqui comemos febras e bebemos cerveja" - penso que já sabem o que a casa gasta. Um dia após deixarem esta tropa fandanga à solta, arriscam-se a levar com um pontapé da mesma bota. Podem ter nascido em Portugal, e tal, assim como os vossos pais e até os vossos avós, mas se não tiverem um trombil parecido com o do Zé Povinho, "tchau", que ali é um estábulo, e vocês não passam de ratinhos. Para onde vão depois? Olha, para "a terra dos pretos", ou dos "monhés", ou dos "terroristas". Aquilo fica muito bem entregue, sim senhor.

Entre as pessoas que se dizem contra a construção da mesquita ou o acolhimento de refugiados há dois tipos que convém distinguir. Há aqueles que referi, que no fundo não passam de "vítimas", que mesmo não sendo completamente inocentes, foram bombardeados durante meses com informação, contra-informação, e todo um manancial de factos completamente novos para eles, e que não estavam de todo preparados para assimilar, tendo optado pela via mais fácil, e também a mais conservadora: não arriscar, fora com esses gajos. A tal informação aqui foi um pouco como as "cerejas", não porque tenha sido muita, mas porque foi seleccionada "a dedo", se é que entendem onde quero chegar. É claro que se todos, a maioria ou mesmo muitos islâmicos dos 1200 milhões que existem no mundo inteiro tivessem uma tendência para "rebentar e ir pelos ares", não seria com toda a certeza a religião em maior expansão (a única?) no mundo. Para entender melhor o que eu quero dizer, proponho o seguinte exercício:


Os "fanáticos portugueses"

Imaginem o que seria dos nossos emigrantes, na sua quase totalidade gente de bem, trabalhadora, honesta, amiga do seu amigo e de bom coração, decidindo e actuando sempre com o amor ao próximo como medida, se o Correio da Manhã fosse traduzido para as línguas dos países que os acolhem, e ali vendido. Na Alemanha, por exemplo, de certeza que não faltaria um nazi qualquer que se quisesse aproveitar destas "evidências" (todas na última semana, e há muito mais) para cumprir a sua pérfida agenda e angariar seguidores: "Hmmm...Fritz nein querrerr aqui ich Porrtuguesich...em lugarr chamada Montemorren-und-Velha terr menina que matarr suas pais e ein avolen, e depois matarr a prróprria. Em Portuguesich até ein hunde (cão) serr assassina de pequena kinderr, ja?". Sim, leram bem: um nazi qualquer, que seria o que vocês lhe chamariam também perante este cenário, aposto. 

E agora vamos um pouco mais longe: o Fritz, que sendo alemão é provável que seja protestante (seguidor do Luteranismo, para ser mais preciso) e não gosta nada, mas mesmo nada de católicos, nem de outra confissão qualquer. Agora imaginem que o gajo pegava na Bíblia, inventava um bocado aqui, citava fora de contexto acolá, e pimba!, andava por aí a espalhar por toda a Recklinghausen, e mesmo algumas partes de Oer-Erkenschwick que os católicos eram "todos assim", especialmente "os portugueses", e para provar o que dizia tinha a sua interpretação maluca da Bíblia que dizia que vocês eram tal e qual a mesma coisa que há milhares de anos, e ainda o "Korreien und Morgen", a cópia traduzida do CM, que era "prova para lá de qualquer dúvida" de que vocês lhe queriam limpar o sebo, e mais aos restantes loirinhos, e "substitui-los demograficamente". Em menos de nada tinham toda a gente a fazer-vos cara feia quando andassem na rua, e o prédio onde moram era referido como "no-go zone". Perante este cenário um tanto ou quanto fantasiado, mas com toda a certeza familiar, ainda iam sorrir e ser simpáticos com o Fritz e a restante cambada? E quando mais tarde os vossos filhos se viessem juntar a vocês, diziam maravilhas da comunidade, e que podiam ir brincar com as Hansen e Gretels sem que daí resultasse qualquer problema? E por falar em Católicos...


Acreditam no que diz, por exemplo, este imbecil, que o Papa "é um traidor", e que "está a vender" a cristandade, e "é cúmplice" numa conspiração absurda para "eliminar os cristãos da Europa e substitui-los por islâmicos". A sério? Então façam-se ouvir também na hora de mandar impropérios ao sacerdote da Igreja que Cristo fundou, e cujo discurso nada mais é senão aquele que se supõe ter sido o de Cristo, ele próprio: paz, amor e harmonia entre os povos. E é aqui que chegamos aos "outros", e vocês sabem que me refiro à extrema-direita e quejandos, cobardes que usam e abusam de uma retórica murcha e fora do prazo, e para mais nem coragem têm de juntar actos às palavras que repetem vezes e vezes sem conta. Estão à espera que vocês caiam nessa esparrela, e que façam vocês a limpeza dos papões que apoquentam aquelas cabecinhas destrambelhadas. E vale a pena discutir com alguém para quem as "no-go zones" que já referi ou os números mirabolantes que defendem ser os da "invasão" não carecem de qualquer prova que os suporte, mas cabe-nos antes provar que "não existem"? E soluções, apresentam algumas? Até agora só vi estas:


Deveras...

Sim, eu também acho que é inqualificável, o que estes comedores de porco alcoólicos andam a fazer com a pobre língua de Camões. Mas é isto: carne de porco para combater os invasores islâmicos,  recorrendo exactamente à mesma lógica do alho e dos vampiros, e as cruzadas. Sim, combata esta "civilização da Idade das Trevas" regressando também à idade das Trevas. Faz sentido. Já agora contraia o vírus HIV, que assim fica imune a assaltantes que ameaçam as suas vítimas com uma seringa infectada com esse vírus. Se ele está a fazer bluff? Ah! Problema dele: você não, e por isso o gajo está tramado! Entenderam? Alguns devem ter entendido muito bem. Foi só rebaixar-me ao mesmo nível e seguir a mesma lógica torpe, que para qualquer pessoa mentalmente sã e sóbria apresenta-se como um insulto à inteligência.

Estes tipos que se dizem "verdadeiros cristãos" vão ao ponto de rejeitar este Papa por ter apelado ao Ocidente que acolha os deslocados de guerra com a hospitalidade com que Cristo os receberia. Aquando da sua traição, o que pediu o Messias ao seu Pai do Céu? Que perdoasse os seus assassinos, ou que o vingasse? Foi só isto que o Papa pediu ao seu rebanho, sem "mas" de espécie alguma, sem distinguir entre quem merece menos ou quem merece mais, e sem ler os pensamentos ou as intenções de cada um, como estes "artistas" querem dar a entender que conseguem fazer. Pois, pois, isso é tudo muito bonito, caridade e tal, mas perante esta "invasão" fantasmagórica, a solução não é o amor entre os povos, mas montar-se num cavalo mascarado de farricoco empunhando uma lança, e confiando apenas em premonições e prováveis charlatanices delirantes escarrapachadas em livros escritos há mais de mil anos. Esqueçam todo o progresso, que mais um pouco e voltamos às cavernas. Ai não? "Vocês vão ver. Esperem e vão ver". Não esperem é que estes espertalhões mexam um dedo, ou tomem a iniciativa, nem que seja para dar o "bom exemplo" - isto no contexto da psicose que os aflige, claro. Vão vocês, que eles são demasiado "preciosos" para controlar as operações, e assim inverter esta temível "invasão".  E salta mais uma dose de pézinhos de coentrada para estes "inqualificáveis".

Não vos quero pedir para tomar nenhum partido, e longe de mim lançar qualquer desafio em forma de ultimato, mas peço apenas de considerem o seguinte: se estiverem numa situação em que careçam de auxílio - e seja o Diabo cego, surdo e mudo - a quem preferiam apelar, ao Padre Chico, ou aos chicos-espertos? 


Uhh...reparem naquela mensagem de apelo à "jihad"! Allah Akbar!

Como conclusão deste texto que já vai bem longo: a mesquita vai ser construída, com ou sem aquela petição "suspeita", e nada de "terrível" vai acontecer depois disso. Felizmente que apesar dos muitos defeitos, a nossa classe política tem ainda o bom senso de se abster de populismos, ou responder a provocações que lhes dariam razão de ser. Vai ser um templo, mais um, e quem vai lá serão sobretudo os ismaelitas, o ramo do Islão a que pertence a maioria dos muçulmanos no nosso país. A comunidade islâmica em Portugal é a mais pequena da Europa em número, tenho quase a certeza que nunca deram por ela, ou se o fizeram repararam certamente como é discreta, e no fundo não passam de pessoas como nós, que têm a sua vida para tratar, e ainda lhes pesa sobre os ombros a burrice alheia, de quem acredita que alguém pode ser "programado" por escrituras contendo ambiguidades, mas que infelizmente têm sido manipuladas por quem quer usá-las com fins que nada têm de positivo, e muito menos de "premonitório". Não é o Islão que é o problema, mas sim os criminosos, e estes podem agir em nome do que quer que seja, que não temos mais outra escolha senão confiar nas autoridades, e é a esses que têm o dever de zelar pela nossa segurança, que é a sua profissão. Não sejam ratos, e não vão atrás dos flautistas de Hamlin que vos tentam vender um traste com o pretexto de ser uma coisa nova. Afonso Henriques não levou a cabo a reconquista ao lado dos pobres e diminutos pastores da antiga Lusitânia. Recrutou mercenários com dinheiro dos usurários judeus, que pouco depois também tiveram a sua dose de "vontade de Deus". E foram ambos "repelidos" ou "convertidos" com sucesso? Balelas. Sempre estiveram ali, a paredes meias connosco, e porque não, desde que não levantassem ondas? E ainda acreditam que na origem de tudo isto está a religião, e que esta não passa apenas de um isco? 


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