segunda-feira, 2 de março de 2009

A sorte ou a morte


O caso da prostituta encontrada morta na passada sexta-feira no Hotel Lisboa é apenas mais um nesse imenso mar de vício e degradação que é a prostituição. Uma reportagem nada simpática para a imagem de Macau publicada ontem no South China Morning Post dava conta que trabalham no território perto de quinhentas prostitutas mongóis, algumas em condições de semi-escravatura, entregues às máfias que lhes retiram a identificação e qualquer possibilidade de fugir. Um dos casos mais graves envolve uma jovem de 15 anos a quem cortaram a língua por ter tentado pedir ajuda através do telemóvel.

Todos sabemos perfeitamente o que se passa no primeiro andar do Hotel Lisboa. Entre a frutaria e o ta-pin lou encontram-se diariamente dezenas de prostitutas oriundas da China continental. Jogadores, casais, famílias inteiras ou simplesmente turistas que ali andam às compras sabem que são prostitutas. Jovens, altas e bem vestidas, deambulam pelo interior de um dos ex libris de Macau tentando partilhar a sorte com um jogador mais afortunado, ou aceitando qualquer tipo de cliente que pareça endinheirado. Quem não conheça o interior daquela grande obra de arquitectura e símbolo de Macau que é o Hotel Lisboa, fica surpreendido com a facilidade com que as prostitutas se passeam no meio dos transeuntes.

As prostituitas não são "parasitas da sociedade" que "não querem trabalhar". Não acredito que alguém queira vender o corpo para sobreviver ou suportar a família. Sujeitas a todo o tipo de agressão e violência, entrando nos quartos com estranhos, não surpreende que de vez em quando lhes caía em sorte um tresloucado ou um jogador compulsivo que tenha perdido todo o dinheiro e as queira roubar. São conhecidos ainda casos em que as prostitutas tentam enganar os clientes, ou providenciam um "serviço de má qualidade", mas nada é uma desculpa para o homicídio ou para a agressão gratuita. Além disso por muita razão que se tenha, nunca se bate numa senhora.

Numa cidade onde o jogo é legal e a agiotagem actua 24 horas por dia, é estranho que não se faça algo para regularizar a prostituição. A maioria das saunas nem uma sauna tem, e algumas casas de massagens e clubes nocturnos não passam de bordéis camuflados. Há alguém que lucra muito com tudo isto, e com a situação de ilegalidade em que a prostituição se encontra. Na zona do Porto Interior é possível encontrar várias pensões com duvidosas condições de higiene onde prostitutas "free-lancer" angariam clientela em plena rua, e a "moda" dos travestis filipinos chegou ao território o ano passado. Isto é sabido por grande parte da população, e tido como uma das "características de Macau".

Ao deixar a situação nos moldes em que está, nem Macau sai da malfadada lista do tráfico humano (confunde-se prostituição no seu geral com o tal tráfico de pessoas em particular), nem a população fica devidamente protegida de doenças sexualmente transmissíveis. Os paladinos da moral e dos bons costumes preferem virar as costas ao problema e condenar o "pecado", mas se existe cada vez mais oferta, é porque existe mais procura. Lógico. Não basta tapar os olhos e dizer que o problema não existe, nem basta às autoridades "mostrar serviço" enchendo uma carrinha de prostitutas de quando em vez e pensar-se que é meio caminho andado para acabar com a prostituição.

Não é demagogia nem um disparate pensar em criar um bairro "vermelho" em Macau, como os que existem em países com muito mais qualidade de vida. Não quer dizer com isto legalizar a mais velha profissão do mundo, nem apresentá-la como uma saída profissional, mas apenas um sítio onde fosse quem quisesse, o policiamento fosse feito discretamente de modo a oferecer segurança a clientes e "trabalhadoras", e onde o rastreio médico fosse uma realidade. A prostituição ou a sua solicitação não são "problemas" como a droga ou a corrupção, é uma realidade nos quatro cantos do mundo. Passa a ser um problema sim, se não for praticada com segurança e qualidade. Assim como está é que não.

2 comentários:

Gotícula disse...

É verdade, concordo perfeitamente! Não só é bom para a imagem de Macau, como para as famílias ´normais´ que vivem na cidade como para a segurança das raparigas e dos clientes. Só benefícios, há tanto tempo que já deveria ter sido feito!

Anónimo disse...

Alguns ate se casam com elas. Porque não começar por fazer isso???