terça-feira, 13 de agosto de 2013

Primeiro andar a contar vindo do céu


Quem observa a cidade de Macau de um ponto mais elevado apercebe-se da presença dos telhados de metal enferrujados que denunciam as inúmeras obras ilegais. Especialmente nos prédios mais antigos, a maioria com cinco andares, o proprietário do andar superior aproveita o acesso ao terraço para levantar quatro paredes tapadas com uma cobertura de zinco, ladrilhar o chão de cimento, e adaptar tudo com energia eléctrica e água canalizada e voilá, aí está mais uma moradia. Se esta prática era já comum há décadas, mais frequente se tornou desde o inflacionamento súbito no preço da habitação que se verificou desde 2005. Ocasionalmente (ou raramente) as Obras Públicas intervêm contra iniciativas desta natureza, no sentido de alterar a composição original do edifício, multam os infractores e obrigam-nos a restitui-lo ao seu estado original. A julgar pelo actual estado de coisas, pode-se dizer que na maior parte dos casos há alguém que olha para o lado e finge não ver.

Também em Pequim a especulação imobiliária leva a que o preço da habitação deite por terra os sonhos de muitos que querem adquirir moradia própria. Mas tudo depende de onde se pode chegar, ou do que nos deixam fazer, e até da largura das costas. Um residente da capital chinesa parece ter jogado com esta série de factores e ainda outros que não mencionei para realizar o seu sonho, e é um sonho bem excêntrico. Este personagem dotado de uma cara-de-pau maior que a do Pinóquio é proprietário de uma das fracções do último andar de um prédio no distrito pequinense de Haidan. Aproveitando o amplo espaço no terraço da "villa" de 26 andares, realizou o seu sonho de viver numa montanha, construíndo uma casa no topo de um monte de pedras rodeadas de arbustros, ao estilo das paisagens clássicas chinesas. Mais de mil metros quadrados de arquitectura bizarra, com varandas e vidraças azuis que se destacam, e é preciso ser ceguinho para não reparar na obra épica.

Dois dos vizinhos que partilham o último andar do prédio com este proprietário resolveram mudar de ares, temendo que o peso da estrutura suplementar faça ceder o telhado das suas moradias. Outros residentes queixam-se dos efeitos do mastodonte nas canalizações e nos pilares que sustentam a estrutura do edifício. O município de Pequim já publicaram anúncios deixando claro que a obra é ilegal - o que é pouco, dadas as circunstâncias. São comuns estas apropriações indevidas dos espaços comuns ou cujos direitos de utilização não estejam bem claros. Recentemente um empreiteiro numa cidade do centro do país construíu 25 condomínios ilegais no topo de um centro comercial. São ainda frequentes os casos em que se aproveita a ausência de um vizinho para se deslocar a parede que separa dois apartamentos para ampliar a área, à custa da parte ausente que nada pode fazer para impedir a usurpação. Até onde vai a luta pelo território na China?

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