terça-feira, 24 de março de 2009

O problema do inglês


Uma das razões das baixas qualificações da juventude de Macau é a aprendizagem da língua inglesa. Segundo a Associação de Educação de Macau, cerca de metade dos estudantes não conseguem entrar na Universidade devido ao fraco desempenho nas disciplinas de inglês. Ora aí está um assunto que me deixa uma ou duas palavras a dizer.

Quando cheguei a Macau, pensava que pelo menos uma grande parte da população falava português. Ingenuidade minha. Depois pensei que pelo menos a população mais jovem falaria inglês. Puro engano. É triste observar como numa cidade como Macau, que se quer moderna, a malta jovem não faça um pequeno esforço para aprender a língua mais falada no mundo.

E de quem é a culpa? A culpa aqui é da vontade. Os jovens começam a ser "massacrados" desde tenra idade com a aprendizagem do chinês (que não é fácil, afinal trata-se de memorizar milhares de caracteres), nunca se interessam por uma língua estrangeira (a não ser o mandarim, que não é uma língua estrangeira), e sinceramente, acham que não lhes serve de nada.

Alguns pais insistem que os filhos devem aprender inglês, mas também não ajudam muito. Deixam-nos entregues à sorte e por vezes exigem-lhes que aprendam. O inglês ou qualquer língua estrangeira não se consegue aprender só na escola. No caso do inglês não se aprende a língua a ver aqueles programas inarráveis da TV de Hong Kong, ou a ouvir música da cena canto-pop honconguense. Para que se aprenda uma língua é preciso que se goste pelo menos um pouco da cultura.

E ainda existe um certo preconceito de que o que é estrangeiro "é mau". Alguns chineses não querem ter nada a ver com estrangeiros, não lhes interessa conhecer estrangeiros, e se lhes apetecer viajar para um país onde se fala inglês, vão em tour com outros chineses. Não é racismo, como muita gente pensa. É só uma opção de vida como outra qualquer. Não os censuro que queiram manter a sua identidade num estado de preservação imaculado e cristalino. Qualquer povo que tenha uma língua ou cultura suficientemente importantes faria o mesmo.

Os que falam bem inglês estudaram na Inglaterra, Canadá, EUA ou Austrália, os que falam um inglês sofrível estudaram na secção inglesa de Santa Rosa de Lima ou no Sacred Heart. Existem dois ou três centros de língua em Macau onde se ensina inglês, com o objectivo de preparar os estudantes para estudar "lá fora". Escusado será dizer que se preocupam muito mais com as comissões que ganham das universidades estrangeiras do que com o ensino da língua propriamente dito.

Chega depois uma altura em que se arrependem de não ter investido um pouco mais neles próprios, e mesmo os que acham que o inglês "não serve para nada" chegam à conclusão que se calhar a aprendizagem lhes teria aberto muitas portas neste mundo globalizado. Nunca é tarde para aprender, nem acredito naquela máxima do "burro velho não aprende línguas". É só mais um pouco de vontade, e já agora uma maior abertura das mentalidades.

3 comentários:

Paulo39 disse...

A minha opinião em relação a isto é a de que o Inglês é uma língua muito simples, e que qualquer pessoa pode aprende-la, bastando para isso ter realmente vontade (ou necessidade) de a aprender. Portanto, eu acho que se deve incentivar a aprendizagem (por ser uma língua tão importante actualmente), mas não concordo que isso seja fulcral. A seu tempo, se assim for necessário, a pessoa irá aprende-lo. No meu caso, sempre fui mau aluno a inglês, tirava sempre positivas à "rasquinha", e na oralidade era ainda bem pior. No entanto, de há uns 3 anos para cá, comecei a ter computador e acesso à internet em casa, comecei a interessar-me por informática, e aprendi inglês rapidamente, para pesquisar e entender a informação que existe na web (maioritariamente em inglês, como se sabe). Embora continue mau a falar, percebo praticamente tudo o que leio e escrevo bem também.

Leocardo disse...

Uma questão que não aprofundei foi a das diferenças entre as línguas. A articulação, a pronúncia dos "erre", etc. Fica para outra altura.

Cumprimentos.

Anónimo disse...

Uma excelente análise do Leocardo. Não é preciso estar muito tempo em Macau para perceber que este problema é apenas um problema de mentalidade. É também um problema de disciplina (refiro-me ao péssimo comportamento dos alunos, pelo menos nas escolas públicas), mas esse afecta a aprendizagem em todas as disciplinas. No caso das línguas estrangeiras, acresce o referido desinteresse dos alunos, que não conseguem perceber a importância das mesmas.

Acho que a cultura não tem tanto a ver com isto, a falta de cultura e de educação é que têm. Os chineses educados não nutrem este desinteresse (e mesmo falta de respeito) pelas outras línguas. Da mesma forma que não andam a escarrar para o chão nem a arrotar em público. No entanto, a maioria desses chineses educados respeita a sua cultura naquilo que ela tem de bom. Sabem distinguir a verdadeira cultura da falta de educação. Da mesma maneira, sabem que aprender línguas estrangeiras é uma mais-valia que não põe a sua língua chinesa em causa.

Parece-me que não é preciso ser sociólogo nem algo do género para tirar as devidas conclusões: o problema de muitos chineses de Macau é que atingiram um nível económico muito superior ao seu nível educacional ou cultural. E o pior é que o mesmo está a acontecer em muitas outras partes do mundo. E isso cria uma arrogância que dantes era impensável, porque nem sequer conseguem ver que continuam a ser os mesmos tacanhos de antes, só que agora são tacanhos com acesso ao bem-estar material e com arrogância que baste. São sobretudo esses (infelizmente, a maioria) que não querem aprender línguas. Felizmente ainda há muitas excepções: os tais que até sabem mais caracteres chineses do que os outros, mas que mesmo assim ainda lhes sobra espaço no cérebro para o resto.