quinta-feira, 8 de agosto de 2013

Não se deitam pérolas a porcos


Numa das poucas vezes em que os deputados da Assembleia Legislativa de Macau cumpriram a sua função fiscalizadora das políticas do Executivo num tom de agressividade, foi criticado o programa de habitação económica do Governo. E desta vez aos suspeitos do costume, os deputados do Novo Macau, juntaram-se outras vozes críticas, que consideram as habitações destinadas aos segmentos da população menos abastados de pobre qualidade, e pedem mesmo a revisão da lei. Na realidade o plano do Governo em resolver o problema da aquisição de habitação por famílias da classe média e média-baixa revela alguma indiferença. Em vez de se fazer bem, faz-se por fazer. Não queriam habitação económica? Aqui têm, querem mais o quê?

Os fogos construídos que agora tentam apaziguar as vozes que criticam o estado em que especulação imobiliária deixou o preço da habitação foram prometidos ainda durante o primeiro Executivo, e vêm sendo adiados desde então. Depois de anos a inflacionar os preços das fracções em dez vezes mais o que valiam em 2003, nalguns casos, lá foram os construtores-civis deitar mãos à obra, já de barriga cheia, para ver se estes gajos se calam com essa porra da "habitação económica". Muitas famílias aguardavam pacientemente pelas casas que podiam adquirir sem precisar de passar o pagamento das prestações para as gerações vindouras. Mesmo assim as 900 mil patacas ou o milhão redondo que se paga pelas moradias não está ao alcance de algumas famílias com menos recursos, que continuarão a viver dependendo do arrendamento, e em muitos casos partilhando o espaço com outras famílias na mesma situação.

Os resultados deixaram perplexos os mais optimistas, que acreditavam em padrões mínimos de habitabilidade, mesmo tratando-se de construção económica. As moradias revelam uma concepção desastrada, com dimensões reduzidas, design mediocre, mal pensadas em termos de acessibilidades, qualidade da construção duvidosa. Algumas das estruturas são bem demonstrativas do desleixo. Na Ilha Verde há apartamentos onde existem sete portas a separar a sala das restantes divisões da casa, e em Seac Pai Van as condutas de gás natural encontram-se já enferrujadas, mesmo antes das habitações que vão servir serem ocupadas. Seria cómico se não estivessemos aqui a falar de algo em que muitas famílias depositavam grandes expectativas, e que muitas delas terão que resignar a aceitar como seu lar.

Quando mudei recentemente para uma moradia de um andar, construída há cerca de um século, houve quem me perguntasse se eu não tinha medo que ruísse. Lógico que não, pois trata-se de uma construção datada do tempo em que as casas eram feitas para durar, erguidas com esmero e atenção ao detalhe, e com materiais da melhor qualidade para a época. Teria medo sim, se fosse morar para um desses edifícios recentes que desprezam critérios como a durabilidade e a segurança em nome do lucro fácil e rápido, cortando nas despesas em material e improvisando sempre que a oportunidade espreita. Buracos que se tapam com caixas de esforovite e garrafas de plástico em vez de tijolos, acabamentos feitos em cima do joelho, cimento "esticado" com a ajuda de cacos de vidro, areia e água, tudo feito em cima do joelho. Não recomendo que o façam, mas muita gente ia ter uma surpresa com o que ia encontrar se partisse uma parede do prédio com uma picareta. Quem deve estar sem perceber bem as queixas dos deputados e dos futuros ocupantes destas moradias económicas são os construtores. Afinal não foi isto que pediram? Pelo preço que vão pagar queriam o quê, suites presidenciais, salão de baile e casa-de-banho com "Jacuzzi"? Desculpem a sinceridade, mas num negócio como o imobiliário, não se deitam pérolas a porcos.

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