Ozzy em 1980, depois dos Sabbath, com o seu novo protegido, o malogrado Randy Rhoads.
Já falei duas vezes aqui de Ozzy Osbourne a respeito de outros temas, mas chegou a altura de dedicar um capítulo desta rubrica àquele que é, sem sombra de dúvida, um dos monstros sagrados do "rock" dos últimos 50 anos. John Michael Osbourne nasceu em 1948 em Birmingham, o quarto de seis filhos de um casal de operários. Foi ainda na escola que ganhou o nome de "Ozzy", mas diagnosticado com dislexia e outros problemas de aprendizagem desde pequeno, deixou os estudos aos 15 anos, e trabalhou como servente na construção civil, aprendiz de canalizador, afinador de buzinas de automóvel e ajudante num talho. Tentou sem sucesso uma carreira no crime, tendo sido apanhado a roubar uma loja de roupa. Sem dinheiro para pagar a fiança, passou seis semanas na prisão de Winson Green, onde fez a sua primeira tatuagem: o nome "Ozzy" na frente dos dedos da mão direita. Grande fã dos Beatles, decidiu que queria ser cantor quando tinha 14 anos e ouviu na rádio "She Loves You", um dos primeiros êxitos dos "fab four" de Liverpool. Em finais de 1967 formou como amigo Geezer Butler os Rare Breed, que mais tarde se juntariam a Tonny Iommi e Billy Ward, ex-elementos dos Mythology, e formaria os Black Sabbath, um nome inspirado num filme de terror de 1963 com o mesmo nome, que contava com Boris Karloff no papel principal. Ozzy e os Sabbath gozariam de um enorme sucesso durante grande parte dos anos 70, sendo uns dos pioneiros do género "dark metal", mas problemas com o álcool e com as drogas começaram a causar-lhe problemas com os restantes elementos da banda, que despedem o vocalista em 1979.
Consciente do seu potencial, Don Arden, proprietário da Jet Records, assina em 1980 um contrato com Ozzy para gravar o seu primeiro disco a solo, e para isso contrata uma secção rítmica que o acompanhe no projecto. Um dos músicos contratados para trabalhar com Ozzy foi Randy Rhoads, ex-guitarrista dos Quiet Riot, e ambos fariam uma parceria única, que viria a ser tragicamente encurtada. O disco é gravado em menos de um mês e lançado em Setembro de 1980 com o nome "Blizzard of Ozz", um título que Ozzy já vinha pensando há dois anos. A estreia não podia ser melhor, com um êxito estrondoso e seis milhões de cópias vendidas, quatro milhões apenas nos Estados Unidos. Do álbumi saíram apenas dois singles: "Crazy Train" e "Mr. Crowley", este último inspirado no místico fundador da filosofia telemética, Aleister Crowley. Outros temas fortes são "I Don't Know", a primeira faixa do disco, "Goodbye to Romance", uma linda balada, ou "Revelation (Mother Earth)" que dá a oportunidade a Rhoads de fazer um solo de guitarra arrepiiante.
O tema mais polémico foi no entanto "Suicide Solution", que valeria a Ozzy um processo judicial em 1986. A canção é sobre ps malefícios de alcoolismo ("solução" é aqui no sentido de solução líquida, mistura), e foi inspirada pela morte de Bon Scott, vocalista dos AC/DC, que no início havia morrido de hipotermia, depois de ter passado a noite a beber. No entanto os pais do jovem John McCollum, encontrado morto no seu quarto depois de ter estado a ouvir o tema, tiveram uma opinião diferente, e processaram o cantor por "incitamento ao suicídio através de mensagens subliminares". A certo ponto na canção ouve-se Ozzy a balbuciar palavras que foram entendidas como "Why Try?/Get a Gun and Shoot/Shoot, Shoot, Shoot" (para quê tentar? arranja uma arma e dispara). Ozzy acabaria por ganhar o processo, o que viria a ser tido como uma vitória da liberdade de expressão. Ironicamente o próprio cantor era alcoólico quando escreveu o tema.
Em Novembro de 1981 sai o segundo de originais de Ozzy, em parceria com a sua nova "estrela da sorte", Randy Rhoads. O título no novo trabalho de originais é "Diary of a Madman, que tal como "Black Sabbath", é o título de um filme de terror de 1963, este com Vincent Price no papel principal, e inspirado num conto do escritor russo do século XIX, Nicolai Gogol. Este novo registo não tem o mesmo impacto de "Blizzard of Ozz", mas mesmo assim vende mais de três milhões de cópia, e é certificado com tripla platina nos Estados Unidos. De "Diary of a Madman" saem os singles "Flying High Again" (nº 16 no Reino Unido e nº 2 do top U.S. Rock Tracks), mais um hino às drogas e ao seu consumo, "Over the Mountain" (nº 38 da Billboard), e "You Can't Kill Rock'n'Roll".
Deixou a editora, mas levou consigo a "miúda".
O ano de 1982 é determinante para Ozzy pelos melhores e pelos piores motivos. Em Março dá-se a tragédia, com Randy Rhoads a morrer num acidente de aviação, quando o avião particular que o levava da Florida até Nova Iorque, onde tinha um concerto com Ozzy se despenhou. Mais tarde a autópsia revelou a presença de cocaína na urina do piloto - Rhoads tinha 25 anos. Ainda nesse ano ano Ozzy termina o contrato com a Jet, mas como estava estabelecido que gravasse três albums com a editora, lançou "Speak of the Devil", um registo ao vivo gravado no Ritz em 1981. Ozzy sempre desprezou o album, tratando-o como "mera obrigação contratual". O cantor vira as costas à editora mas "salva a miúda" - em finais de 1982 casa com Sharon, a filha do dono da Jet, Don Arden. Sharon, a sua segunda e última mulher (pelo menos assim tudo indica que seja) tornou-se também a sua agente.
Em 1983 sai um novo álbum, com um novo guitarrista: Jack E. Lee. "Bark at the Moon" volta a ultrapassar a barreira dos três milhões de discos vendidos nos Estados Unidos, e daqui saem os singles "Bark at the Moon" e este "So Tired". É nesta altura que o abuso de álcool e drogas começa a deixar Ozzy fora de controlo; dá-se o famoso incidente onde arranca a cabeça de um morcego vivo que alguém atirou para o palco durante um concerto, que se tornou uma espécie de imagem de marca, é detido por urinar no Mnmumento aos heróis de Guerra no Alamo, Texas, e depois em Berlim por ter feito uma saudação nazista. É aqui que Sharon entra, garantindo que Ozzy ia passar apenas a "beber socialmente" - posto isto, interna-o numa clínica de desintoxicação.
Foram os complicados os meados da década de 80; saído da clínica Betty Ford, é atacado por tele-evaangelistas, que o acusam de ser "o Diabo". Vem o processo judicial trazido pelo suicídio de de McCollum, e por incrível que pareça tudo isto lhe dá uma publicidade positiva. O seu próximo trabalho de originais, "The Ultimate Sin", de 1986, chega a nº 6 do top da Billboard, e vende mais de dois milhões de cópias nos Estados Unidos, e o seu "hit-single" de apresentação do álbum, "Shot in the Dark", marca a estreia no top-100 de singles, chegando ao nº 68. É nesta altura que Ozzu ganha o cognome de "Príncipe das Trevas" - desagradável quando se tem que ir às reuniões da escolar dos miúdos, mas bastante agradável quando se vai ao banco verificar o saldo da conta.
Em 1987 sai finalmente o album ao vivo de tributo a Randy Rhoads, e em 88 o novo trabalho de originais "No Rest for the Wicked", e "same story": vendas na ordem dos milhões, dupla-platina, etc., etc. O disco contei o single "Miracle Man", de que já aqui falei, onde Ozzy atira farpas ao tele-evangelista Jimmy Swaggart, que havia recentemente sido apanhado no meio de um escândalo sexual. Outros singles deste novo trabalho, que contou com o guitarrista Zakk Wylde no lugar de Lee, que havia saído depois de "The Ultimate Sin", foram "Crazy Babies" e "Breakin' the Rules". Ainda em 1988 participa num dueto com Lita Ford, "Close my Eyes Forever", que se torna no single de maior sucesso da ex-vocalista dos The Runaways, atingindo o nº 8 da Billboard.
Chega a década de 90, e o EP "Just Say Ozzy", anunciando o novo disco de originais que sairia no ano seguinte, "No More Tears". São vários os temas fortes deste registo, desde "Mr. Tinkertrain", "I Don't Want to Change the World", "No More Tears" ou "Momma I'm Coming Home", mas um que reflecte bem aquilo que foi a vida e a carreira de Ozzy é este "Road to Nowhere". Nesta altura o cantor planeava retirar-se do "show business" para se dedicar à família, e a tournée que apresentou a seguir tinham por nome "No More Tours" - dizia tudo. No entanto Ozzy ainda tinha muito, mas mesmo muito para dar ao "rock". Se não foi com o Diabo que fez um pacto, como diziam as más línguas, terá sido com os deuses do rock'n'roll.
E depois foi o que se sabe. Em 1995 sai "Ozzmosis", talvez o seu melhor trabalho a solo, com uma produção exemplar e um alinhamento brilhante, a juntar à participação de músicos de letristas de elevado calibre (Richie Valence, por exemplo). Depois disso foram mais três álbums de originais, muitas colectâneas, reedições, edições especiais de aniversário, raridades, e até um album de "covers", onde aproveitou para homenagear um dos seus ídolos de infância, John Lennon, gravando versões dos temas "Working Class Hero", do trabalho a solo de Lennon, e "In My Life", um original dos Beatles, que veio acompanhado deste lindíssimo videoclip.
Ozzy, actualmente, ao lado dos Osbournes.
Quem não gosta de "hard-rock" em geral ou de Ozzy em particular, teve no início da década de 2000 a oportunidade de seguir o dia-a-dia de uma família que era tudo menos normal, no "reality show" The Osbournes, que foi um surpreendente mega-êxito televisivo. Ozzy continua a encher salas de concerto, tem um festival completamente dedicado a si, o "Ozzfest", e é como uma espécie de padrinho para todos os aspirantes a morder cabeças de morcego. A sua mulher Sharon é ela própria uma figura pública, como empresária e júri de concursos de talentos com audiências que falam por si, e recentemente os Black Sabbath voltaram a juntar-se para gravar "13", o primeiro com Ozzy nas vozes em mais de 30 anos. Com quase meio século de carreira, Ozzy Osbourne é o exemplo do "Self-made man" musical, transversal a várias gerações, e com quase 70 anos (66, actualmente) é ainda um gajo que "rocka" mesmo a valer. E foi este o jovem a quem um dia o pai previu como futuro: "ou a prisão, ou algo de muito especial". E foi mesmo assim.
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