segunda-feira, 11 de novembro de 2013

O tufão da corrupção


O tufão Haiyan passou este fim-de-semana pelas Filipinas, causando uma das maiores catástrofes humanitárias de que há memória. O impacto da tempestade naquele arquipélago do sudeste asiático só é ultrapassado pelo tsunami de Dezembro de 2005, que causou centenas de milhar de mortes na região Ásia-Pacífico. Só na ilha de Leyte foram mais de dez mil as casualidades, com povoações destruídas, famílias inteiras desalojadas, outras mortas, outras ainda onde sobreviveram um ou dois elementos. Mulheres, crianças, homens, novos, velhos, todos sofreram na pele a fúria do Haiyan. Só não digo "ricos e pobres" porque este não é um problema dos ricos.

A corrupção que grassa nas Filipinas é mais letal que qualquer tufão, maremoto, vulcão ou furacão. Um país que está exposto às violentas intempérides todos os anos teima em não se equipar com os meios e tomar as devidas precauções para minimizar as perdas materiais e humanas. É um país pobre e subdesenvolvido? Talvez, mas o pouco dinheiro que devia ser destinado a preparar estas populações para a fúria do mar e do vento "perde-se" pelo caminho, e não há sequer o bom senso para que chegue o suficiente para que a tragédia não seja tão feia, tão nua e tão crua. Todos tentam tirar a maior colher do pudim que puderem, mesmo que seja a última. Se for preciso lambem o prato. No Vietname, outro país subdesenvolvido, tanto ou mais que as Filipinas, são evacuadas 200 mil pessoas em risco antes da chegada da tempestade. Nas Filipinas são deixadas ao Deus-dará. E Deus não se sente muito generoso nesse dia.

Passada a tempestade, contam-se as perdas, enterram-se os mortos, chora-se para sacudir a dor, apanham-se os cacos, que é tudo o que sobra, e amanhã é outro dia. Com a bonança chegam os políticos, põem a máscara da consternação, abraçam os sobreviventes e rezam com eles, garantindo sempre que se captem as imagens que demonstrem ao mundo que são gente boa, com um coração enorme, e apelam à ajuda internacional, porque eles "não têm" - já limparam tudo. O que podiam ter feito para evitar a tempestade? Nada. O que podiam ter feito para evitar a tragédia? Muita coisa. Mas agora já é tarde. É sempre tarde. É uma chatice ser político num país como as Filipinas. Ter que ocorrer a estes locais onde esta gente pobre coberta de trapos chora a perda de outros pobres.

As imagens correm mundo, chocam quem assiste ao terror deste povo entregue à má-sina do lado nefasto da natureza e à indiferença dos politicos. Os países civilizados prontificam-se a ajudar, em meios humanos, em géneros, e claro, em dinheiro. Os meios humanos chegam lá, com mais ou menos dificuldade. Os géneros, em parte, mas muito vai-se perdendo pelo labirinto dos cleptocratas. O dinheiro, esse, evapora-se, puff! e tudo o tufão levou. Para quem assiste de fora a tudo isto não pode deixar de sentir pena destas gentes, e pensar como seria se fossem eles que estivessem no seu lugar, e é compelido a contribuir. Quem já sabe como isto funciona prefere mudar de canal. Dar? Para quê? Os pobres das Filipinas e de outras repúblicas das bananas estão condenados, arrastados pela força do tufão da corrupção.

2 comentários:

Anónimo disse...

Uma tristeza. Um país constantemente fustigado por fenómenos naturais e por trastes políticos. Bom texto.

Hugo disse...

Concordo com parte do texto mas olha que 700.000 pessoas foram evacuadas antes da tragédia de sexta feira