E aqui estou, de volta de umas retemperadoras férias, que como podem ter percebido, foram compostas de duas fases: uma nas Filipinas, outra na Tailândia. Enquanto não vos dou os detalhes das últimas aventuras (e prometo que se vão divertir), deixo-vos com
o artigo de quinta-feira passada (3 de Julho) do Hoje Macau. Fiquem atentos à temporada 2014/2015 do Bairro do Oriente, que arranca já amanhã.
Ir de férias, sair de Macau, desanuviar e ter contacto com a civilização a sério, com o mundo real, ou como alguém disse, “ver uma sociedade a funcionar realmente”, que perspectiva mais animadora. Só que enquanto a tecnologia não evolui ao ponto de nos dotar com os aparelhos de teletransporte com que a ficção científica nos excitou os sentidos, e não podemos passar do ponto A para o ponto B em segundos como o capitão Kirk e a restante tripulação do “Star Trek”, dependemos dessas cada vez mais lastimáveis companhias de aviação, recorrendo para tal a antros de degradação que dão pelo nome de aeroportos, onde existe uma linha ténue que os separa das estações ferroviárias que levavam os deportados até Auschwitz-Birkenau, Dachau ou Bergen-Belsen, ou outro local de má fama, com a pequena grande diferença de em vez de encontrarmos a morte, chegarmos à salvação. É como se para sair de Macau fosse preciso passar por uma espécie calvário, de Purgatório. Com que então a querer sair da terra-do-faz-de-conta, mortais? Pagai pelos vossos pecados!
As companhias aéreas parecerem piorar cada vez que me atrevo a recorrer aos seus serviços. Atrasos injustificados, apenas “porque sim”, serviço robotizado, com funcionários que repetem a mesma lenga-lenga, pilotos engalanados, com um uniforme a fazer lembrar os porteiros de alguns hotéis de luxo, e que nos trazem à memória o Carnaval a qualquer altura do ano, hospedeiras que nos servem com cara de plástico, e já que falamos de uniformes, quem é que se lembrou de vesti-las daquele jeito, tão conciso, tão informal que não deixa qualquer espaço à imaginação, todas com os mesmos sapatos pretos da praxe, cabelos pastosos, lábios besuntados de baton vermelho-choque (às vezes os dentes, também)? E perdoem-me a inconfidência, têm um ar de quem não toma banho faz um bom tempo. Deve ser das escalas, dos atrasos e tudo isso, coitadas.
Não sei se a culpa é apenas dos profissionais destas companhias, enfim, estamos aqui a falar de aparelhos grandes, que levam imensa gente, que dependem de factores como o tráfego aéreo, as condições meteorológicas, e há sempre o gajo que se atrasa enquanto espera que lhe assem o leitão no aeroporto de Cebu (confesso, mea culpa), mas mesmo assim há momentos em que revelam uma enorme falta de sensibilidade; um deles aconteceu mesmo agora comigo, em que mesmo sabendo que o voo se vai atrasar, enfiam mais de uma centena de pessoas numa sala de espera de um terminal qualquer sem condições nenhumas, e fazem-nas “secar” durante duas horas sem acesso a um bar, um café, um “duty-free” ou porra nenhuma – valha-nos o “wi-fi”, e esse mesmo ao fim de um tempo já não serve de consolo. Um cenário digno de um campo de refugiados de uma qualquer guerra horrível, com crianças a chorar, velhos a tossir e fumadores a ressacar. Ainda por cima só avisam do atraso quando têm a certeza que os pobres passageiros estão enclausurados e são tratados como gado. O pior é que se nos atrasamos e chegamos ao balcão do “check-in” cinco minutos depois deste ter fechado, arriscamo-nos a ficar em terra e ter de comprar outro bilhete, mas estes gajos atrasam-se quanto querem e sem dar cavaco a ninguém, que se lixe quem tem mais que fazer, e “azar” para quem está em trânsito e vai apanhar outro vôo que só para chatear sai a horas. E nós supostamente devemos levar isto “na desportiva”. Pelo menos chegamos vivos, não é assim? – se chegamos, e principalmente quando chegamos.
E agora olhemos para o aspecto económico da coisa, e começando pelo que é mais óbvio: viajar de avião custa os olhos da cara. Sim, especialmente atendendo à relação preço/qualidade, pois com o que pagamos, mesmo nas auto-denominadas companhias de baixo-custo, deviamos ter direito a um “bungalow” com hidromassagem, “chef” francês de “haute cuisine” privativo, dançarinas havaianas para os cavalheiros, e bailarinos cubanos para as senhoras, encarregues de nos tornar o percurso mais aprazível. Em vez disso somos enfiados num assento onde ficamos entalados durante horas a fio, com os joelhos quase a tocar-nos no rosto, e comida requentada que é consumida contra-gosto e de cotovelos ao alto. E ainda há companhias que se queixam dos “elevados custos”, anunciando que “estão à beira da falência” e tudo mais. Isto são tipos que se eu visse a pedir esmola na rua, ainda lhes cuspia na malga. Um raio que os parta.
Depois há a outra parte que torna a experiência de viajar de avião num martírio: os aeroportos. Para as novas gerações que se interrogam sobre os critérios erráticos dos seguranças dos aeroportos, ou quem são aqueles gajos que nos apalpam a namorada de alto a baixo para ter a certeza que não é uma voluntária do Hezbollah prestes a mandar centenas de infiéis para o galheiro, eis a resenha histórica: num belo dia de Setembro do ido ano de 2001, mais precisamente no dia 11 desse mês, um grupo de terroristas de meia-tigela sequestrou quatro aviões de uma companhia aérea americana da treta, e obrigou dois deles a espetarem-se em cheio contra as torres do World Trade Center em Nova Iorque, naquilo que foi considerado o maior atentado terrorista do século – até agora. Acontece que a maior nação do planeta, os polícias do mundo, ficaram de calças na mão quando meia dúzia de barbudos armados apenas de x-actos, sim x-actos, daqueles com que cortávamos as cartolinas nas aulas de Trabalhos Manuais, obrigaram os pilotos das suas companhias aéreas a cometer um massacre horrendo do qual resultaram cinco mil mortos, ou algo do género.
E portanto está explicado porque é que não podem levar para o avião um corta-unhas que seja, ou uma garrafa de água das pequenas, ou um tubo de creme hidratante: podem ser perigosíssimos explosivos líquidos, com os quais vocês podem levar a cabo o próximo golpe na civilização ocidental. Onde está escrito “Evian” ou “Nivea”, podia muito bem estar escrito “Jihad”. E quem determina o que se pode levar ou não no avião são uns rufias mal encarados, uns “bullies” da pior espécie, que se não fosse pelo tal 11 de Setembro, não arranjavam emprego nem a desentupir sarjetas. E estes, em parceria com os tipos porreiraços das companhias aéreas, transformam qualquer “viagem de duas horas” num enfado que pode levar um dia inteiro, aturando todas as espécies da camada mais baixa da raça humana. Que a evolução nos dê asas, pelo menos, para nos livrarmos de tudo isto.
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