sexta-feira, 5 de março de 2010

Entre as vistas


1) Miguel Senna Fernandes deu uma entrevista ao Hoje Macau, que se pode ler na edição impressa de hoje. À conversa com Hélder Fernando, o presidente da Associação dos Macaenses falou da sua grande paixão, o teatro, do papel da comunidade macaense, de política e muito mais. Uma entrevista que vale a pena ler.
Sobre o teatro, mais exactamente as récitas que todos os anos o grupo "Doçi Papiaçam di Macau" leva a cena, é onde MSF se sente como um peixe na água. Duvido que exista mais alguém que contribua para o teatro em Macau tanto quanto o MSF. Já quanto à elevação do patuá a património intangível da humanidade, o caso muda de figura. Eu sinceramente gostava de ver o patuá agraciado com esta honra pela UNESCO, mas realisticamente é bastante difícil. O linguajar macaísta, entre outras coisas que lhe chamam, não tem uma base de sustentação que lhe permita sobreviver. É mesmo pena. Quem fala patuá sem ser na brincadeira? MSF diz que "percebe tudo o que Adé escrevia". Eu também. Isto porque o patuá de Adé era erudito, poético, único. Foi Adé que passou o patuá para o papel, foi Adé o pioneiro das récitas que animavam as noites macaenses nos idos anos 60. Na verdade o patuá "bruto", o original, surgiu numa altura em que a taxa de alfabetização no território era bastante reduzida. Era uma espécie de português mal falado, misturado com algum cantonense e mais duas ou três palavras em malaio ou tagalog. À medida que os índices de alfabetização foram aumentados, eram dadas duas opções: aprender português ou chinês. A maioria dos macaenses optou pelo português, naturalmente. De quem é a culpa do desaparecimento deste tipo de crioulo (todos os crioulos têm como base a língua colonizadora) não sei, mas se calhar o patuá teria mais espaço de manobra se a língua portuguesa tivesse uma presença forte no território, tal como o francês no Haiti, o inglês nas Caraíbas ou o próprio português em Cabo Verde, locais onde o crioulo ficou fortemente enraízado. Mesmo assim neste particular desejo ao Miguel a maior sorte do mundo.
Em relação ao papel político da comunidade macaense, MSF diz que "o macaense é um diplomata por natureza", enquanto José Pereira Coutinho não representa a comunidade macaense porque "não é diplomata", e tem "um discurso fortemente reivindicativo". Ora ainda bem que aqui se separam as águas. MSF tem toda a razão, mas a razão que lhe assiste não produz os efeitos desejados. É que "política" e "diplomacia" são coisas distintas, e quando se opta pela via da diplomacia, liquidam-se as ambições políticas. Não é por acaso que as palavras "luta" e "política" andam normalmente de mãos dadas. Os eleitores macaenses que preferem a via da diplomacia não são em número suficiente para eleger um deputado, enquanto a base da ATFPM produz resultados na ordem dos 10 mil votos. E contra factos não há argumentos.
Finalmente quanto ao conceito do que é um macaense, uma frase de MSF deixou-me relativamente apreensivo: "Muitos [macaenses] não falam português, mas quem disse que a língua portuguesa tem de ser condição para se ser macaense, para sentir a identidade macaense?" Quando fala aqui de "identidade", penso que MSF refere-se à identidade cultural, e não apenas étnica. A língua é um elemento fundamental da identidade cultural, e a língua portuguesa sempre foi o que distinguiu os macaenses dos chineses de Macau. Sem língua, não há acesso à cultura, e sem cultura não há identidade cultural própria. O que é um macaense, afinal? Basta nascer em Macau, ter um nome português, sangue português e chinês, e comer chau-chau pele e tamarinho balichão? É mais do que isso, e se os macaenses optaram por fazer os seus filhos estudar chinês e prepararem-se para um futuro integrado na grande China onde prevalecerá a miscigenação, esta é uma opção como outra qualquer, uma opção realista. Chegou a altura de parar de tratar os macaenses como se fossem os khoikhoi de Macau, instalados numa reserva qualquer, vetados ao desaparecimento. A língua portuguesa foi, é, e sempre será uma característica única da comunidade macaense, e da sua identidade.

2) Também na edição de hoje do Hoje, a jornalista Vanessa Amaro tirou o retrato ao jornalista Jorge Vale, na secção "Perfil". Começa assim: "De pequeno era um 'safadinho', que adorava ir para o colo das amigas da mãe para apalpar-lhes as mamas". As quê? Se isto fosse comigo já tinham chovido comentários insultuosos e exigências de desculpas. O que aconteceu aos "peitos"? Ou aos "seios"? Mas..."as mamas"??? Mamma Mia!
Ficamos ainda a saber que Jorge Vale vai ser pai! Desde aqui os mais sinceros parabéns, e bem vindo ao clube. O Jorge ainda não sabe o nome que vai dar ao júnior, mas tem duas certezas, e uma delas é que a criança "vai ter nacionalidade macaense". Uma nacionalidade nova, portanto. Faltam poucos meses para a tão desejada independência de Macau.

23 comentários:

Anónimo disse...

Ao contrário do que muita gente pensa, "mama" não é calão. É uma palavra que faz parte do vocabulário padrão. Se têm dúvidas, veja-se o caso do cancro que ataca essa parte do corpo. Já alguém ouviu "cancro do seio"? Não, é "cancro da mama"!

PS: se o filho do Jorge vai fundar a nacionalidade macaense, talvez se devesse chamar Messias.

Leocardo disse...

"O meu pau" também não é calão. "Pau" é uma palavra que faz parte do vocabulário padrão. Além disso, diz-se "cancro da mama", não "cancro das mamas".

Cumprimentos.

Anónimo disse...

Sempre a falar do pau...

Anónimo disse...

O Leocardo, desde que se julga um entendido em língua portuguesa, só diz asneiras. Começou pelo telhado em vez dos alicerces, afirmando que "câmera" está correcto e que "mamas" está errado, quando primeiro devia aprender a diferença entre "há" e "à". Enfim, prioridades...

Leocardo disse...

Ó chouriçal, onde é que eu digo que mamas está "errado" ou não é uma palavra? Isto é o que dá ler o blogue mal sentado. E onde é que está o erro entre o "à" e o "há"? Esse lapso aconteceu praí uma vez ou duas e pimba! eles a dar-lhe na burra. Mas eu até compreendo, é genuinamente lusitano pegar num feito qualquer e eternizá-lo, mesmo quando já toda a gente o esqueceu. Aconselho-o também a comprar um dicionário decente, onde se pode ler que "câmera" e "câmara" são exactamente a mesma coisa.

Se calhar causa-lhe desconforto que eu tenha apontado que no jornal apareça um jovem profissional da comunidade lusa do território a ser citado nos seguintes modos: "apalpava as mamas das amigas da mãe". Mas olhe, o que está feito está feito, viva com isso, e se custa muito a engolir, para a próxima pensem duas vezes. Se quiser apresente queixa contra desconhecidos por difamação, só que depois faz figura de urso porque aquilo é o que está mesmo escrito no jornal. LOL

Pelo menos aqui no blogue dá para para apagar/emendar ;)

Beijocas do Leocas

Anónimo disse...

"O meu pau", "custa muito a engolir", "beijocas do Leocas"? Epá...Freud tem uma explicação para isso...

Anónimo disse...

Causa-me desconforto? Causou-lhe desconforto foi a si. Para mim, "apalpava as mamas das amigas da mãe" é uma extraordinária frase, pura e sem rodeios, e que abona em favor da jornalista, pela clareza, e em favor do Jorge Vale, que é de pequenino que se torce o pepino.

A confusão entre "há" e "à" não foi uma ou duas vezes, é recorrente. De três ou quatro vezes já falei eu, mais uma em que não o quis fazer devido ao teor da notícia (a morte de um português residente de Macau), mas faço-o agora (vá lá ver se não é verdade).

O Leocardo agora pensa que é o Ciberdúvidas de Macau, anda a substituir o Nuno Lima Bastos. Só que o Lima Bastos, mesmo que por vezes fosse lícito não concordar com ele, pelo menos ainda fundamentava as suas opiniões. O Leocardo nem isso.

Anónimo disse...

Eu dou uma ajuda: "O Humberto veio para Macau À cerca de trinta anos". Não terá sido HÁ cerca de trinta anos?

Anónimo disse...

Mamas ou seios, a frase foi em si infeliz e nada abona para um futuro pai de família....de um macaense. Ponto.




AA

Leocardo disse...

O AA percebeu muito bem onde eu quis chegar.

Admito o erro do "à" nesse post (fiz confusão com "acerca"), e penso que essa situação aconteceu mais uma vez e eu corrigi mais tarde. Mas daí a ser recorrente...

Não sou nenhum ciberdúvidas, mas "câmara" e "câmera" são a mesma coisa, estão ambas correctas, e essa é uma discussão fútil própria de quem prefere destruir em vez de discutir.

Cumprimentos.

Ala Ateísta do Bairro do Oriente disse...

"...nada abona para um futuro pai de família" (sic)

Pelo contrário, tudo abona. Se não gostasse de apalpar mamas é que a mulher tinha de se preocupar, que qualquer dia encontrava-o na cama com... outro. Depois de ler isto, vão-se confessar ao padre mais próximo porque, ao ler, pecaram.

Anónimo disse...

Ò meu amigo, penso que você tem uma visão diferente da coisa. Embora eu concorde em parte consigo, discordo com a felicidade do conteúdo. Eu cá quando me cruzar com o Jorge Vale na rua vou pensar "olha o tarado que quando era novo comia as mamas das amigas da mãe". Provavelmente quando o filho dele andar na escola, um colega de escola ainda lhe vai perguntar "é verdade que o teu pai apalpava as mamas das amigas da tua avó? O meu pai leu isso em um jornal há muito tempo".
Assim se pode destruir a imagem de um bom profissional...sim, o tal que "...apalpava as mamas das amigas da mãe..."


AA

Anónimo disse...

Ora bolas! O que eu rio com tanta parvalheira neste Bairro do Oriente. Meia-leca [vulgo leocardo]: tem juízo pá! Criticar o uso de "mamas" numa reportagem é tão cócó, mas tão cócó...
O artigo está bem escrito, rasgadinho, engraçado e ainda por cima dizem que quando encontrarem o Jorge Vale na rua vão-se lembrar do tarado que apalpava as mamas às amigas da mãe! Sabem que mais... Aahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahahaha. Esperem, não ri tudo. Ahahahahahaahahahahahahahahahahahahahahahahahaha.
Ok. Já está. Não. Ahahahahahahahahahahahahahahahahahaah. Pá... não consigo parar de rir.
Ofereçam uns livros da Anita ao Leocardo meia-leca. Ou da Heidi. Ou qualquer coisa parecida.
E peçam ao Chui para deportar jornalistas destes... jornalistas malcriados, pá!
E... Leocardo. LEOCAAAAAARDOOOOOO! Tás a ouvir? Continua a escrever pá. Não desanimes com os à e há e por aí fora. A gramática chora tanto contigo que já ninguém se chateia!
E um abraço ao Jorge Vale, afinal o moçoilo vai ser pai! E deixar de ser um taradão das mamas. Ahahahahahahahahahahahahahahahahahahahaha.

Grupo do 69

Anónimo disse...

Mas lá está o Leocardo, sempre com o pau na boca...

Anónimo disse...

O mais engraçado nem é essa das mamas. O que me parte todo é a "nacionalidade macaense".

Anónimo disse...

Eu sou macaense porque nasci em Macau assim como seria portuense se tivesse nascido no Porto ou alentejano se tivesse nascido no Alentejo, logo não concordo que o macaense tenha de ser assim uma espécie específica de pessoa, com uma cultura própria, uma língua (que nos querem fazer crer que é a portuguesa), etc.
Se for para o estrangeiro e se me perguntarem qual é a minha nacionalidade eu não vou obviamente dizer que sou macaense porque macaense nem sequer é uma nacionalidade, mas sim a naturalidade duma pessoa (como ser portuense ou alentejano, lá está). Sou português natural de Macau assim como existem portugueses que não nasceram em Portugal.
Muitas pessoas acreditam, no entanto, que o macaense é mesmo aquele ser especial que tem de ter aquela cultura própria e falar português. Já até cheguei a ouvir barbaridades do género um branco que nasce em Macau filho de pais brancos daqui de Portugal e que não saiba falar chinês não é, porque não pode ser, macaense. Se calhar deve ser alentejano ou portuense apesar de ter nascido em Macau...
Quanto ao patuá, não sei quantas pessoas é que o falam. Mas em Malaca, que pertence à Malásia e cuja língua oficial não é o português, como é do conhecimento de todos, o Kristang, assim se chama o crioulo derivado do português das pessoas de Malaca, uma comunidade luso-descendente de talvez umas 5000 pessoas, é considerada património nacional, bem como a própria comunidade em si. São luso-descendentes, alguns possivelmente até falam o português actual e são católicos (já sei que os ateus militantes vão-se passar com isso... mas é que na bandeira de Portugal estão as quinas, não aquele símbolo ateísta - e, imaginem, até D. Afonso Henriques profetizou bem...). Com o patuá de Macau não podia ser a mesma coisa? Fica a pergunta no ar.

Leocardo disse...

Finalmente! Um comentário sobre a questão de maior interesse no post. Obrigado.

Anónimo disse...

Sinceramente este post fez muito mais para denegrir a imagem do Jprge Vale do que a noticia em si. Quem é que se lembraria do artigo hoje, se não fosse por esta discussão absurda?

É evidente que já todos nos habituamos à escrita criativa dos jornais locais, e, tirando o ocasional brilhantismo das colunas editoriais e de opinião de alguns jornalistas que já tem muitos anos de Macau, como os actuais directores dos 3 diários, é normalissimo este deturpar das palavras dos entrevistados. Alias, pelo menos 3 amigos meus, por ocasiões distintas, queixaram-se do facto. Infelizmente é assim, o poder do jornalista é enorme, e acredito que esta escrita criativa não seja resultado de maldade, em si, mas de falta de tacto e competência. Eles existem em todas as áreas, os jornais não são excepção. Mas quem os regula?

Leocardo disse...

Denegrir? Lamento mas a sua escolha de palavras não é a mais apropriada. Eu não denegri nada. Se, como o senhor diz, as palavras do entrevistado foram deturpadas, isso é um problema que ele tem que resolver com o jornal. Eu limitei-me a falar do que li, e não estou a inventar nada.

Cumprimentos.

Anónimo disse...

"Quem é que se lembraria do artigo hoje, se não fosse por esta discussão absurda?"

E o post do Leocardo não saiu no mesmo dia do artigo do jornal, ou seja, anteontem? Eu fico parvo com o teor de alguns comentários. O outro disse...o outro pensa...e depois? Qualquer dia não podemos dizer nada de ninguém que nos cosem logo a boca.

Anónimo disse...

"Qualquer dia não podemos dizer nada de ninguém que nos cosem logo a boca".

Pois, o Jorge Vale que o diga, que por causa de uma simples palavra que até está consagrada no dicionário, tem os moralistazinhos todos atrás dele a quererem fazer-lhe um auto-de-fé.

Anónimo disse...

É incrível... Há pessoas que não têm mesmo nada que fazer. Comentários destes são mesmo para uma pessoa passar o tempo, ficando incrédula com o teor de alguns mas sempre com um sorriso esboçado no rosto com a ingenuídade e criancice de certos leitores.

Os meus cumprimentos ao Leocardo, que para além de nos pôr ao corrente do que se vai passando (não bem o caso deste post, mas...), pode-nos pôr sempre mais bem dispostos. Continue o bom trabalho!

Quanto ao Jorge Vale, nada tenho a dizer. E qual é o mal de dizer que "apalpava as mamas das amigas da mãe"? Disse o que pensava, da maneira que pensava. Para quê censurar? Já não tinhamos passado para uma fase mais democrática? Sinceramente... Juízo meus meninos.

Já lá vai o tempo que eu entrava em discuções com a "gentinha" que nem com expressões populares (de mais baixo nível), palavras mais vulgares ou erros escritos despropositadamente (que podem acontecer a QUALQUER UM!) perdoam...
Não ligue, não responda que nem vale a pena. "Gentinha" que só através do anonimato mostram que interiormente são bem mais feiinhas do que os outros julgam.
Perdi a paciência para tal desde o início do meu secundário (já lá vai..!)

Um abraço.

Macaense disse...

Eu li o artigo e achei muito bem esgalhado. Com ritmo e atraente para o leitor. Bem-vinda, Vanessa. Parece ter muito a dar ao sensaborão e institucionalizado jornalismo de Macau.

Não me parece que o retrato do Jorge tenha nada de que ele se deva envergonhar, pelo contrário.

Quanto ao resto, que dizer de homens que se ofendem com mamas?