quinta-feira, 17 de julho de 2014

A seriedade da brincadeira


Continua a dar que falar o "referendo" que a Associação Novo Macau Democrático quer organizar em finais de Agosto, consultando a população sobre o método de eleição do Chefe do Executivo. Este é actualmente eleito por um colégio eleitoral, que por sua vez é escolhido por elementos das associações (e nem são todas), o que reduz a participação da população a praticamente zero. Eu diria que ficavam apenas sentados a assistir, mas nem isso. Ao limpar o arquivo do blogue, dei com este artigo de 12 de Outubro de 2008, que dá conta de uma mini-sondagem realizada pela revista Macau Closer, onde se pergunta "quem gostava que fosse o próximo Chefe do Executivo". Faltava um ano para o fim do segundo mandato de Edmund Ho, e nessa altura Chui Sai On era apenas uma das muitas possibilidades, e ninguém arriscava uma previsão definitiva, até porque existia uma noção de que qualquer um viesse depois do primeiro CE, nunca lhe chegaria aos pés - e isto confirmou-se, não tanto por falta de opções, mas mais pela opção feita.

Não se ouviu um mosquito zunir aquando da iniciativa da Macau Closer, que por muito diferente que seja em matéria de "timing", conteúdo, importância ou impacto mediático (nós os portugueses e estrangeiros em geral podemos dizer praticamente tudo o que quisermos, que eles não ligam; isto é, desde que não estejamos na posição de docentes em instituições de ensino superior frequentadas por alunos locais), obedece à mesma lógica que leva as que todas estas individualidades se indignem. Não vejo como uma eventual violação da Lei Básica partindo do pressuposto de que o método para a eleição do Chefe do Executivo adquira um estatuto de "sacrossanto" e nunca possa ser questionado dependa da intensidade de como é efectuada; quer seja através de uma pesquisa realizada através de uma revista que só os "kwai-lous" lêem, ou através de uma urna improvisada onde se colocam boletins respondendo a duas ou três perguntas, a "ilegalidade" acaba por acontecer. Mas parece que o problema é mesmo o da quantidade, e não o da qualidade. O que mais preocupa o Executivo e os seus amigos e o Gabinete de Ligação é a eventual adesão massiva ao "referendo", o seu resultado, e a forma como compromete o sistema, deixando ficar mal esta RAE da RP China aos olhos do mundo.

No sítio dedicado ao "referendo", em www.macau2014.org , é possível saber quais são as moções que serão submitidas a voto, bem como quem pode participar, como pode fazê-lo, e de como serão apurados os resultados. Para dar um ar mais sério à brincadeira, inclui-se ainda uma referência à forma como serão tratados os dados pessoais. Eis o conteúdo (provisório) do boletim, bem como toda a restante informação a respeito desta consulta:

Consulta Pública sobre a Implementação do Referendo Civil 2014 sobre a Eleição do Chefe Executivo (português)
Em resposta á Eleição do Chefe Executivo que se realizará no dia 31 de Agosto de 2014, a Macau Consciência juntamente com a Juventude Dinâmica de Macau e a Sociedade Aberta de Macau irão formar a Comissão de Assuntos Eleitorais do Referendo Civil 2014 sobre a eleição do Chefe Executivo que tem como objectivo promover e organizar um referendo civil no sistema da eleição do Chefe Executivo e dos seus candidatos em 2014. Através da participação neste simulado referendo, os cidadãos poderão compreender melhor o sistema eleitoral e expressar as suas opiniões ao(s) candidato(s).

A Comissão vai lançar uma consulta pública acerca do projecto em que o referendo civil será feito nos fins de Agosto.
Os cidadãos interessados poderão dar as suas opiniões sobre este projecto até ao dia 19 de Julho de 2014 (sexta-feira).

Envie a sua opinião para o correio electrónico: macauce831@gmail.com

Moções:

Moção 1: Deverá o Chefe Executivo da RAEM ser eleito por sufrágio universal em 2019 ?
Opção A: Sim;
Opção B: Não;
Opção C: Abstenção

Cenário 1: Um único candidato a concorrer para chefe Executivo em 2014

Moção 2: Você tem confiança neste único candidato para a Eleição do Chefe Executivo de 2014 (XXXXXX) para ser Chefe Executivo ?
Opção A: Com confiança
Opção B: Sem confiança
Opção C: Abstenção

Cenário 2: Candidatos múltiplos a concorrer para chefe Executivo em 2014
Moção 2: Qual o candidato na Eleição do Chefe Executivo que você mais prefere que se torne em Chefe Executivo ?
Opção A: Nome do Candidato A
Opção B: Nome do Candidato B
Opção n+1: Abstenção

Elegibilidade dos votantes:

Proposta 1: Portadores do BIR da RAEM com idade de 18 anos ou superior
compatível com a idade mínima para o recenseamento eleitoral de Macau
Proposta 2: Portadores do BIR da RAEM com idade de 16 anos ou superior
de forma a encorajar maior participação da camada jovem
jovens com 16 anos poderão ter conhecimentos políticos suficientes para participar
tendência actual idêntica á do referendo da independência Escocesa que estipulou a idade mínima para 16 anos

Meios para votação:
Voto electrónico- votantes validados, com ligação á internet, dão voto através dos seus computadores ou telemóveis
Locais de voto abertos das 11:00 ás 21:00 nos dias 24 e 30 de Agosto (2 dias no total; 10 horas por dia).

Contagem dos votos:
Os votos serão contados no dia 31 de Agosto de 2014. A Comissão irá anunciar os resultados do Referendo Civil depois do anúncio oficial da Eleição do Chefe Executivo. Os votos efectuados nos locais de voto serão digitalizados e contados por computadores. As imagens de cada voto estarão disponíveis para download e verificação para quem tenha interesse.

Tratamento de dados pessoais:
O sistema só registará a informação necessária para garantir a singularidade dos votantes. Os números dos cartões de identificação serão convertidos numa cadeia de código de barras irreversível quando forem temporariamente armazenados no banco de dados do nosso servidor. Todos os dados pessoais serão eliminados permanentemente do sistema logo após os resultados do referendo serem finalizados.

Muito bem, isto tem mesmo um ar muito sério, apesar de se tratar de uma brincadeira, que como o Dr. Jorge Neto Valente referiu e muito bem, "não tem qualquer valor nem produz qualquer efeito jurídico". Então têm medo do quê? Não entendo como vai esta iniciativa "baralhar a opinião pública", uma vez que esta não vai votar na eleição para o Chefe do Executivo, e para esta consulta basta participar pela internet, quer em casa, quer pelo iPhone. Não há aqui o perigo de alguém ir votar numa pensando que está a votar na outra, a não ser que os tais 400 membros do colégio eleitoral sejam tão burros que façam essa confusão - e o deputado Fong Chi Keong não está incluído nos elementos desse colégio.

A polémica está para durar, e promete subir de tom nas próximas semanas, até que os boletins da eleição a brincar estejam disponíveis disponíveis "online". Agora fico um pouco preocupado: com quantos "apagões" nos vai brindar a CTM nessa semana?


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