quinta-feira, 7 de agosto de 2008

Afundação Oriente


Carlos Monjardino deu uma entrevista ao Diário Económico em que, como presidente da Fundação Oriente, dá a entender muito bem o que quer para o futuro da Escola Portuguesa de Macau. O que se pretende é que o Estado Português, responsável de 51% da EPM assuma de uma vez a inteira responsabilidade pelo projecto. A ideia foi bem recebida em Macau, tanto pelos responsáveis da Fundação Escola Portuguesa, como pela Associação de Pais, como por outras personalidades ligadas com a comunidade portuguesa do território: chegou a hora da FO assumir que quer sair. Há quem leia nas entrelinhas – mesmo algumas pessoas com quem falei sobre o assunto – que Monjardino pisca assim o olho a Stanley Ho, seu amigo de longa data, e maior interessado no terreno onde se encontra actualmente a EPM. A venda do terreno daria viabilidade financeira à mesma.

Isto do Oriente tem o que se lhe diga. Por um lado temos a FO que tanto deve ao território outrora sob administração portuguesa, e até recentemente inaugurou um Museu do Oriente, com espólio e temática ligados à região, que custou muitos milhões de Euros. Só o Bairro do Oriente não custa um avo, a não ser uma infima fracção da conta da luz e da internet. Algumas ideias apresentadas por Monjardino na sua entrevista vêm, por um lado confirmar o que já se suspeitava (a relação da FO com a EPM não é uma “história de amor”) e desiludir alguns mais crentes (afinal a língua portuguesa está mesmo aqui “a prazo”). O presidente da FO fala de maquiavélicas maquinações de alguns sectores do território para que “se deixe cair” a língua de Camões.

Ora bem, partindo do princípio de que ficou convencionado que a língua portuguesa seria uma das línguas oficiais da RAEM até 2049, a quem cabe a responsabilidade de investir na sua difusão e ensino? Quem fez esse compromisso? Será que os tais “alguns deputados” a que Monjardino se refere têm a obrigação de nos aturar? Aliás o próprio estado actual do IPOR que todos bem conhecemos e o sem número de novelas em que a própria escola se vê envolvida (instalações, situação contratual dos docentes, entre outras) não ajudam nada para que se sinta entusiasmo em procurar preservar a língua portuguesa num território que é, afinal, estrangeiro. Quanto à EPM em si, não me lembro de ter ouvido falar de tão urgente necessidade de se tornar uma escola internacional até muito recentemente. Ou seja, quando se começaram a fazer as tais contas de merceeiro, e não estando ali bem um “elefante branco”, estaria pelo menos um paquiderme mais reduzido. Vá lá, um hipópotamo.

Mas até concordo que se torne numa escola internacional, porque não? Até para que se torne mais uma opção no vasto leque de que existem no território. Para a população da RAEM, a EPM está inevitavelmente associada com “os portugueses”, e só tinhamos a ganhar se essa mentalidade fosse modificada. Mas quando Monjardino afirma que a escola “serve apenas portugueses expatriados e luso-descendentes”, dando a entender que vai havendo uma espécie de afunilamento que resulta na diminuição do número de alunos e que eventualmente se chegue a um ponto em que esse número nem será suficiente para que a escola funcione, sabe do que fala. Agora não foi nesse espírito que a EPM foi criada, se bem me lembro. Há dez anos quando apareceu no local consagrado à antiga Escola Comercial, era quase como que uma obrigação que existisse. Não faziam sentido todas as promessas de beijos e juras de amor eterno das duas potências que trataram da transição de Macau sem que tivessemos em Macau, como sempre houve, uma instituição de ensino completamente em português.

Quanto ao facto de que os pais "pagam propinas baixas", não sei se Monjardino se refere às propinas que se pagam com o subsídio da DSEJ para os residentes de Macau, que representam a maioria do total, mas para mim e para muitos outros que foram educados no ensino público e gratuito toda a vida, e daí não veio mal nenhum ao mundo, o que se paga até considero "justo". Quem tem mais de dois filhos a estudar pode até sentir uma grande diferença no orçamento familiar. A visão de Monjardino de que a escola serve para que os filhos e descendentes dos expatriados tenham acesso a uma educação em português para que depois sigam os seus estudos superiores em Portugal e que por lá fiquem (a teoria da escola como "rampa de lançamento"), é no meu entender redutora. Jovens há que prosseguiram os seus estudos fora do território (não necessariamente em Portugal) e regressaram ao território, outros ainda que continuaram os seus estudos em Macau, e ainda outros que entraram no mercado de trabalho após completar o ensino secundário. Podem não ser a maioria, mas bastavam meia dúzia para deitar esta teoria por terra.

Agora seja quem for que aí vier, e quer a escola seja internacional ou não, é preciso que se resolva o futuro, em vez de se especular sobre o não-futuro, que é o desaparecimento da EPM. Quando o deputado José Pereira Coutinho fala no crescente interesse pelo ensino do português, e de que há cada vez mais chineses interessados em tomar contacto com a nossa língua, é capaz de ter razão. E tem razão quando fala dos esforços de Macau para estreitar laços de cooperação com os países lusófonos. Aliás Macau tem feito mais no sentido da aproximação aos países lusófonos do que Portugal tem feito com Macau. Mas com guerras de bastidores e tricas mesquinhas não há capacidade para estruturar e desenvolver o seu ensino, a sua própria existência, que como já disse em tempos neste espaço, foi a maior herança que aqui deixámos. Com o pessimismo e o derrotismo patenteados na entrevista de Monjardino, não vamos lá.

Leia aqui a entrevista completa com Carlos Monjardino.

1 comentário:

Anónimo disse...

Mas onde raio vai o senhor da FO buscar a ideia repetida e matraqueada agora e depois e outra vez de que os chineses querem acabar com o português em Macau? Aos seus próprios desejos está visto. Só pode! Sem português acabava-se a fita da escola e mais os subsídios que não quer dar e...o mais importante é que o terreno ficava livre... e para quem? Pois é, ele lá sabe os compromissos que assumiu quando pensava que eram favas contadas, mas ficará mesmo? Essa ainda está para se ver!!!