domingo, 20 de abril de 2014

Os sons dos 80: João Ribas


Já se passou quase um mês desde a morte de João Ribas, mas nunca é tarde para homenagear aquele que foi um dos heróis do "rock" nacional. Sediado pelas bandas de Alvalade, em Lisboa, onde era uma espécie de "atração", era ali que romavam os fãs do "punk" nacional, que ambicionavam conhecer o seu "guru". Era "um gajo porreiro", diz quem o conhecia, apesar do aspecto um tanto ou quanto intimidatório - a roupa preta, o cabelo desgrenhado que parecia querer escapar pelos lados do boné, o blusão de cabedal, as calças coçadas, a barba por fazer, "um marginal", diriam os mais implacáveis. O pesadelo de qualquer sogro.


Um apaixonado do "punk", que cresceu a escutar, deixava preocupados os pais, que queriam que ele "tivesse juizinho", mas logo que completou os 18 anos, idade para poder mandar qualquer um à fava caso fosse preciso, fundou os Ku de Judas com os amigos João Pedro Almendra e Serpinha - estávamos no ano 1983. Não foi pelo dinheiro ou pela fama que Ribas e os amigos andavam por aí pelos palcos mais obscuros desse país a cantar para meia dúzia de malucos que trocavam entre eles cassetes piratas dos concertos gravados. Qual era a rádio que ia passar uma banda com um nome daqueles, que interpretava temas como "Anarquia em Portugal", "Anti-Kristo" ou "Violemos o Presidente" (dedicada a todos os presidentes, segundo o próprio Ribas)? Era tudo em nome dos ideais, pá. Era uma chapada nas ventas do sistemas, tão a ver? Ah sim, era pela anarquia também, iá, ia-me esquecendo.


Só que os xibos andavam à coca, e mandaram o Ribas passar o tempo (n.t.: cumprir o serviço militar obrigatório) , Almendra fundou os Peste & Sida, e era o fim dos Ku de Judas. Quando Ribas acaba de bater a pala aos tropas, tenta voltar a reunir o grupo, mas ao fim de algumas tentativas frustradas decide arrancar com uma nova cena: os Censurados. Se os Ku de Judas eram a resposta portuguesa para os Sex Pistols, os Censurados eram um híbrido entre os Ramones e os Clash. Como uma das cenas com que o Ribas não podia mesmo nada era a chibaria, o primeiro tema que gravaram foi "Tu ó Bófia", que veio acompanhado de um "clip" que apresentaram no programa de música alternativa "Pop-Off", que passava no canal 2 depois da meia-noite às terças-feiras. Em 1990 saíu o álbum "Censurados", a menina dos olhos do Ribas; olha pó man, a gravar um disquinho, ganda pinta, o cromo.


Depois do primeiro disco saíu outro no ano seguinte, "Confusão", e em 1993 mais um, "Sopa", e ficaram na memória canções como "Coxa", "Venenosa", "Amigo", "Todos no Mesmo Barco", "Solução" ou "Sentados ao Balcão". Depois disso sai o baterista Samuel, também a contas com a tropa, e o grupo reduz o número de ensaios, despendido-se com a participação nos álbums de tributo a Zeca Afonso com o tema "O que faz falta", e dos Xutos com "Enquanto a Noite Cai". Os Censurados ficariam na memória de uma geração inteira, e mais tarde voltariam para reunir-se para dar alguns concertos com o nome de Re-Censurados.


Só que os xibos não se iam ficar a rir, e Ribas volta à carga com um novo projecto em 1995, os Tara Perdida, que seria também aquele que mais duraria. Foram seis álbums de originais, o último deles o ano passado, e ainda um DVD intitulado "É Incrível", um concerto gravado na Incrível Almadense. O ano passado gravaram com Tim, dos Xutos, este tema "Lisboa", o último que João Ribas faria antes de nos deixar tão prematuramente.


Foi foda ó João. Isso não se faz. Eu sei que nunca foste um gajo que quisesse ferraris, jacuzzis, mulas e orgias com coca, mas agora que a gente se estava a divertir? Bom, o mundo também já não é o mesmo do tempo em que ficavas no quarto a curtir os Bauhaus, acordar a meio da tarde e ir comer uns tremoços e mamar umas jolas com a malta naquela esplanada ao pé do CCA, ou fazer uma crista com gel e ir dar a volta ao quarteirão do hospital dos malucos para assustar as velhotas. Mas o que é essa merda da "doença respiratória", pá? E não dizias nada. Olha, a gente depois vê-se, e se não te importas de esperar um coche grande, tipo, não levas a mal, pois não? Fica bem, ganda cão, e vê lá se não chateias muito os anjinhos. Um xi-tó grande pra ti, João Ribas.

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