"Se não podes vencê-los, junta-te a eles". Não sei se este provérbio se aplica à minha relação com o meu co-inquilino desta moradia de rés-do-chão e primeiro andar complementado com sótão, o sr. rato. Depois dos recentes episódios que culminaram com o nosso encontro demorado, tenho recebido as mais diversas sugestões sobre o que fazer, desde "matar o velhaco" a "adoptá-lo e dar-lhe comidinha". O meu plano inicial de o atrair com comida e depois envenená-lo não tem pernas para andar por enquanto. Ele não me dá qualquer pista sobre as suas verdadeiras intenções, e a mudança de estratégia por que optei nos últimos dias não estabelece um padrão quanto ao seu comportamento.
Na quarta-feira após nos termos olhado nos olhos, deixei um prato de arroz cru junto ao sítio onde ele anseia pela caixa selada que contém o basmati que guardo para consumo doméstico, mas não lhe tocou. Intrigado sobre o passo seguinte a dar, tive o auxílio de uma amiga, cujo namorado trabalha na cozinha do hotel Grand Lapa, e que me disponibilizou uma porção generosa de queijo Mascarpone, aquela massa com que se confeciona o bolo de queijo e outras sobremesas. O seu sabor neutro e ligeiramente salgado, a juntar à sua consistência pastosa, não agradam ao paladar dos humanos, mas exprimentei cortar uma pequena quantidade em cubos, deixá-lo no mesmo prato durante a noite, e aguardar os resultados.
Foi para grande espanto que na manhã seguinte o queijo tinha desaparecido. O sr. rato visitou a cozinha pela calada da noite, e limpou o prato. Mais Mascarpone houvesse, mais ele comia. Encontrei o isco perfeito, mas e agora? O que fazer com esta informação? Repeti a experiência na noite de quinta para sexta, e mais do mesmo; o sr. rato chamou-lhe um figo. Deixei mais queijo na sexta, antes de sair para o trabalho, e ao fim da tarde já só lá estava o prato vazio. Interessante...e que mais inclui o sr. rato na sua dieta?
Antes de sair para a Lusofonia, deixei no prato algum esparguete que tinha sobrado do jantar do dia anterior. Esparguete cozido, sem sal, sem qualquer tempero ou molho. Voltei já depois da uma da manhã, e notei que o esparguete tinha sido remexido, mas muito pouco dele comido, para não dizer nenhum. O Mascarpone foi do agrado do sr. rato, mas quanto ao esparguete, a mensagem que passou foi: "come tu". Antes de me deitar deixei mais um pouco de queijo. Desconsolado com a alteração do menu, o sr. rato voltaria certamente para encher a barriga de queijo.
Na manhã seguinte, o queijo continuava intacto. Estranhei o facto do sr. rato ter resistido ao seu prato predilecto. Será que a desilusão que representou o esparguete fez com que tentasse a sua sorte noutro "restaurante"? Saí para fazer umas compras, e voltei depois de almoço, e para meu grande espanto, o queijo tinha sumido. O sr. rato não terá um horário fixo para as suas refeições, pensei. Ontem pelas sete da tarde voltei à Taipa, e deixei-lhe mais Mascarpone. Regressado já depois das três da madrugada, nem sinal do sr. rato, com o prato a continuar cheio. Fui dormer, acordei às 11:30, e nada - o mesmo queijo, nada de sr. rato. Estranho...
O queijo permanence no chão da cozinha, dentro do prato, sem que o sr. rato venha comê-lo. Esperava que o fizesse, e daí mudava de ementa para lascas de cenoura, para testar a sua apetência por vegetais. Se gostasse tentaria arroz cozido, banana, maçã picada e quem sabe um pouco de chocolate de pasteleiro que sobrou daquela sobremesa de gelado de baunilha que fiz há um mês. Sem saber a que horas o sr. rato passa por esta sua "pensão", torna-se complicado realizar esta experiência onde o chão da cozinha serve de laboratório. Por onde anda, sr. rato? Temos ou no um compromisso? É favor dar-me um sinal, meu dentuço peludo.
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