segunda-feira, 6 de julho de 2009

Os nossos velhos


Sinto uma enorme tristeza quando penso nos velhos do nosso país. Não quero aqui falar das paupérimas condições em que se encontra a nossa Segurança Social, que permite que existam idosos que vivem com menos de 200 euros por mês, nem das decisões infelizes dos consecutivos governos ou dos próprios idosos, que nunca souberam acautelar a velhice, ao contrário de muitos outros povos da Europa que hoje se divertem em discotecas, cruzeiros e férias de luxo um pouco por esse mundo fora. Via no outro dia um documentário da RTPi que falava da solidão e da forma como os nosso velhos se arrastam durante o ocaso da vida.

A Dona Ivone, por exemplo, vive com uma TV a preto e branco. Tem filhos aqui e além, mas as únicas visitas que recebe é de uma associação de voluntários que lhe vem trazer comida e fazer companhia cerca de 30 minutos de dia. São centenas os velhos que esta associação existe, e não existem voluntários que tenham tempo para ouvir tudo o que os velhos têm para dizer. A sua companhi permanente é a de um piriquito, enjaulado, que tal como ela espera só e triste o último suspiro.

Noutra pequena reportagem, fiquei a conhecer a Dona Lucília, 87 anos, e o sr. Rodrigo, 94 anos. So casados há 60 anos, e estão condenados a definhar juntos. Ela mal pode andar, e ele é praticamente surdo. Vivem como podem, sem poder fazer quaisquer planos para o amanhã. A Dona Alice, 82 anos, vive num asilo, assim como muitos outros velhos. Chegou a viver alguns meses com um dos filhos, depois de uma intervenção cirúrgica que a deixou bastante debilitada. Um dia o cão tentou comer o pequeno-almoço do neto, e quando a D. Alice tentou impedir, foi mordida numa mão. Quando contou o incidente ao filho, este riu dela e insinuou que a mãe era demente.

São mil e uma histórias deste tipo que me deixam o coração destroçado. Quando foi que nos tornámos tão convencidos das nossas capacidades ou da nossa imortalidade que chegamos ao ponto de nos esquecer dos nossos ascendentes? Mais de 60% dos idosos em Portugal sofrem de solidão. Muitos são atirados nos tais asilos (não interessa se são muito bons ou caros, são asilos), nas camas dos hospitais, e ainda dizem com uma lágrima no canto do olho que "o filho não o visita porque não tem tempo, coitado".

Coitado. Provavelmente o tal filho, que recebeu o amor, o carinho e a educação deste idoso, dá mais atenção aos amigos, ao futebol na televisão ou ao rabo daquela flausina que trabalha lá no escritório. Chego a pensar como é possível que alguém consiga viver com a sua própria consciência sabendo que quem lhe deu a vida definha ou sofre de solidão, sentado ao lado do telefone, na vã esperança que um dos seus se lembre que ele existe. E na verdade são lembrados sim, no Natal e no seu aniversário, dois dias entre um ano, que conta com 365.

Mas os asilos e as camas do hospital estão lá, e vão continuar lá daqui a alguns anos. O exemplo da forma como tratamos os nossos velhos é passada para os nossos filhos, os mesmos que muitas vezes nos falta paciência para aturar. O avô "é chato", e o dia vai chegar quando nos tornamos nesse chato. Só nos safamos se a demência nos deixar e se tivermos uns patacos no banco. E mesmo assim ainda lhes deixamos escapar um "o raio do velho nunca mais morre". Isto é, para que um dia o possamos substituir, também. Quando foi que nos começou a faltar a paciência?

4 comentários:

Anónimo disse...

Assim sã Portugal.

Anónimo disse...

Sdr, pensei q se ia referir aos idosos daí...

Anónimo disse...

Discordo da sua opinião. A verdade é que apesar das boas intenções o ritmo da vida actual não se compadece muitas vezes com o acolher destes idosos. Para um casal que sai de manhã e entra à noite como pode acolher o idoso em sua casa se não tiver ninguém que dele tome conta? Não estará este mais sozinho nestas condições. Claro que os lares não são todas iguais, mas naqueles que são bons os idosos encontram pessoas da sua idade, há eventos organizados e inclusivé excursões e actividades temáticas que considero muito mais apelativas.
Quanto a telefonar só duas vezes por ano e não visitar realmente nisso tem razão e é indesculpável.

Anónimo disse...

Na cultura Chinesa os antepassados são a base da nossa existência. Os seus espiritos velam por nós diariamente.

Penso que é sinceramente uma questão de Cultura. o Mundo Ocidental cada vez mais actua em direção há liberdade individual. O que com todo o valor e respeito que dou a minha indepêndencia devo admitir que têm elevado o nivel de situações deste genero. Talvez um bocadinho menos de eu eu eu e mais de nos nos nos fosse o que todos neste planeta precisemos. Afinal o planeta e de todos e avida a sós e uma merda...Agora valha-me deus mencionar isto num jantar de Portugueses...Levo logo com comentários desagradaveis...