sexta-feira, 31 de outubro de 2014

A Ilha da Montanha pariu um debate



Às vezes fico a pensar o que seria se os bravos heróis que levaram a cabo a Revolução Francesa tivessem feito pausas para o almoço e para o lanche. Depois fico mais ou menos grato pelo regime totalitarista que viriam eventualmente a derrubar, que providenciou que não houvesse comida para o efeito, apesar dos broches da infanta Maria Antonieta, que dizem que eram de perder a cabeça. Os brioches, perdão, os brioches. Pois aqui em Macau onde comida é coisa que não falta e as revoluções são convocadas pelo Facebook, um Röhm-Putsch, ou "Noite das Facas Longas" pode ser facilmente convertida num piquenique. E por falar em facas, aquelas que Jason Chao e a rapaziada do Novo Macau andaram a afiar desde o dia 20, afinal são para um ensopado de borrego que a malta vai cozinhar este fim-de-semana prolongado para comemorar os finados. Quem pensou que a anunciada manifestação marcada para esta tarde no campus da Ilha da Montanha, em nome do afastamento do professor Bill Chou e um alegado caso de assédio sexual de um professor a uma aluna ia servir para destapar a tampa da cabeça calva do reitor Zhao Wei para ver se encontravam ali o diamante da liberdade académica e do respeito pela condição feminina, enganou-se. O que tivemos foi isto:



Depois de uma semana escaldante na UMAC, parece que os ânimos arrefeceram lá para segunda-feira, quando o presidente da Associação Novo Macau, Sulu Sou (ele que me desculpe, mas ainda tem muito que aprender na arte de apagar pistas ;) ) levantou esta página do Facebook a anunciar um evento que não seria tão "sumarento" como este anunciado por Sut Kam Leng uma semana antes. Uma semana foi também o tempo decorrido entre este artigo do Ponto Final, onde Jason Chao disse recear que “as autoridades façam algo para impedir a actividade”, acrescentando que "levaria o caso para tribunal", caso a manifestação não fosse aprovada. Nos dias que se seguiram foi uma autêntica "caça ao Zhao", com a revista Macau Concealers como batedor, mas ontem, dia 30, Jason Chao veio anunciar novamente no Ponto Final que afinal "só queriam conversar". Aparentemente as negociações estiveram ao nível da crise dos mísseis de Cuba em 1962, e a directora do Departamento de Comunicação da UMAC, Agnes Lam, participou também do "debate" - noutras palavras, foi fazer de "baby sitter". Quem disse que uma revolução não é um jantar de gala? Ah sim, foi Mao. Também ele se engana, aparentemente.



Mas quem disse que era um protesto? Bem, ouvimos Jason Chao a anunciá-lo a semana passada no Telejornal. E agora disse que era um debate, é isso? Mais ou menos, é "uma Assembleia", aparentemente foi um "erro de tradução". É que este 集會 (literalmente poder+grupo), presente quer no manifesto da putativa manifestação, quer depois no diluído debate tem um significado ambíguo; pode tanto querer dizer "assembleia", "reunião" ou "encontro", como pode ter o sentido de "comício" ou "manifestação", se bem que para estes a expressão mais correcta é 團結 - o primeiro caracter significa "grupo", e segundo "nó".Nós é que nos deixámos enganar pelos comentários inflamados no Facebook, assinados por elementos da brigada do guarda-chuva amarelo, ou pelos média, como este artigo do sítio InMedia Hong Kong, onde se podem ver documentação relativa ao processo que levou ao despedimento de Bill Chou, ou ainda este do All About Macau Media, do dia 22, que anuncia ondas de choque e terror na UMAC devido aos alegados casos de assédio sexual.



É por demais evidente que se deu uma mudança de 180º na estratégia do Novo Macau. A revista Macau Concealers passou uma semana a "cuspir fogo" em direcção à UMAC e ao seu reitor, e o director da publicação satirista Jason Chao moderou bastante o discurso durante estes últimos quatro dias. Não se sabe se foi por pressão das autoridades, um "furo" no plano, ou simplesmente um acordo de bastidores com a reitoria da UMAC, e aqui volto a fazer menção de Agnes Lam, que poderá ter uma grande parte a ver com esta transformação. Jason Chao pode artirar-nos areia para os olhos, ou demonstrar pouca coerência, mas está no seu território - é isso que todos os políticos fazem, no fundo. Não tem é de meter os pés pelas mãos tantas vezes: negou que sabia do protesto durante a cerimónia de graduação em Junho último no antigo Campus da UMAC, e desconhecia a autora do polémico cartaz, quando na verdade Tou Weng Kei é membro do Novo Macau pelo menos desde há um ano e meio e namorada de Choi Chi Chou, editor da Concealers e repórtes agredido na cerimónia; o alegado caso de assédio sexual ganhou mediatismo logo após a eleição para a Associação de Estudantes, saindo vencedora a lista 2, que levantou o problema que Jason Chao disse "aceitar apoiar", como se desconhecesse os elementos dessa lista, todos elementos do grupo dos pró-democratas, e agora isto. Parecem estar bem organizados, vão ganhando terreno, mas falta alguma experiência. Só isso.

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