segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Divórcio a la minuta


O presidente da República vetou a semana passada a nova lei do divórcio apresentada pela Assembleia da República, que simplifica os procedimentos e termina com o divórcio litigioso, com fundamento na desprotecção do cônjuge que se encontre em situação mais fraca. Vetou muitíssimo bem, na minha humilde opinião. Não porque considere o casamento uma “sagrada união”, e que “o que Deus uniu nenhum homem pode separar”. Nada disso. Refiro-me ao casamento no seu estado terreno e civil. Primeiro é um contrato, com carácter vinculativo, celebrado livremente por duas partes com vontades convergentes. Não faz sentido que se abandone o carácter sancionatório que a quebra desse mesmo contrato implica, como em qualquer outro tipo de contrato.

A jornalista Fernanda Câncio justifica o seu desacordo com o veto presidencial com o facto do Prof. Cavaco Silva estar “desligado da realidade”, e de que as mulheres hoje "não são parte fraca" de um matrimónio, e de que o PR insinua de um modo geral que são os homens que se querem divorciar. Quem me parece aqui desligado da realidade é a sra. Câncio. O presidente Cavaco Silva não caíu aqui de pára-quedas, e sabe do que fala. Portugal é uma sociedade de base patriarcal, onde as mulheres ainda ganham menos que os homens (um facto), estão em maioria nos números do trabalho precário (a par dos menores), e ainda há mulheres que não trabalham. Nem todas as mulheres (aliás, muito poucas) têm uma vida fabulosa como a sra. Câncio, que é independente, desempenha uma profissão liberal, passa férias fora de Portugal quando quer e faz o que muito bem lhe apetece.

Ninguém é obrigado a casar, e se o faz de ânimo leve, faz mal. Portugal não é um país do terceiro mundo em que se casa para se fugir à miséria. Também não é um país desenvolvido, como outros em que experiências deste tipo deram resultado. Estamos muito longe de ser uma Noruega, uma Suíça, ou mesmo uma Alemanha. As coisas boas não acontecem aos países maus ou medíocres, com níveis de desenvolvimento como os de Portugal. As comparações são perigosas. Esta lei pode levar a situações surrealistas do tipo "olha amor hoje conheci uma tipa gira no autocarro e quero o divórcio" ou "quero o jantar na mesa às oito, senão, divórcio". Parece quase uma piada, não? Um divórcio é sempre uma experiência desagradável, principalmente se existem filhos menores, e com a modalidade do divórcio litigioso, sempre se pensa duas vezes.

O Bloco de Esquerda já veio considerar o veto de "reaccionário". Para o BE de Francisco Louçã o casamento não faz sentido se uma das partes não quiser. O casamento é uma união, não uma vontade coincidente de dois indivíduos completamente autónomos. O BE devia perceber isto, pois no fundo é ele próprio um casamento entre três partidos diferentes. É curioso, irónico até, que o BE seja a favor do casamento dos homossexuais pelas mesmas razões que é a favor da lei do divórcio. Ou seja, os homossexuais têm direito a casar, e os heterossexuais têm direito a divorciar-se. No que é que ficamos?

4 comentários:

Anónimo disse...

“O casamento é uma união, não uma vontade coincidente de dois indivíduos completamente autónomos.” Não? Devo andar distraído...

Leocardo disse...

Aceito a crítica (o tom é que...enfim, nevermind), pois parece que me fiz entender mal. O que quis dizer foi que uma vez que há união passa a haver uma vontade, um objectivo comum, e não individual, de dois indivíduos.

Posto isto,

Cumprimentos

Anónimo disse...

O casamento é um contrato, portanto devia ser assinado por um ano, sendo sucessivamente renovado por iguais períodos caso não fosse denunciado por uma das partes com 90 dias de antecedência.

Mas o que importa aqui é que o senhor Silva anda a vetar muitas coisas. Acho que não foi isso que ele e o senhor Pinto de Sousa tinham combinado...

Leocardo disse...

Existem contratos vitalícios. Olhe, como o da concessão do terreno da Escola Portuguesa, por exemplo. Vitalício e gratuito, ainda por cima. E depois, o que aconteceu?

Cumprimentos